Por que rebotar Animaniacs é uma boa ideia, mas Tiny Toons não é.

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O reboot de Animaniacs nem estreou e já é um sucesso. Não só por já ter sido anunciada a segunda temporada antes mesmo de terminarem de gravar, como porque em resposta a reação positivíssima do trailer do reboot, eles anunciaram já o reboot de Tiny Toon Adventures.

E eu que adorei o anúncio do Reboot de Animaniacs e solto rojões comemorando cada notícia e preview que vejo a respeito do retorno do melhor desenho animado da história (empatado com Venture Bros), eu vi esse anuncio de Tiny Toons, o irmão mais velho de Animaniacs, um desenho feito pelos mesmos criadores, no mesmo estilo, com muitas semelhanças… e eu pensei: “é, eu não sei não.”

Mas aí eu pensei uns dias e concluí que não, que não faz o menor sentido rebotar Tiny Toons. E que embora esse desenho seja indubitavelmente um desenho irmão de Animaniacs, que inclusive passava no mesmo universo animado, Animaniacs é uma ideia atemporal e Tiny Toons é uma idéia dos anos 1990. Esse texto é para explicar o porquê.

Aliás, antes de começar a me aprofundar eu vou fazer um enorme parênteses para falar algo que um leitor do blog de longa data já sabe. Eu tenho nesse blog a política de tentar sempre usar o nome original dos personagens. Isso é em parte porque eu levo a sério o processo de nomear um personagem por parte de seu autor, que passa uma quantidade significativa de caracterização nesse ato de nomear. E eu levo consideravelmente menos a sério as adaptações e localizações de nomes próprios que não sempre, mas na maioria das vezes, ignora e deixa de lado completamente as caracterizações e simbolismos no nome em troca de algo que não vá dar trabalho de ouvir e refletir sobre. Então quando eu analiso qualquer obra, dialogar com o autor pra mim é muito mais importante que dialogar com o tradutor, eu busco me referir aos personagens pelo seu nome original.

A piada do “Não somos parentes” só existe porque em inglês eles tem o mesmo sobrenome. E o motivo pelo qual eles não puderam dar o mesmo sobrenome aos dois aqui, foi por se prender a uma lógica de nomenclatura estabelecida 40 anos antes.

Nesse meu hábito, a maior pedra no meu sapato são os Looney Tunes. Pois eles são simultaneamente, os personagens cuja adaptação de seus nomes no Brasil eu menos respeito ou acho bem-pensado, e uma das decisões de tradução que eu acho que envelheceram pior, pois interferem eternamente em obras que utilizam e referenciam esses personagens eternos até hoje. Mas ao mesmo tempo, é uma das mais enraizadas na nossa cultura. Os Looney Tunes têm seus nomes adaptados como uma referência infinitamente maior do que seus nomes originais, e eles são todos personagens muito eternos. E mesmo eu que ativamente evito me apegar a nomes traduzidos pro português, tenho dificuldade de desassociar a figura deles de seus nomes em português primariamente.

Sempre que eu mencionar um nome no corpo do texto, eu vou colocar seu nome em português entre parênteses, como eu já faço, mas peço a compreensão antecipada de quem não está acostumado a ler termos como Bugs Bunny ou Daffy Duck ou Elmer Fudd, pois eles vão aparecer… E vão ser muitas vezes reduzidos a somente Bugs, ou somente Daffy ou somente Elmer. Eu sei que isso é inconveniente, mas eu não vou ceder.

Tirando isso do caminho, vamos falar de Tiny Toons.

O que foi Tiny Toon Adventures:

         Tiny Toon Adventures foi um desenho que estreou em setembro de 1990. Ele é a criação de Tom Ruegger, que antes disso havia feito A Pup Named Scooby Doo, na minha opinião a segunda melhor encarnação do Scooby Doo, e a mais engraçada. E depois de Tiny Toons, participaria de Animaniacs, Pinky and the Brain, Freakazoid e Histeria. Sendo Animaniacs e Pinky and the Brain suas criações também.

Mas Tom Ruegger divide a paternidade de Tiny Toon Adventures com outra pessoa, a série foi a primeira de uma histórica parceria da produtora Amblin Entertainment com a Warner para fazer uma série de desenhos, todos sob a produção executiva direta de Steven Spielberg, que colocava um Steven Spielberg Presents e organizava o rolê todo. Esses desenhos não teriam tudo a cara que tiveram sem o Spielberg, e o Spielberg estar de volta no projeto é um dos motivos pelo qual temos fé no reboot de Animaniacs. O envolvimento de gente como Spielberg em produções animadas de alta produção e investimento foi um dos fatores que permitiu o Renascimento da Animação Norte-Americana, também.

Mas enfim, e sobre o que era o desenho?

Tiny Toon Adventures, é sobre uma turma de crianças que treina para ser a próxima geração dos Looney Tunes. Liderados por Buster Bunny e Babs Bunny (Perninha e Lilica respectivamente), dois coelhos (que não são parentes) que herdam o legado de Bugs Bunny (Pernalonga), todas as outras crianças tinham um membro dos Looney Tunes original para serem seu mentor e ensiná-los a serem bons desenhos animados e bons sucessores de seu legado.

Em resumo, era um monte de cópia infantil modernizada pros anos 1990 dos Looney Tunes, para encabeçar uma nova era da animação, que reviva a glória da era que os Looney Tunes encabeçaram.

E isso não é subtexto. Eles retratam a si mesmo como uma versão modernizada e apropriada aos seus tempos dos Looney Tunes logo no primeiro episódio.

O episódio abre com um cartunista tentando ao máximo fazer uma nova série de sucesso. Sem inspiração, ele olha um quadro de Bugs Bunny que lhe fala que ele não pode errar com um coelho… em dúvida entre um coelho fofo e bonitinho e meigo, ou entre um coelho violento e hiper-masculino que chuta bundas, ele decide fugir desses extremos e fazer um meio termo. O coelho que seja rebelde e peralta, mas de bom coração, e assim foi criado Buster Bunny.

Isso é obviamente um comentário na divisão que permeou os anos 1980 em que todo desenho era ou um desenho fofo e meigo pra meninas, ou um desenho cheio de ação, tiro porrada e bomba pros meninos. Tiny Toons seria pros dois e não reforçaria essa divisão. Pelo contrário em retrospecto Buster foi criado para transmitir o mesmo equilíbrio de valores que firmaram Bart Simpson como um ícone dos anos 1990.

Isso é marcado quando Buster pede pra seu criador desenhar um melhor amigo, seu parceiro de todas as horas, seu compadre, um outro coelho que o entenda. E o cartunista desenha então ao lado dele Babs Bunny. Buster se revolta de ter que contracenar com uma garota, e Babs responde com muita ironia na voz o que seriam primeiras palavras: “Bem-vindo aos anos 90.”

E é isso, os Tiny Toons eram um desenho feitos na transição de uma época, cientes da transição de épocas e que de maneira metalinguística, usavam essa transição para sua narrativa. Os anos 1990 estavam começando, e eles ajudariam a definir o que seria essa época. E passaram essa mensagem com clareza.

Os episódios de Tiny Toons podiam variar em formato, mas no geral eles consistentemente se passavam no bosque Acme Acres, onde todos moravam e frequentavam a escola Acme Looniversity, e os episódios consistiam de aventuras amarradas pautadas na interações dos personagens consigo mesmo e com o ambiente. Com de vez em quando um humor mais baseado em sketchs aparecendo.

O que mudava o formato dos Looney Tunes em que tempo e espaço eram aspectos variáveis, e os personagens poderiam ter episódios na idade média ou no espaço sem problemas. Exceto Bugs que mora em um buraco, nenhum dos personagens tem uma casa, ou parentes ou nada fixo em suas vidas que os prendam a um contexto. Isso dava aos Looney Tunes mais personalidade, pois se a única coisa que conecta uma aventura do Bugs no velho oeste, na selva ou no exército é o próprio Bugs, ele precisa ter uma personalidade forte e estabelecida para ser o mesmo personagem em todos esses contextos. O Bugs não é uma consequência do tempo e espaço que ele ocupa, ele é ele mesmo.

Os Tiny Toons não, eles eram frutos de seu tempo e espaço, eles eram uma reprodução clara de como o arquétipo do Bugs seria se ele fosse um estudante dos anos 90 morando em Acme Acres, E isso era parte de dar um ar mais televisão dos anos 90 e menos curtas-metragens humorísticos dos anos 30. Com um cenário mais fixado.

 

Mas vamos falar sobre a modernização dos Looney Tunes, em especial na perspectiva de “O que era ser moderno 30 anos atrás.”.

Os Looney Tunes e as Mulheres:

Eu falei um pouco disso na minha retrospectiva dos melhores desenhos da década de 2010.  Vamos lá:

O maior sinal do que era visto como moderno pros Tiny Toons, é que a turma do Bolinha que eram os Looney Tunes já não eram mais aceitáveis. E uma turma de desenhos animados icônicos como eles não podiam mais não ter representantes do sexo feminino. Como eu apontei, a criação de Babs foi tratada como uma surpresa dentro do próprio universo e essa surpresa foi rebatida com essencialmente uma mensagem de “o mundo se atualizou, atualize-se também.”.

Babs não veio sozinha pra exercer o princípio de Smurfette e representar todas as mulheres do mundo em si. Foram 4 garotas no elenco primário. Babs Bunny, Shirley DaLoon, Fifi LaFume e Elmyra Duff (Felícia).

…a falta de mulheres no elenco dos Looney Tunes é um assunto. Todo mundo nota e todo mundo aponta. 90 anos atrás ninguém ligava. Mas agora fica meio feio, e eles tentam contornar. Não dá mais pra fazer uma turma só de homens. A Disney se safou que eles tinham dado namorada pra todo mundo na época, então quando a modernidade bateu era só questão de tentar modernizar Minie, Daisy e Clarabelle, mas os Looney Tunes precisavam criar personagens.

A criação da Lola Bunny, que nasceu 4 anos depois que Tiny Toon Adventures é o exemplo mais famoso e de mais sucesso de tentar aumentar a presença feminina local. Outras tentativas incluem Tina Russo, a namorada do Daffy criada pro The Looney Tunes Show em 2011 e tentar reviver Petunia Pig da obscuridade, e fingir que ela não foi deixada pra trás quanto o Porky (Gaguinho) deixou de ser o principal membro da turma.

Eu pessoalmente gostaria de ver as personagens mulheres que já existem simplesmente deixarem suas posições completamente terciárias, e ganhassem outro tipo de papel em novos curtas. Acho que tem potencial.

Eu adoraria ver Penelope Pussycat ser promovida a papéis de mais destaque e passe a ser tratada como membro da turma. Pensando logicamente, uma gata confundida com um gambá pode gerar todo um outro tipo de situações divertidas sem envolver ser assediada por um gambá.

Enfim, Tiny Toons veio completamente ciente dessa questão. Não só se dando ao trabalho de fazer alguns Looney Tunes terem pupilas em vez de pupilos, mas usando isso para dosar os personagens que haviam envelhecido mal com as décadas. Incluindo Pepe LePew cujo humor-pautado-em-assédio não é mais aceitável, e precisou de uma inversão de gêneros pra funcionar (uma solução que passava batido nos anos 1990, mas não sei se passaria hoje). E Elmer Fudd (Hortelino Trocaletras), que também com a imagem do caçador-por-esporte datando, achou uma pupila que era inimiga dos animais não por ódio a eles, mas por amor excessivo a eles.

Enfim, um episódio em particular foca em Babs, frustrada por ser a única a não ter um mentor, e não ter os meios de ter um mentor, uma vez que a ausência de mulheres impede ela de ter alguém em quem se inspirar. Focando na importância da representatividade. O episódio termina com Babs redescobridno Honey, uma personagem feminina que era a namorada de Bosco. Os dois personagens foram abandonados completamente com o Porky tomando os holofotes. Enfim, o episódio retrata Honey como um personagem com o mesmo estilo de humor pautado em imitações de Babs, para mostrar pra ela que tinham mulheres no passado que foram apagadas, e que devemos lembrar e resgatar a memória delas. Mas isso é uma meia-verdade. A moral se aplica como válida, mas Honey não tinha o estilo da Babs, nem estilo nenhum, ela era só uma personagem genérica para o Bosco cortejar, o Bosco era o personagem de verdade e a Honey era um bom exemplo de como não davam personalidade as mulheres na época.

O original
A versão Tiny Toons.

Esse explícito retcon na Honey, mostra que os Tiny Toons, tinham a ambição de consertar a memória dos Looney Tunes, Mas alguns consertos funcionavam piores que outros.

Personagens Crianças:

No fim dos anos 80 tivemos uma fase maldita e muito estúpida, que era a do reboot de um desenho clássico com a diferença que agora os personagens eram crianças. A Pup Named Scooby Doo era o bom da leva, mas teve o Tom & Jerry Kids, teve o Flinstones Kids… e Tiny Toons inevitavelmente dialoga como algo dessa leva.

Pra Tiny Toons, modernizar os Looney Tunes significava colocá-los em um ambiente moderno, e esse ambiente moderno era a escola, pois o público-alvo era criança. O que meio foi uma maneira de oficializar que a nova geração de Looney Tunes seria das crianças, que deveriam se ver ali.

Então vamos a uma trivia interessante. Vocês sabiam que os Looney Tunes originalmente não eram desenhos infantis?

Eu não tenho certeza se eu já contei isso em algum dos textos do blog, mas se já tiver eu vou contar de novo. Antigamente, quando não existia televisão e o mundo vivia a Era de Ouro da Animação, os desenhos animados não possuiam nomenclaturas que usamos hoje como séries, ou episódios. Eles eram curtas-animados que pertenciam a coleções de estúdios. Então a Disney tinha a coleção de curtas chamada Silly Simphonies, e a Warner copiou o título escancaradamente fazendo duas coleções que era a mesma coleção que eram a Merrie Melodies e Looney Tunes….

…pff, eu racho o bico, os três são sinônimos entre si.

Enfim. Esses curtas metragens passavam antes de uma sessão, pois antigamente, quando não existia televisão, as pessoas iam fazer mais do que ir ver um filme no cinema. Um filme era um programa longo, Esperava-se que o filme fosse a atração principal de uma série de atrações que incluiam, um curta animado, um curta live-action, e as notícias.

As pessoas não iam ao cinema SÓ pra ver as notícias. Era o pacote completo. Um programa de passar a tarde no cinema.

Então um desenho do Bugs Bunny era pensado para ser exibido junto de um curta dos três patetas, um filme do Humphrey Bogart e o noticiário contando a quantas anda a segunda guerra mundial. Eram desenhos feitos para adultos.

O que não é o mesmo que dizer que eram impróprios pra crianças. Assim como Casablanca, ou Cidadão Kane não são. Mas ao mesmo tempo a gente tenta construir em volta dessas animações um mito de que nessa época podia mostrar gente bebendo, fumando e portando armas em desenho pra criança, e é importante falar, eles não eram pra criança. E isso inclui a Disney, o Goofy era para ser visto por adultos, o Donald também.

Os longas da Disney tinham esse objetivo de ser mágicos e por serem mágicos agradam adultos E crianças igualmente, colocando um foco nos contos de fada, mas isso era uma visão que o tio Walt aplicou nos longas. O Goofy dirigindo era uma sátira do cotidiano que era para dialogar com o trabalhador indo ao cinema.

Esses se tornaram infantis quando a televisão essencialmente substituí o cinema. E a televisão dividia-se em hora dos adultos e hora das crianças. O horário das crianças era recheado de desenhos animads, pois eram baratos de produzir e escrever graças aos truques de redução de custo inventados pela Hanna-Barbera, que monopolizou o mercado por décadas com o surgimento da televisão. E com isso, a televisão infantil passou a consistir primariamente de animações. Por conta dessa semelhança de formato, os curtas animados dos Looney Tunes eram constantemente reprisados na televisão e se tornaram infantis.

Diferente dos Looney Tunes, a Hanna-Barbera era escancaradamente infantil, e usava o público-alvo de escudo pra investir pouco em roteiro e qualidade tecnca.

Isso é, até Tiny Toons nos mostrar que a nova geração será mais adequadamente infantil, com personagens crianças, e com lições de moral. Oficializando que os novos Looney Tunes nascerão sendo o que os originais se tornaram, programação primariamente infantil. E isso é parte deles se adequarem aos tempos: se adequarem as normas de público-alvo que a televisão de setembro de 1990 possuía.

Isso seria quebrado em somente dois anos.

Como os Tiny Toons viraram os Animaniacs:

         Em 1992, Tiny Toon Adventures encerrou sua produção. Eles não foram cancelados, muito pelo contrário, eram um sucesso maravilhoso. Mas a equipe de produção inteira queria migrar para um projeto mais ambicioso e iam precisar dar sua atenção completa a esse projeto, e não sobraria espaço para fazer mais Tiny Toon Adventures. Esse projeto era: Animaniacs.

Os Animaniacs de certa forma tem a base de seu projeto igual os Tiny Toons, eles são uma tentativa de trazer o humor e o carisma do que foi a animação dos anos 1930 para a modernidade dos anos 1990. Mas se a premissa foi essa a execução foi completamente diferente, o que é curioso, como se eles tivessem revisado a lição de casa e encontrado uma maneira de aperfeiçoar a ideia, se recomeçassem do zero.

Animaniacs era um show de variedades, com um elenco diverso em segmentos de animação isolados que podiam ser sobre qualquer coisa e ter qualquer duração. Algo bem anárquico e não preso a um formato. O segmento principal que segurava tudo junto era o dos Irmãos Warner e Irmã Warner. Embora eles tenham feito sua primeira aparição oficial no mundo em 1993, dentro do universo a ideia era que eles eram personagens criados pela Warner nos anos 1930 como parte da Era de Ouro da Animação, que foram considerados malucos demais para audiências e com um humor que não funcionava. Por isso foram tirados de circulação e presos na caixa da água para nunca serem exibidos.

Em vez de serem imitações dos Looney Tunes que estão mais adequados aos anos 1990 que os originais estariam, os Animaniacs na verdade fez o oposto, ele fez os seus personagens serem co-estrelas de Bugs, Daffy e Porky, que estavam muio a frente de seu tempo e só em 1993 a televisão teria espaço para eles.

E isso é verdade, os Irmãos Warner e Irmã Warner era ácidos, mais malevolentes que os Looney Tunes, e seu estilo anárquico era mais adequado a uma televisão querendo romper normas de formato do que a um curta-animado.

E se diferenciavam dos Looney Tunes, com por exemplo, azucrinando pessoas que não os provocaram, coisa que Bugs nunca fez; Os Looney Tunes sempre estavam só se defendendo.

O dialogo de épocas abraçava também a personagem Slappy Squirrel, retratada como uma contemporânea de Bugs e Daffy também, que já se aposentou, e que as vezes se sente datada pela maneira como os novos desenhos são, mas constantemente seus episódios mostram que ela não datou tanto assim. Pelo contrário, que a modernidade tem muito a aprender com ela.

Os personagens de Animaniacs restauraram o estilo de Looney Tunes de poder ter histórias que se passam em qualquer tipo de tempo e espaço, e portanto eles são livres para ser eles em qualquer cenário. E isso era a marca do desenho também. E com essa variação, apesar de eles oficialmente serem sempre chamados de três crianças (sem nenhuma indicação real de idade sendo dada), seus papeis poderiam ser papeis adultos que os personagens ocupam, não deixando eles limitados pela designação de crianças.

Os pontos de comparação importantes são esses, mas eu escrevi sobre o que tornou os Animaniacs tão bons no passado, leiam.

Enfim… Animaniacs acabou em 1998, e com isso os projetos de Tom Ruegger e Speilberg de dar um legado pros Looney Tunes nos anos 1990 chegou ao fim. Isso significa que o papel dos Looney Tunes na modernidade acabou?

Não!

E EU NÃO ESTOU FALANDO DE SPACE JAM, SAI PRA LÁ:

Tenho nada a declarar sobre esse meme de uma hora de meia que deu um jeito de conseguir uma continuação.

The Looney Tunes Show (2011):

Tiveram muitas outras releituras dos Looney Tunes ao longo dos anos, muitas, mas eu quero falar somente de uma: The Looney Tunes Show.

The Looney Tunes Show, foi uma série animada de duas temporadas, que modernizava os Looney Tunes transformando-os em uma Sitcon. Todos os personagens foram repensados em versões suburbanas de si mesmos, Bugs morava em um pequeno subúrbio, mantendo uma rivalidade com seu vizinho Yosemite Sam (Eufrazino Trocatiros), e sendo um bom vizinho da bruza Hazel. Ele morava junto de Daffy o estereótipo do parasita que não paga contas. Ele namorava Lola Bunny, Daffy namorava Tina Russo, e eles interagiam com mais toda a gama de personagens no seu dia a dia.

 

De certa forma The Looney Tunes Show foi o exato mesmo projeto que Tiny Toon Adventures foi. Uma repaginação dos personagens em um ambiente fixo que mostre assuntos atuais. Só que em vez de ser novos personagens para servir de discípulos, eram os próprios, constantemente se adaptando aos tempos. Pois no fundo a verdade é que em 2011, o Bugs Bunny ainda existia, e o Buster Bunny havia desaparecido com os Tiny Toons.

A atmosfera escolar foi substituída por uma atmosfera do dia a dia do adulto de classe média, o Bugs deixou de ser o Groucho Marx e virou o Seinfeld. E essa identificação permitiu a qualquer criança continuar se divertindo com os Looney Tunes, mas também um pouco devolveu os personagens aos adultos, sem precisar infantilizá-los pra firmá-los como personages que tenham um público infantil.

Personagens femininas novas foram criadas, como Tina Russo, a Lola Bunny foi repaginada para deixar de ser um crime contra os Looney Tunes, a bruxa Hazel ganhou destaque que nunca recebeu antes, e ressuscitaram Petunia Pig do limbo dos limbos, usando literalmente todas as soluções possíveis para aumentar o elenco feminino em uma turma tradicionalmente sem elenco feminino.

Diferente de Tiny Toons que era divertido pra caralho, The Looney Tunes Show me deixou dividido, entre ótimos e péssimos episódios.

Os episódios se encerravam com um número musical que podia ser completamente desrelacionado de qualquer coisa, incluindo o grande meme do Daffy ser um mago, entre outros números parecidos.

E foi em muitos sentidos, um reboot de Tiny Toons. Desenfantilizando-os e os jogando nos anos de 2010.

Então temos esses personagens, como símbolos de um estilo de humor e de uma crença de como fazer boa animação que foram relevantíssimos nos anos 1930, 1940, 1950, acabaram, fizeram dois retornos indiretos nos anos 1990 na tentativa de deixar um legado, a tentativa morreu em si mesma, e eles foram repaginados nos anos 2010. A situação é essa e agora a década é 2020. O homem mais burro do planeta é o presidente de um país poderoso, a internet é a base da mídia audiovisual redefinida pelo streaming, a Disney é dona de 70% do entretenimento, o mundo mudou, e o Bugs Bunny está mantendo regularmente uma série de curtas animados que ninguém tá assistindo.

…e me anunciam um reboot de Animaniacs.

E esses reboots aí?

 

Agora que eu fiz um panorama com toda informação que eu achei relevante pra minha revelação, vamos falar sobre a afirmação que é o título do texto.

Rebootar Animaniacs é uma boa ideia?

Sim! Primariamente por uma questão de metalinguagem.

Os Irmãos Warner e Irmã Warner eram dentro de seu universo, personagens de outra década, que conseguiam se manter engraçados até aquele tempo, por se manterem engraçados, em um apelo universal, anárquicos e por terem a tendência de estarem a frente de seu tempo.

Eles cantaram a bola da inevitabilidade de um Rocky VI que dez anos depois se concretizou. Se fossem os Simpsons isso tinha dominado a internet, mas com Animaniacs ninguém liga quando eles prevem o futuro.

E isso vai acontecer em uma outra camada. Eu não acho que o estilo de humor de Animaniacs envelheceu de verdade, as referências que eles tiravam sarro na época, como a Cher ou o Bill Clinton viraram referências datadas. Mas as referências que definiam os personagens não dataram. E honestamente o desenho era completamente anárquico de maneira como nada foi antes, mas só dois desenhos conseguiram passar a mesma vibe de que tudo valia. The Amazing World of Gumball e Teen Titans Go, duas comédias dos tempos atuais. Animaniacs estava à frente de seu tempo nos anos 1990.

Seus personagens não são releituras, de ninguém, eles são homenagens aos anos 1930. E eles não estão presos a nenhum lugar e espaço. Mais que isso. Eles tinham uma acidez poderosa em apontar tudo que era estúpido na cultura pop, e ela só ficou mais estúpida, e deu mais material pra acidez deles ser necessária.

E a primeira coisa que eles zoaram foi a própria existência, pois eles têm coragem de morder a própria mão.

Animaniacs foi um desenho que marcou os anos 1990, mas não se definiu pelos anos 1990. Ele se encaixou nos anos 1990, comentando o presente, mas agora que o presente é agora, eu acho eles igualmente capazes de comentar o agora, e acho relevante e que eles tem algo a dizer.

E Tiny Toon Adventures?

Er… eles não foram cancelados, eles acabaram, pois a era deles acabou. A vida deles não foi pra ser longo.

Primeiro deixa eu dizer que Tiny Toons Adventures foi igualmente, divertido, interessante e importante. O mundo teria sido pior se ele não tivesse existido, pois nada que ele catapultou teria sido catapultado, como teria sido pior, pois eu fui uma pessoa melhor tendo rido de Buster, Babs e Plucky.

Mas não. Não existem mais motivos para os Tiny Toons existirem. E isso é porque esses personagens existem mais para exercer uma função do que pra serem engraçados em seu próprio mérito.

Plucky Duck não tem nenhum aspecto de si mesmo que seja positivo que não dialogue com o fato de que ele deve ser herdeiro do arquétipo de Daffy Duck. E portanto uma vez que Plucky Duck não é visto no mundo desde 1994, e Daffy Duck segue vivo, é óbvio que Plucky não é necessário pra manter o humor de Daffy no mundo.

Nenhum desses personagens verdadeiramente adicionavam nada novo no mundo, quem adicionava era seu contexto, e seu contexto era, literalmente as primeiras palavras de Babs: “Bem-vindo aos anos 1990.”

Ironicamente, tem duas personagens de Tiny Toon Adventures que eu sinto que tem sim coisas a agregar no mundo. Que eram muito além da reprodução de um arquétipo. E que poderiam perfeitamente ser reaproveitadas na atualidade, por serem mais que reprises de seus mentores.

Shirley the Loon era a única personagem sem mentor, uma mobelha-grande em teoria (desenhada de maneira indistinguível de um pato), engajada no mundo místico. Obcecada e estar com seus chacras alinhados, em horóscopo, e em todas essas questões. Seu humor derivava do quão irritante essa obsessão poderia ser para quem não está na mesma vibe, mas em diversos episódios esses interesses a tornavam ou sábia, ou útil. Independente de qualquer coisa, tornava ela a mas inteligente do ambiente sempre, pois ela tinha sempre interesse em conhecer coisas.

Trinta anos depois o “jovem místico” foi um estereótipo que só cresceu, mais e mais jovens vivem em função do plano místico, e esse estereótipo foi inclusive codificado em gênero mais que nunca, com a imagem da bruxa sendo resgatada pelo feminismo com a frase “somos as netas das bruxas que não queimaram”, e isso sendo incorporado pela jovem mística. O que torna uma garota com essas características, um traço claro da nossa realidade.

Shirley foi escrita para ser uma referência de Shirley McLane, renomada atriz que nos anos 1990, era um alvo fácil de chacota por causa desses mesmos interesses. E essa referência datou, mas a personalidade dela não. E ela não tem mentor, ela não precisa frequentar uma escola aprendendo a ser uma versão moderna de outro personagem, ela pode ser somente ela mesma. Então ela podia aparecer em qualquer outro desenho da Warner, não precisando estar presa à Acme Looniversty.

A outra é Elmyra Duff (Felícia), discípula de Elmer Fudd (Hortelino). A decisão de fazer Elmyra ser o extremo oposto de seu mentor, garantindo os mesmos resultados por uma ação inversa, tornou ela o personagem que mais se destacou em Tiny Toons. Pois ela era diferente de tudo que existia então, e era engraçada. E seu amor genuíno pelos animaizinhos que ela machuca a torna fácil de empatizar, pois quem não ama animais?

Elmyra teve um episódio só dela em Animaniacs. E depois ela foi uma das protagonistas do péssimo e nada-bem-vindo spin off Pinky, Elmyra and the Brain, que foi mal recebido pelos roteiristas, literalmente obrigados a fazer na má vontade, e pelo público que odiou a nova dinâmica.

E talvez seja a participação final de Elmyra deixando esse gosto ruim na boca de todo mundo, numa tentativa de dar um passo maior que a perna com sua popularidade que acarrete na decisão de que Elmyra já foi confirmada, pela sua dubladora Cree Summer, como uma personagem que não vai aparecer no reboot de Tiny Toon Adventures.

Então das duas únicas personagens cuja personalidade eu vejo tendo espaço no mundo atual, só posso contar com Shirley. Desculpa Buster, mas o mundo em 2020 pode precisar de um Yakko Warner, mas não precisa da fusão do Bugs Bunny com o Bart Simpson.

Pois eu garanto, o Trump não vai aparecer em Tiny Toon Adventures.

Tiny Toons foi um completo fruto de ter nascido no timing perfeito, no exato momento de uma transição entre duas épocas, que tornou esse desenho o porta-voz perfeito para o que tava acontecendo na animação naquele momento.

Mas isso tudo acabou.

E honestamente, esse reboot não me parece ter nada pra falar sobre a época da animação que vivemos, pois não estamos vivendo uma transição. E o timing do anúncio só deixa claro que esse reboot é uma maneira de fazer um troco pegando carona no sucesso do irmão mais novo.

Dito isso, vou ver ambas, espero estar certo quanto aos Animaniacs, e errado quanto aos Tiny Toons,

…agora se Freakazoid quiser pegar carona nessa turma e voltar, esse aí era a frente de seu tempo, foi injustiçado em seu tempo e tem tudo para se refazer com tudo nos anos 2020.

Viva o Freakazoid.

Sobre o autor

Izzombie

Sou um cara chato que não consegue ver um filme sossegado sem querer interpretar tudo e ficar encontrando simbolismos e mensagens. Gosto de questionar a suposta linha que separa arte de filmes comerciais, e no meu tempo livre pesquiso sobre a história da animação.

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Izzombie

Sou um cara chato que não consegue ver um filme sossegado sem querer interpretar tudo e ficar encontrando simbolismos e mensagens. Gosto de questionar a suposta linha que separa arte de filmes comerciais, e no meu tempo livre pesquiso sobre a história da animação.

Alertas

  • – Todos os posts desse blog contém SPOILERS de seus respectivos assuntos, sem exceção. Leia com medo de perder toda a experiência.
  • – Todos os textos desse blog contém palavras de baixo calão, independente da obra analisada ser ou não ao público infantil. Mesmo ao analisar uma obra pra crianças a analise ainda é destinada para adultos e pode tocar e temas como sexo e violência.

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