E a Helga Pataki, hein?

E

Esse ano eu comecei a ler o mangá Ijiranaide Nagatoro-San, cujo título pode ser traduzido para “Não me trate mal, Nagatoro”. E é um mangá de romance sobre uma garota chamada Nagatoro, que fica obcecada pelo seu senpai tímido, e começa a diariamente atormentá-lo e provocá-lo tornando a vida dele um inferno, mas com o passar do tempo esse bullying se transforma em flerte e o mangá explora o laço deles e sua tensão romântica. Excelente mangá, maravilhoso.

Esse texto não será sobe esse mangá. Nem sobre mangá nenhum. Um dia eu vou escrever sobre Ijiranaide Nagatoro-San, para falar sobre o recorrente tropo que é um tanto quanto suspeito e compicado, mas tem aparecido aqui e ali, que é o tropo do “bullying do bem”. Esse é um tema que eu quero visitar no futuro e quero que a Nagatoro esteja no centro da análise.

Mas pensar nesse texto e em onde está a separação entre bullying e flerte na Nagatoro me fez pensar em outro romance, em um dos meus romances favoritos da televisão, apesar de eu não ter colocado em nenhuma das minhas listas de casais. Puro loophole, eles nunca qualificam nas regras que eu me autoimponho. Enfim, me fez pensar no amor de Helga Pataki por Arnold no desenho animado Hey Arnold.

E nossa, como eu adoro a Helga. Eu a mencionei aqui no passado. No meu texto sobre o Príncipe Zuko, eu falei que a Helga empatava cm o Zuko como a personagem mais complexa dos desenhos da Nickelodeon, e eu reforço isso. Eu acho esse personagem um show em relação ao quão bem construída ela é.

E eu quero dedicar um texto inteiro a dissecar essa personagem. A maior tsundere do ocidente. Pensar a fundo em como Hey Arnold trabalhou o equilíbrio entre o amor dela por Arnold e seu bullying. Pensar em como ela é tratada na perspectiva dos diversos arquétipos que ela representa. Como uma bully, como um interesse amoroso e como a protagonista da série. E fazer aqui a minha carta de amor à personagem. Eu fiz uma pra Makima, fiz uma pro Chucky, e agora é a vez dela.

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Esse texto é escrito em homenagem a todos os que já apoiam o blog, um pessoal daora que eu espero que sigam curtindo os textos. E espero que todos curtam esse. Então vamos falar da Helga.

Helga Pataki é a verdadeira protagonista de Hey Arnold?

Hey Arnold é um desenho animado que tem em seu centro um personagem chamado Arnold. O que é relativamente comum, pois é o nome do desenho. Mas apesar do Arnold ser explicitamente o personagem principal, não é muito difícil ver que o desenho na verdade gira em torno da Helga.

Afinal de contas, o nome do Arnold está o título, mas o desenho não chama Arnold, não é um título seguindo o mesmo padrão de Doug, Daria, Spongebob Squarepants ou The Adventures of Jimmy Neutron: Boy Genius. Nesses casos o título seja com o nome solto, o nome completo ou o nome e sua descrição, essencialmente é só uma indicação do protagonista. Mas Hey Arnold não, “Hey Arnold” é na verdade uma citação. A abertura do desenho consiste no personagem Arnold andando e interagindo com seus amigos, enquanto Helga constantemente segue ele repetindo “Hey Arnold”. É a Helga quem fala “Hey Arnold”, pois ela quer chamar a atenção dele. E é ela quem “canta” a abertura do desenho. E a Abertura do desenho é ela constantemente chamando a atenção de Arnold, mas insultando ele quando de fato consegue falar com ele.

E a Helga é o diferencial do desenho. Enquanto o personagem do Arnold precisou de um tempo e de alguns episódios para se encontrar e decidir qual era o centro do personagem, a Helga já tinha suas principais características definidas desde o princípio. Nos primeiros episódios Arnold é só um menino normal, com uma família não-convencional, um quarto maneiro e que sonha acordado. Em muitos aspectos Hey Arnold parecia uma repetição de Doug trocando o ambiente do subúrbio, por um ambiente urbano de cidade grande, mais sujo e menos pacífico. Com o passar dos episódios, a personalidade do Arnold foi em direção a um grande bem-feitor, dotado de sabedoria além de sua idade, empatia e de uma honestidade impecável que tornava ele o garoto mais puro do mundo. Mas nos primeiros episódios ele não era nada disso, ele era só um garoto normal com grande imaginação.

E tinham vários episódios onde ele era uma criança corrompível.

E quando eu penso no que o desenho foi, no sentido de qual foi a grande ideia por trás do desenho, pra mim a ideia sempre foi “é um desenho sobre um garoto que sofre bullying de uma garota que secretamente ama ele”. Esse é o grande lance do desenho. O Arnold sofre nas mãos da Helga, mas nós sabemos que ela gosta dele.

Outro ponto relevante é que esse segredo da Helga, o de que ela ama o Arnold, é um segredo que nós sabemos e os demais personagens não. Até o fim da série, somente quatro personagens sabiam do segredo de Helga, incluindo seu stalker, sua melhor amiga e confidente e sua psicóloga. Ela guardou seu segredo com força, e bem, nós sabermos a verdade por trás do bullying dela era a grande diferença entre ver Hey Arnold e ver qualquer outro desenho sobre colegas de sala passando a infância juntos. Era o contexto que fazia as interações de Hey Arnold soarem como interações únicas do desenho.

Um número grande de episódios giram em torno do risco de Helga ter seu segredo revelado. Helga manter seu segredo é a cola que mantinha o universo em harmonia.

Os outros diferenciais eram o já mencionado ambiente urbano e a não-romantização da vida cotidiana. Famílias eram quebradas, disfuncionais, não-convencionais, adultos tinham problemas, casamentos ruins, problemas com contas, e a vida seguia nesse ambiente cuja parte feia não estava escondida das crianças. O que é um tremendo diferencial especialmente pra parte emocional da série. Mas eu acho que o desenho ser sobre um rapaz sofrendo bullying de uma garota que o ama é a marca principal que faz Hey Arnold diferente de um Doug ou um Recess da vida.

Helga também é a personagem com a backstory mais bem trabalhada da série. Enquanto sabemos que Arnold vive com seus avós e os demais inquilinos da pensão que eles administram, demoramos muito tempo para saber por que Arnold vive com os avós, o que aconteceu com seus pais. E por Arnold ser um garoto feliz e otimista, nunca vimos isso como “a situação familiar de Arnold”, ou algo que precise ser explorado a fundo, somente como um caso de “a família do Arnold é não-convencional”.

Por outro lado, um número muito grande de episódios existe no contexto de “A vida doméstica da Helga é um caos”. Os pais da Helga estão entre os personagens adultos que mais aparecem na série, e a irmã de Helga, que não mora com ela mais, é uma personagem recorrente. As cenas de Helga em sua casa lidando com sua família criam uma sensação muito forte de correlação com sua personalidade. E o expectador sai dos episódios focados em sua vida doméstica percebendo como o ambiente em que ela vive moldou a pessoa que ela é.

O que não é incomum para o personagem do bully, ter episódios mostrando como ele tem uma vida doméstica ruim que faz ele ter uma grande raiva para por pra fora na escola. Mas esses personagens geralmente têm um número limitado de episódios realmente focados em por que eles agem como agem, enquanto Helga tem inúmeros, é um tema recorrente da série do começo ao fim. Da primeira a última temporada, vemos vários episódios em que a disfuncionalidade da família Pataki é um ponto relevante do episódio.

Quando a série resolveu enfim lançar o Jungle Movie, o aguardado e hypado final da série que nunca havia sido produzido, só existiam duas perguntas no ar: “O que aconteceu com os Pais do Arnold?” e “Helga e Arnold vão ficar juntos?”, a questão dos pais do Arnold é uma questão que surgiu na série na quinta temporada, mas a da resposta pro romance de Helga e Arnold surgiu logo de cara.

Para ser preciso, surgiu no segundo episódio.

Então parece sim que a Helga era quem carregava o desenho nas costas. O amor dela era o motor por trás de boa parte dos episódios, os dramas pessoais do Arnold demoraram pra se estabelecer e ele precisou passar um tempo sendo o interesse romântico e vítima de bully da Helga antes de encontrar seus traços relevantes. Na maneira como eu vejo, ela era sim a personagem principal, a personagem cujos desejos, backstory, traumas e emoções determinavam o ponto da maioria dos episódios desde o começo da série. Mas isso não é importante nem uma distinção que interessa, é só uma reflexão sobre o zelo que a personagem recebeu em comparação ao protagonista no sentido literal.

Outro ponto que eu raramente chamo a atenção falando de personagens, mas aqui eu quero chamar, é o design de personagem da Helga.

O design de Helga:

Helga não é desenhada com traços convencionalmente atraentes. Ela possui uma monocelha grande e indiscreta enquanto as demais meninas do desenho mal tem as sobrancelhas visíveis. Ela também tem um nariz grande e redondo menos delicado do que o das garotas que são apontadas dentro da narrativa como bonitas e admiradas por sua beleza.

Olga e Lila são duas personagens diretamente descritas como mais bonitas que Helga e cuja atenção positiva que as duas recebem causa inveja em Helga.

Nada disso é um julgamento, de verdade, a minha prosopagnosia faz com que pra mim seja particularmente difícil sequer diferenciar uma garota com base em suas sobrancelhas e nariz, muito menos julgá-la. Mas eu quero apontar isso, pois na maioria das vezes, espera-se que o interesse amoroso principal seja atraente, mas aqui não, fizeram a Helga ser o underdog, apontada como menos atraente que suas rivais e por isso nossa simpatia vai com ela. Com a pessoa que joga na desvantagem.

Tanto a sobrancelha quanto o nariz são aspectos que ela herdou de seu pai, e não de sua mãe, e que fazem ela fisicamente se parecer com Big Bob. Bob é um pai tóxico, e Helga guarda mágoas dele por isso, os anos de negligência dele com Helga marcaram a menina negativamente, e ela vê com muita clareza os defeitos de seu pai. Mas mesmo assim, ela puxou muito dele. A série passa muito a impressão de que ela aprendeu a se impor por meio da violência e do grito como uma maneira de imitar o pai, que conseguiu tudo o que tem falando mais alto e atropelando as pessoas em seu caminho. Ela tem dificuldade em se conectar com seu pai, mas nas raras situações em que os dois acham algo em comum entre si, esse algo é a agressividade deles e dividir um sentimento negativo juntos.

Helga não é vaidosa e não se importa de verdade com aparência. Ela menospreza suas colegas de sala que se interessam com maquiagem, penteados e dicas de beleza, e rejeita uma festa focada nas meninas se embelezarem, preferindo jogar bola com os meninos. E não é como se os meninos valorizassem a companhia e que ela tenha escolhido passar tempo com eles.

Essa rejeição a um estereótipo feminino e preferência por atividades lidas como masculinas é contrastada com a escolha de roupa de Helga, permanentemente usando um vestido rosa com um laço rosa. Uma escolha de roupa que visivelmente não reforça sua personalidade agressiva e rude. Pra fins de curiosidade, a roupa de Helga é idêntica a roupa de Isabella Garcia-Shapiro, o interesse amoroso de Phineas em Phineas and Ferb, uma garota, doce, fofa e simpática que é canonicamente reconhecida no desenho como a criatura mais adorável da galáxia. O oposto da impressão de Helga causa.

O motivo de Helga se vestir da maneira como ela se veste é porque na pré-escola, Arnold disse que seu laço era bonito, e esse elogio marcou o momento exato e Helga se afeiçoou por ele. Ela respondeu ao primeiro elogio sincero que recebeu na vida com amor, e nunca mais tirou o laço que fez alguém falar algo bonito pra ela.

Helga, como a maioria dos personagens que me fascinam, é uma menina de contradições. Ela desgosta do seu pai, mas foi muito moldada por ele, mais do que gostaria de admitir. E ela odeia feminilidade, mas nunca remove um laço cor-de-rosa que ela usa desde a pré-escola, pois esse laço representa menos quem ela é, e mais quem ela quer ser, uma pessoa que Arnold elogie, mesmo que suas ações são façam com que ela mereça elogios.

Helga, a bully:

Helga é a protagonista verdadeira de Hey Arnold, como eu disse. O que significa que ela não é o personagem com mais exposição, mas é o personagem mais consistente e o personagem cujo conflito primário sustenta a série inteira. E ela também é uma menina que fala sozinha, lê o diário dela na nossa frente e permite muitos momentos em que nós vemos seus pensamentos mais profundos declarados. O que significa que nós sempre sabemos o que ela está pensando e como ela se sente e sua perspectiva é sempre a prioridade quando o episódio envolve ela. Nós vemos o mundo pelos olhos dela constantemente. E por isso, somos treinados a simpatizar com ela, torcer por ela e ficarmos felizes por suas vitórias e triste por suas derrotas. Raramente um episódio vai terminar com Helga se dando mal e com um tom feliz simultaneamente.

Apesar disso, ela é uma menina cruel, e é uma bully. E não é uma “bully do bem” que está só deixando suas vítimas mais fortes, ou que vê bully como um trabalho ou um papel social que precisa ser ocupado na escola, mas que na verdade se dá bem com suas vítimas quando está fora do expediente, como o Bufford de Phineas and Ferb. Ela é uma bully de verdade, e embora ela grite e mande e consiga as coisas do seu jeito na ameaça com a escola inteira, a vítima fixa dela é o Arnold.

O outro alvo comum dela é o Brainy, que ela deve socar uma vez por dia, mas o Brainy é o stalker dela. Ela é a vítima dele.

Enfim, você nunca vai ver Helga indo bater no Sid ou no Gerald por dinheiro do lanche, ou prender Eugene no armário. O que ela faz com as outras crianças é empurrar pra saírem da frente quando eles estão no caminho dela ou revidar provocações com violência desproporcional, mas ela nunca vai sair do próprio caminho para importunar as outras crianças. Helga é diferente de outros bullys da escola como Wolfgang, pois ela passa uma aura de que ela não ataca quem não cruza o caminho dela…. exceto com Arnold.

Nós sabemos, que ela pratica bullying com Arnold, pois ela é obcecada por ele, ela ama ele, ela admira ele, e sua incapacidade de expressar seus sentimentos fazem ela se expressar com agressividade. Ela não quer que ninguém saiba que ela faria tudo pelo Arnold, então ela cultiva uma imagem de que ela o odeia. E o ponto é: funciona.

O Arnold não é um grande sábio que é capaz de ver quanto carinho e amor se escondem por trás da imagem de menina durona e cruel. Digo, ele até é capaz de ver o quanto a imagem de menina durona e cruel é uma máscara, ele é capaz de empatizar com Helga e é mais paciente com ela do que ela fez por merecer. Mas ele não é capaz de sentir que ela o ama. Ele acha que ela o odeia. E por mais que Arnold seja hiperbolicamente um santo de tão puro e capaz de perdão, tem episódios que mostram o quanto o bullying de Helga machuca o Arnold. Ele volta pra casa com mágoa e rancor do que ele teve que lidar por causa dela. E por mais que Arnold veja o lado bom de todo mundo, e acredite que Helga tenha um lado bom, ele não realmente se vê como alguém próximo dela.

Claro, tem linhas que ela não cruza, ela por exemplo nunca, nunca mesmo usou ou usaria o fato do Arnold ter pais desaparecidos contra ele. Ela nunca mexeria com os traumas do menino por nada no mundo. E no dia que Big Bob chamou Arnold de órfão, foi uma das poucas vezes em que ela foi até Arnold pedir desculpas pelo pai. Mas ela ter essa linha que ela não cruza faz pouca diferença por Arnold. Ele tenta entender Helga, ele quer tirar dela o melhor que ela oferece, mas ele se magoa com ela.

E qualquer outra pessoa vai oferecer menos compreensão que Arnold. Quando ela faz sua babá ser demitida, ela se arrepende pelo mal que causou, e o episódio termina com ela não sendo perdoada. A babá explica pra Helga a gravidade do que ela fez e que resta a ela viver com as consequências. Quando Helga explica que não terão consequências, pois ela se safou, a babá responde:

Você é uma garota com muita raiva, Helga, e você não deixa ninguém te ajudar, então você tem que viver com sua infelicidade.”

Hey Arnold é a história de uma bully apaixonada por sua vítima, e a série faz um esforço imenso para que simpatizemos com a bully e queiramos que seu amor seja recíproco e ela seja feliz. Mas a série não transforma o bully dela em “bully do bem” em nenhum momento. Não finge que existe algum lado bom no bully dela, e deixa claro que o bully afasta ela de Arnold mais do que aproxima. É importante apontar isso, pois existe o mito propagado pela mídia e por adulto falando merda pras crianças, de que quando uma pessoa pega no seu pé na escola, é porque ela gosta de você, e isso tem sido muito criticado por ajudar crianças, especialmente meninas, a naturalizar abuso e tentarem racionalizar abuso como romance. Eu não acho que Hey Arnold quebra esse mito, pelo contrário, apresenta um exemplo palpável. Mas o desenho deixa claro que a estratégia da Helga é ineficaz. Que o Arnold não vai ter olhos pra Helga enquanto ela não começar a tratá-lo bem. O Arnold não naturaliza o abuso que ele sofre de Helga, mesmo acreditando que ela seja melhor do que ela demonstra, esse abuso afasta ele dela, e faz com que pra ele seja difícil confiar nela.

E o único motivo pelo qual é sequer possível imaginar que os dois tem alguma chance juntos é o Arnold ser a melhor pessoa do planeta capaz de perdoar e de redimir qualquer pessoa sem nunca desistir de ninguém. Sabemos que se ele conhecer a verdadeira Helga ele pode perdoar ela, mas só porque o Arnold é um tão puro que ele não conseguiria descer da Nuvem Voadora caso subisse nela.

Um dos vários episódios em que ele redime um adulto grosso e antipático por nunca desistir de ver o melhor em todo mundo.

Mas voltando as relações da Helga fora do Arnold. Ela é agressiva, responde a gente que atrapalha ela com empurrões e responde a insultos com violência e tem um apelido sarcástico pra todo mundo, mas ela não começa conflitos, somente termina eles. Então ela é capaz de socializar bem com o resto da classe. Ela é mandona e o para-raios de seu lado mandão é Phoebe, a sua melhor amiga, que ela trata como se fosse sua assistente.

Helga e Phoebe são amigas de verdade, a amizade delas não é uma mentira de nenhuma das duas partes e ninguém está usando ninguém. Elas são leais uma a outra e vão defender a outra quando a outra está em apuros. Elas também dividem seus segredos, sendo Phoebe a única pessoa com quem Helga de fato confiou seu segredo sobre ela amar Arnold. Mas, mesmo assim, Helga trata Phoebe mal. Ela amar Phoebe, ser leal a Phoebe e defender Phoebe de gente podre não significa que ela não trata sua amiga mal. Ela manda em Phoebe, designa serviços ingratos a ela, ao ponto em que Phoebe realmente gostou de ter a situação invertida quando ela quebrou a perna.

O que ela faz com Phoebe não é bullying, mas é uma relação de poder, ela é chefe da Phoebe, e é isso que a melhor amizade delas significa. Helga é durona, pois ela tem medo de demonstrar fraqueza. Helga é hostil, pois tem medo de demonstrar fraqueza. Ela tem um lado sensível e empático que ela esconde do público. Ela é independente, forte, e com grande capacidade de liderança. Ela gosta e estar no topo e que as coisas sejam do seu jeito. E ela acha que quem fica em seu caminho tem que ser empurrado. Os motivos pelos quais Helga tem uma relação ruim com a ideia de ser vista como fraca vem da casa dela.

Helga, a Pataki:

Helga é a segunda filha de Big Bob e Miriam. A primeira filha, Olga, é tudo o que Helga não é, linda, reconhecida e amada. Ela tem uma gama infinita de talentos e é apreciada por todos eles. Seu pai Bob ama Olga mais que tudo no mundo e faz Helga sentir que nunca será boa o bastante em nada para se comparar a Olga.

Miriam é depressiva e alcoólatra. Ela visivelmente não está feliz com o casamento e carrega uma grande série de arrependimentos.

Helga sofre negligência em sua casa, nenhum de seus dois pais cuida dela de verdade e ela teve que aprender a cuidar de si mesma desde que ela era muito jovem. Ela tem algum amor pelos pais, mas não é muito, ela chama eles pelo primeiro nome o tempo todo sem chama-los de “pai” e “mãe” e respeita eles pouco como pais. Bob é uma figura autoridade que cuida da casa com punho de ferro. Ele é o provedor, dono de uma cadeia de beeps (ah, os anos 1990), que ele também cuida com punho de ferro. Bob é um sucesso profissional, e ele chegou onde chegou ameaçando, gritando, sabotando e sendo cruel. Ele volta pra casa grita com sua esposa, grita com sua filha, dá ordens, e faz a casa girar em torno de si.

E a série nunca aponta isso diretamente, mas pra mim é visível que Helga imita Bob na hora de expressar seu desejo por autoridade. E vê nele uma ideia do que é uma pessoa que não demonstra fraquezas. Sua mãe é fraca e não-assertiva, e alguém com quem ela não pode contar, pois não toma conta nem de si mesma. Mas seu pai é uma figura antagonista, que põe pressões em Helga maiores do que ela suporta e que a educou a ver o mundo como uma competição em que ela deve sempre estar no topo. Ele comanda a casa sem demonstrar fraqueza, e se Helga quer comandar a própria vida, ela precisa ser igual a ele.

O que torna Helga um caso curioso de uma menina que é tomboy, mas ela não está rejeitando normas de gênero impostas e ela, mas sim reproduzindo a masculinidade tóxica de uma homem asqueroso, mas que não se curva aos demais, pois ela não quer se curvar ao mundo.

Acho notável que Helga inclusive herdou sua catchphrase de Bob, a palavra “Criminy” que ambos gritam quando algo dá errado. O que eu acho que meio que não foi traduzido consistentemente na versão dublada para notarmos que ela tinha uma catchphrase, mas eu lembro de uma situação especifica em que ela grita “Criminoso” aleatoriamente no meio de um episódio.

Se Helga não recebe amor ou cuidados básicos de Bob e Miriam, ela recebe uma chuva de amor de Olga, que adora sua irmãzinha, e quer ser a melhor irmã do mundo. Mas Helga se fecha pra irmã. Parte disso é por inveja, por saber que nunca vai ser boa o suficiente igual a Olga, vai ser sempre comparada a Olga, e tem raiva da atenção e amor que ela recebe, e parte também é pela sua necessidade de ser durona e rejeitar pessoas que a amem. Helga é jovem demais para ser independente, e rejeita pessoas que a tratem como alguém que precisa ser amada ou cuidada. Ela rejeitou sua babá, e ela rejeitou sua irmã.

Helga convence Olga a ir pro Alasca, sob o argumento de que elas só serão próximas se estiverem fisicamente distantes.

Helga é uma vítima de suas circunstâncias, ela não escolheu sua família, ela está jogando o jogo com as cartas que foram dadas pra ela. Mas ela é um agente ativo em sua própria miséria, ela rejeita ajuda, rejeita afeto, e criou uma mentira pra si mesma de que ela precisa ser forte que obriga ela a esconder um lado sensível que é uma parte forte de quem ela é.

Helga, a antítese de Arnold:

Helga é a bully de Arnold, isso está presente na maioria dos episódios, mas isso raramente é o tema do episódio. É só algo que está sempre acontecendo e sabemos. Mas quando o episódio é diretamente sobre a relação de Arnold com Helga, o episódio provavelmente não será sobre bullying. E também não será sobre romance. Será sobre a maneira como Helga e Arnold tem visões de mundo contrastantes.

Esse episódio não é sobre religião. É sobre um trem fantasma que te leva pro inferno…. ok, talvez seja 5% sobre religião.

Arnold é um rapaz idealista. Ele não sempre foi, os primeiros episódios não tratavam ele como o auge da decência humana, mas de um ponto pra frente, ele se torna exatamente isso. O auge da decência humana, a criança mais honesta e mais ética do mundo, que tentava fazer do mundo um lugar melhor ajudando as pessoas. Arnold tenta ver o melhor nas pessoas, ele acredita no poder da compaixão e do trabalho de equipe e na maneira como se todo mundo se ajudar tudo dá certo. Ele tem um senso forte de coletivo, e de como é preciso que todos estejam bem.

Helga por outro lado é cínica. Ela vê o pior do mundo e o pior do que os outros tem a oferecer. Ela acha trabalho e equipe e compaixão não te levam pra frente, pois as coisas continuarão dando errado. E ela é individualista, ela cuida do que é dela e não olha pra trás.

Quando diante de um dilema, Arnold é um constante conselheiro da ética, e de falar que deve-se fazer o certo. E Helga é uma grande conselheira do cinismo, de que fazer o certo pode trazer problemas, e que deve-se fazer o vantajoso.

Arnold constantemente aparece nos episódios da Helga para ser o anjo no ombro dela e fazer ela ser uma força do bem. E Helga constantemente aparece nos episódios do Arnold para zombar de sua esperança e crença na humanidade. E independente se o episódio é focado na Helga ou no Arnold, o conflito dessas perspectivas é a base do conflito entre os dois. E que conste, Helga não está forçando uma falta de esperança no Arnold como parte do seu jogo tsundere de falar o oposto do que sente. Não, ela de fato discorda de muitas coisas do seu amado. E isso é parte do ponto.

Embora a gente saiba que a Helga se apaixonou pelo Arnold quando ele deu atenção pra ela no Pré-Primário e elogiou o seu laço rosa, eu acho simplista resumir o amor de Helga a isso. Vários episódios deixam claro que a capacidade do Arnold de seguir integro, não importa o que o mundo jogue nele, e de continuar acreditando no melhor é algo que ela admira. Que ela o vê como um herói que luta uma luta que não conseguirá ganhar, mas que é heroico justamente por seguir lutando.

Helga não está meramente presa a um único grande ato de gentileza que Arnold fez pra ela que ele nem deve se lembrar. Ela vê nele uma pessoa que vê o que o mundo tem de pior cara a cara e consegue aguentar. Ela constantemente joga na cara de Arnold o que não está no poder dele, mas no final ele prova o contrário.

Helga e Arnold funcionam como um Ying e Yang. Os dois precisam se completar. Arnold precisa ser lembrado que as vezes as boas intenções de uma criança não são o suficiente para fazer as coisas melhores, e que tem coisas que não estão no poder dele. Mas Helga precisa de Arnold para lembrar que ainda vale a pena tentar o seu melhor. E Arnold inspira Helga a fazer o bem, e a tentar ser melhor.

Mais de uma vez, Helga secretamente atuou como a ajudante secreta de Arnold, fazendo seus planos darem certo sem ele perceber. O maior exemplo disso sendo quando ela abriu mão do próprio presente de natal, para fazer um burocrata ficar algumas horas a mais no trabalho localizando a filha do Sr. Hyunh.

Aliás é fascinante o quanto a Helga se atrai por bondade. Sua melhor amiga Phoebe é disparada uma das pessoas mais morais e éticas da escola. Helga tem muita negatividade dentro de si, mas ela tende a simpatizar muito com pessoas que não tem essa raiva e podem servir de consciência pra ela.

E tende a realmente se incomodar com filhos da puta.

Helga tem muito medo de parecer fraca ou de baixar a guarda, mas quando ela sabe que terá anonimato, ela se mostra uma grande aliada para pessoas que nem sabem que ela está ajudando. Teve a vez também que Arnold convence ela a não deixar Olga arruinar a vida em um casamento ruim, pois mesmo que ela odeie Olga, irmãs devem se ajudar. Helga enxota o noivo boy-lixo da Olga de casa na base da ameaça, e inventa uma história bonita para Olga não perceber o quanto o cara era um boy-lixo.

Inclusive, ela escreve uma carta bonita e emocionante pra Olga em um instante o que não é surpreendente, é só um ponto que é muito subestimado na Helga.

Helga, a aluna brilhante.

Contrariando a maioria dos tropos associados a personagens bullys, Helga é uma excelente aluna. Geralmente os desenhos animados fazem um ponto de reforçar que bullys são burros, e quando são inteligentes, eles possuem a inteligência das ruas, não dos estudos. Afinal de contas eles socam os nerds.

Não Helga. Helga é na verdade uma ótima aluna, e isso só não é visível por que a sombra da perfeição de Olga está sempre escondendo ela.

Ela é uma excelente aluna de inglês e literatura. Não só ela é a finalista do campeonato de soletrar da cidade, como os poemas que ela escreve pra escola são apreciados pelo professor, que respeita o desejo de Helga de não ter seu lado sensível exposto, mas comenta pra classe como um aluno anônimo é o melhor poeta da classe. Helga tem um vocabulário mais rebuscado que a média e seu talento com poesia não é surpreendente, uma vez que ela faz diversas declarações floreadas em homenagem a Arnold na maioria dos episódios.

Outro episódio também a destacou como uma das boas alunas em matemática.

Mas o mais importante é no episódio em que eles fazem um teste de aptidão, em que Helga tem o resultado mais impressionante do teste, e recebe o resultado de que ela é um gênio e essencialmente pode ser o que quiser da vida. O conflito do episódio é que os resultados foram trocados com os de Harold, um aluno ruim. E Helga passou o episódio acreditando que ela era péssima enquanto Harold acreditava que ele era um gênio. E o pior, a maioria das pessoas não achou que o resultado da Helga era estranho.

Além de méritos acadêmicos, Helga é uma boa esportista. Ela tem talento em baseball e futebol americano e joga constantemente com os meninos. Além de ser a capitã do time de boliche.

E ela é culta, é a personagem mais provável de citar que já leu 1984 ou que conhece e tem opiniões sobre os quadros de Edward Hopper.

Helga não tem uma coleção de troféus para levar pra casa, mas ela é uma aluna não só exemplar como versátil. Ela tem inteligência, aptidão física e talento para perseguir qualquer tipo de futuro que ela quiser. Mas isso fica sempre no subtexto do quanto ela tenta pouco e se sabota, pelo medo de ser comparada com Olga.

Acho brilhante que enquanto ela desabafa sobre a perfeição da Olga pra sua terapeuta, ela acerta todos os dardos no alvo casualmente.

Existe uma tragédia implícita em como a Helga tem um potencial que não é incentivado ou motivado pelas pessoas a sua volta, pois chama menos a atenção que a sua personalidade agressiva. Ela pode ter um futuro brilhante, mas os episódios não passam a impressão de que ela vê um caminho brilhante na sua frente.

Ela não é reconhecida ou validada por ser um gênio, pois ela busca validação pela violência. E ela não é amada pelo crush, pois ela pratica bullying nele.

Helga, o interesse romântico:

Agora vamos pra pergunta mais importante: Helga ama Arnold, ela quer ficar com Arnold, eu torci pra ela ficar com Arnold e praticamente todo o fandom do desenho torceu junto. No fim do Jungle Movie ela fica com Arnold. Ela confessa seu amor pra ele, eles se beijam e começam um relacionamento. Mas a pergunta é: ela merece o Arnold?

Depois de tudo o que ela fez, por mais que o Arnold a perdoe por ser um santo, o quanto a obsessão dela pelo crush não foi pra níveis tóxicos ao longo dos episódios.

Helga roubou pertences pessoais de Arnold, stalkeou ele e invadiu a casa dele escondida mais vezes do que dá para contar. A obsessão de Helga por Arnold foi pra níveis extremos. E a própria série parece meio dividida em reconhecer o exagero da maneira como a Helga ama o Arnold. A psicóloga dela, Dra Bliss, disse que é tudo saudável desde que ela não machuque ninguém, mas no primeiro filme, vemos que quando Helga resolve ser aberta e honesta com seus sentimentos com Arnold, ela fica mais invasiva e assustadora do que quando ela fazia bullying, e realmente assusta o rapaz.

Helga é uma pessoa extrema. Tudo nela é extremo. Sua raiva se manifesta em um soco. Suas frustrações se manifestam em declarações poéticas sobre seu sofrimento. Seu amor se manifesta em obsessão invasiva. Quando ela está feliz ela está eufórica e quando ela está triste ela está em lágrimas que sua vida foi destruída. E as suas descrições sobre a maneira como ela ama o Arnold são tão intensas que algumas passagens até soam mais eróticas do que o poema de uma criança deveria soar… a internet nota essas coisas.

Tudo o que ela sente ela sente em 120%, e provavelmente é por isso que ela é uma protagonista tão boa.

Não importa o que ela queira, ela está disposta a ir pro extremo, para nos limites de um desenho que tenta ter um tom realista, fazer coisas que nenhum expectador faria. Ela fuçou por horas no lixão para achar o Chapéu do Arnold e devolvê-lo. Ela ia matar um papagaio, literalmente matar um pássaro, pois ele podia revelar seu segredo. Ela invade uma casa e passa a noite dentro de um sofá. Ela cruza limites éticos o tempo todo, mas a gente sempre vê ela da perspectiva de alguém que está expressando emoções muito fortes, seja amor, seja raiva.

Ela não soa como alguém que seria uma boa namorada de Arnold, mas soa como alguém que lutou muito, e sofreu muito por querer ser.

E bem, no final de tudo ela consegue, ela se torna namorada de Arnold, e não temos a menor ideia de como será esse relacionamento, não sabemos se o Arnold, que consegue consertar as mais difíceis das pessoas vai realmente consertar Helga. Um projeto do criador de spin-off adolescente que nunca foi feito sugeria que o relacionamento ia ser complicado.

Mas mesmo duvidando que seja saudável, eu torci por eles, e fiquei feliz que eles ficaram juntos e em particularmente fiquei feliz pela maneira como a declaração foi feita. Arnold precisava de uma chave no formato de coração para completar sua aventura e salvar seus pais, e a chave original foi perdida. Por uma incrível coincidência, o medalhão de coração com a foto do Arnold, que Helga carrega com ela desde os primeiros episódios, que é uma das marcas registradas da personagem, um símbolo dela onipresente na série inteira, esse medalhão tem o exato formato que Arnold precisava para salvar seus pais.

E diante de algo tão mais importante do que crianças apaixonadas, Helga mostra pro Arnold o medalhão que ela carrega com ela, e dá para ele e não explica o contexto, somente entrega o medalhão. Ela explica que a chave original era de ouro verdadeiro, e o dela era só pintado de dourado, então que ela não sabia se ia funcionar. Mas Arnold só olha em choque e responde, que ele confiava, de que o coração era muito mais puro do que Helga acreditava que era. E acho que esse foi o segredo dessa cena. Fazer a cena ser menos sobre o Arnold decidindo se gostava da Helga, mas sobre ele enfim vendo com clareza a pessoa boa que a Helga tinha dentro de si e escondia.

O relacionamento deles vai ser cagado? Muito provavelmente. A Helga é uma pessoa quebrada e com problemas de auto-sabotagem e não é como se o amor de Arnold fosse resolver tudo. Mas no fundo não era sobre o namoro dar certo, era sobre Helga conseguir se abrir e ser vista por quem ela é. Mesmo que ela seja uma bully, stalker escondendo um coração empático e sensível.

Conclusão:

Se eu tivesse que resumir Hey Arnold com um único adjetivo, seria “não idealizado”. O mundo de Arnold não é bonito. A cidade é suja, os personagens caminham nas ruas e tem mendigos na rua, tem assaltantes, tem lixo na rua, a calçada está rachada. Arnold não vive em uma família nuclear, vive em uma pensão criado pelos avós. A avó de Arnold tem problemas cognitivos causados pela idade com os quais é difícil lidar. Os inquilinos da pensão são imigrantes que trouxeram problemas com eles. O Sr Hyuhn é um sobrevivente da guerra do Vietnã que se separou da filha quando fugiu pros EUA e demorou vinte anos para encontrá-la. O Sr. Kokoshka é um homem desempregado e sustentado pela esposa em um casamento tóxico. A menina que Arnold ama, Lila é criada por um pai solteiro que não tem dinheiro pra dar uma vida de conforto pros dois. Helga vive em uma família nuclear que é abusiva e tóxica O professor de Arnold é um homem gay que tem conflitos com a família querendo empurrar uma namorada pra ele e não reconhecer a existência do seu parceiro. O garoto chocolate é uma metáfora pouco sutil para dependência química, e come chocolate do lixo por causa de seu vício. As crianças jogam bola na rua e tem que prestar atenção nos carros.

Essas crianças testemunham a complicação da vida dos adultos, e o ambiente hostil e pouco acolhedor que é a vida urbana, e mesmo assim dão o melhor delas. Existe um constante ar de “A vida não é o que venderam na televisão, mas é o que temos para hoje”. Os personagens vivem com o que tem, e acham felicidade nos momentos inocentes da infância e também sabendo que eles podem se ajudar como podem para fazer a vida ser melhor.

E Helga personifica esse aspecto do desenho. Ela não veio de um passado bonito, seu presente não é bonito, e ela provavelmente não vai pra um lugar bonito no futuro. E é trágico pensar no potencial dela que poderia ser explorado em um ambiente menos desgraceiro. Mas nessa porcaria de situação, Helga faz seu melhor. Ela se atreve a ser ela mesma, ela vê valor na sua auto-expressão e na sua espontaneidade. E vê paz e uma válvula em um garoto que insiste em não se intimidar com o mundo e em ajudar todo o mundo.

Eu gosto que a sessão de terapia dela terminou nela essencialmente perguntando se estava tudo bem ela ser ela.

Eu comecei o texto falando que eu achava que a Helga e o Zuko eram os personagens mais complexos da Nickelodeon, e escrevendo esse texto agora eu acho que eles, na real, têm muito em comum. Uma divisão entre o bem e o mal. Complexo de inferioridade por causa de uma irmã perfeccionista. Uma tentativa de negar a influência de seu pai na sua vida, mas ainda reproduzindo alguns de seus defeitos. São definidos pela intensidade de seus sentimentos, e pelo contraste entre amor e raiva. E a genuína tentativa de ser bom puxada pelo amor pela pessoa mais moral da série. Se o Zuko fosse um personagem do ensino fundamental em um slice-of-life urbano, é isso que ele seria. O bully do coração de ouro, com problemas para direcionar a sua raiva.

Eu sinto muita falta de Hey Arnold, eu fiquei fantasiando que na Era do Reboot que vivemos, talvez o Jungle Movie conseguisse puxar uma sexta temporada, mas nada disso aconteceu. E ninguém falou sobre desenterrar o projeto de Spin-off: “The Patakis” para mostrar a adolescência da Helga. Uma pena. Pois eu acho que era uma série que agregava bastante.

E eu acho que ainda tem muitas histórias boas para serem escritas sobre Helga Pataki.

Sobre o autor

Izzombie

Sou um cara chato que não consegue ver um filme sossegado sem querer interpretar tudo e ficar encontrando simbolismos e mensagens. Gosto de questionar a suposta linha que separa arte de filmes comerciais, e no meu tempo livre pesquiso sobre a história da animação.

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Sou um cara chato que não consegue ver um filme sossegado sem querer interpretar tudo e ficar encontrando simbolismos e mensagens. Gosto de questionar a suposta linha que separa arte de filmes comerciais, e no meu tempo livre pesquiso sobre a história da animação.

Alertas

  • – Todos os posts desse blog contém SPOILERS de seus respectivos assuntos, sem exceção. Leia com medo de perder toda a experiência.
  • – Todos os textos desse blog contém palavras de baixo calão, independente da obra analisada ser ou não ao público infantil. Mesmo ao analisar uma obra pra crianças a analise ainda é destinada para adultos e pode tocar e temas como sexo e violência.

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