Sabe uma coisa que não é tão popular quanto eu queria que fosse? Musicais. Eu adoro musicais, mas eu sinto que é uma linguagem cinematográfica que encontra muita resistência das pessoas e sofre uma chacota injusta. Que muita gente de fato se recusa a ver só por ser musicais, e que o cinema recebe pouco incentivo para arriscar fazer um filme musical sem a publicidade de estar adaptando uma peça de renome da Broadway.
….com uma grande exceção.
A Disney! Todo mundo adora a Disney! A maioria absoluta dos filmes Disney são musicais e essa é parte do carisma deles e ninguém trata filmes como Frozen ou The Lion King como nada menos que filmes de impacto gigantesco no imaginário popular. E todo mundo ama Disney. Todo mundo amou Let it Go, todo mundo amou Hakuna Matata,. Eu moro na frente de um salão para eventos e todo casamento eu consigo ouvir os caras tocando Beauty and the Beast da minha sala. When you Wish Upon a Star fez discos de Pinnochio venderem que nem água 80 anos atrás e We Don’t Talk About Bruno se tornou a música mais ouvida do spotfy na semana em que estreou. As músicas da Disney são um bagulho de louco em popularidade e com isso os filmes da Disney estão entre os filmes musicais que mais despertam amor entre as pessoas.
Mesmo quem odeia musical, provavelmente não odeia The Lion King, e não boicota filmes Disney. Só boicota filme Disney quem é contra corporações do mal dominando o mundo. Mas pro resto as músicas dos filmes pegam as pessoas de verdade.
E pegam a mim em particular. Estamos no fim de ano, é a época do seu aplicativo de música falar o que você mais ouviu esse ano, e no meu caso, a música que eu mis ouvi esse ano foi o cover da Ariana Grande de Zero to Hero, do filme Hércules. E a segunda música que eu mais ouvi esse ano foi Surface Pressure de Encanto. E se olhar o top10 ainda encontramos a versão do Will Smith de Arabian Nights pro live-action de Aladdin e a versão original de Part of Your World de The Little Mermaid.
Eu ouço muita música da Disney. Eu adoro. Eu tenho uma facilidade muito maior pra me conectar emocionalmente com música que eu consigo associá-la a uma narrativa pré-estabelecida, e por isso, mais da metade do que eu ouço vem de musicais, e deles a Disney ocupa um grande espaço.
Pois essas músicas são boas mesmo! E esse texto é para falar bem delas. Eu quero aqui falar sobre 20 músicas da Disney que pra finalidade de escreve esse texto eu elegi as melhores.
Antes de entrar no assunto do texto quero avisá-los que o Dentro da Chaminé é financiado pelos seus leitores e que se você gosta do blog e dos meus textos, você pode ajudar o blog fazendo parte do nosso financiamento coletivo no apoia.se, onde você pode contribuir com o valor que achar justo. O apoio me ajuda bastante. Ajudou esse a ser um dos meus anos mais produtivos, e espero que em 2023 eu seja ainda mais produtivo do que fui em 2022. Se não quiser se comprometer com um apoio mensal, você também pode ajudar o blog fazendo um pix de qualquer valor para a chave franciscoizzo@gmail.com que tem igualmente minha gratidão e receberá uma homenagem aqui também.
Esse texto é em homenagem aos que já me apoiam, os verdadeiros heróis do Dentro da Chaminé, e aqui eu quero incluir um agradecimento pelo ano de ajuda, e por estarem ao meu lado por esse ano aqui. Espero de coração que gostem do texto.
E esse texto é um texto sobre as melhores canções Disney.
O que inclusive é propaganda enganosa que eu fiz. Pois é menos sobre a canção no vácuo e mais sobre as cenas musicais da Disney. Eu vou ranquear as canções, mas vou incluir no meu julgamento a qualidade da cena, o contexto em que ela é cantada e o papel que ela ocupa no filme. Até porque, e isso é importante de se dizer: eu não sei realmente falar tecnicamente sobre música, descrever uma melodia, falar de notas, acordes, instrumentos nem nada disso. Então vai ser menos sobre ser uma música boa somente, ou de elogiar o talento do compositor e mais sobre ser uma boa cena girando em torno de uma música.
Pois o ponto do texto é menos provar que vale a pena ir em um show que toque essas músicas, e sim questionar o preconceito que as pessoas têm com musicais. Explorar como essas músicas funcionam, como músicas em filmes funcionam, e fugir desses papos bestas de “Áh, mas não é realista alguém começar a cantar do nada.” Ou de “Oxi, mas como todo mundo sabe a coreografia disso?”.
Antes da lista começar quero estabelecer as regras.
1-) Só estou considerando os 61 filmes clássicos da Disney. Excluindo sequências-direto-pra-dvd, Pixar e todas aquelas outras coisas que não contam de verdade. O que é bom, pois se reduzir as todas as músicas para somente 20 já deu trabalho, imagina se eu ainda tivesse que considerar coisas como Coco, Nightmare Before Christmas ou A Goofy Movie. De verdade, gente, eu peguei o meu caderno aqui pra ver o que não podia faltar fui escrevendo e vi que escrevi 40 músicas, então eu matei metade dos meus amores e fiz a lista. Ter coisa que ia deixar a decisão mais difícil sendo excluído por tecnicalidade é bom.
2-) Eu vou incluir as reprises como parte da música, e se eu eleger uma música com reprise, eu vou falar também de sua reprise, e não tratar como músicas separadas.
Eu tentei evitar focar muito em uma época só da Disney, e eu falhei muito, a fase da renascença (tudo entre The Little Mermaid e Tarzan) vai ter representação desigual na lista. E eu queria não repetir filmes, mas… falhei nessa também. De qualquer jeito tudo o que eu mencionar por nome ou imagem que não estiver na lista é, por default, uma menção honrosa.
Então comecemos com.
20º The Work Song – Cinderella
Cantada por: Todos os ratos.
Já abrindo aqui pra falar uma coisa que é óbvia, mas faz toda a diferença e vai se aplicar pra lista inteira. A grande maioria das músicas Disney são cantadas por um personagem. Raramente as músicas são cantadas por um narrador invisível. Um número considerável de filmes Disney, em fazes diversas do estúdio tem um personagem como seu narrador, fazendo com que mesmo a cantoria de um narrador tenha uma voz. Existem algumas raras exceções em que uma voz do além surge só pra cantar uma música.
Essas exceções são em números de abertura, quando essa voz é a nossa porta de entrada para a história e desaparece para anunciar que o filme começou de verdade. A segunda exceção é quando o personagem começa a canção preparando o terreno e é substituído pelo narrador depois que a música já começou. E a terceira opção é quando o diretor do filme odeia musicais e se recusa a ter seu personagem cantando, nesse caso é só o caso de Tarzan, que delegou todas suas músicas a narradores. Por isso também filmes que não são musicais, usam narradores em seus poucos números musicais, como Lilo and Stitch e Treasure Planet.
Algumas das exceções vão estar na lista. Mas no geral, um narrador enfraquece a música. Pois o ponto de um filme musical, é que os personagens se expressem por música. A música é uma arma para que eles possam dar voz para um sentimento de maneira mais teatral, e, portanto, mais intensa. A música serve como um amplificador para o estado emocional de seus personagens.
Por isso muitas delas aparecem justamente em grandes pontos de virada de seus filmes.
Em Cinderella, a música dos ratinhos é menos icônica do que Bibbidi Bobbidi Bu ou A Dream is a Wish Your Heart Makes, mas não deixa de ser um dos momentos mais famosos do filme. Só evidencia que os momentos mais marcantes de Cinderella são marcados por música.
Na canção, o ratinho Jaq começa desabafando o quão injusta é a situação de Cinderella e como suas Irmãs de Criação são escrotas. O que é um gesto de empatia. Cinderella guarda suas frustrações em silêncio, e demonstra sua força em nunca se deixar sair do sério, ou demonstrar que os abusos que ela sofre estão quebrando ela psicologicamente. Cinderella nunca deixou de ser gentil ou se deixou ficar amarga, pois ela reprime dentro dela, então seus melhores amigos desabafam aquilo que ela não se deixa desabafar. Que é um absurdo a maneira como forçam ela a trabalhar feito escrava.
No idioma original em inglês, eles fizeram os ratinhos todos falarem em uma linguagem particularmente infantilizada e fofa, o que nessa música gerou um contraste interessante, em que eles falam de maneira fofa enquanto descrevem abusos sérios que a amiga deles sofre. Como se a situação da Cinderella fosse tão horrível que até uma criatura inocente que vê um mundo cor-de-rosa pudesse ver com clareza que aquilo estava errado.
Após o desabafo de Jaq e sua desilusão de que Cinderella nunca vai ter tempo de fazer um vestido pro baile, vem a réplica da ratinha, que mantendo o mesmo ritmo, mas em um tom bem mais otimista, sugere que os próprios ratos façam o vestido e o deem pra Cinderella.
Tem uma moral forte, em Cinderella por insistir em ser gentil, praticar sua gentileza alimentando e cuidando todos os animais da casa, até os ratos. E a gentileza e recusa a perder esse traço de personalidade voltar até ela, com todos os animais da casa sendo gratos o suficiente para ajuda-la em seu momento de crise. Isso é forte no clímax do filme, mas é estabelecido aqui, que todos vão fazer um vestido pra ela, pois ela merece esse carinho.
Com o passar da música, eles mudam, e em vez de seguir na melodia do desabafo de Jaq sobre como nada dá certo, eles passam a música para A Dream is a Wish Your Heart Makes enquanto trabalham, mostrando o quando os ideais de Cinderella influenciam eles, e eles acreditam no que ela ensinou.
Excelente momento, de um excelente filme. Acho que Cinderella merece mais atenção do que recebe, mas isso é conversa pra outro dia.
19º Cruella DeVil – 101 Dalmatians
Cantada por: Roger
Baixo, né? Pois é, o nível aqui é altíssimo. A música é simplesmente a coisa mais famosa que o filme tem pra si, e ficou em penúltimo. Isso porque vocês nem viram a alta qualidade das músicas que ficaram de fora.
Pois bem, Cruella DeVil é uma canção diegética, palavra que aqui significa: uma canção que de fato é reconhecida como uma canção dentro de seu universo, com Roger sendo um compositor se inspirando na amiga asquerosa de Anitta para achar as letras da melodia que ele havia composto. Ele estava tentando achar as letras, e vendo Cruella ele tem uma epifania e começa a cantar sobre a maldade da vilã.
Apesar de matar filhotes de cachorro ser de uma crueldade imensa, e emocionalmente nos faz coloca-la entre as pessoas mais cruéis da história do cinema, a verdade é que a Cruella é uma das vilãs da Disney com planos menos ambiciosos. De uma série de pessoas tentando conquistar o mundo, cometer genocídio, governar um reino e cometer atos que destruiriam a vida de milhares de pessoas, Cruella não quer nada mais que um casaco bonito e suas ações afetariam mais ou menos sete famílias em Londres que perderiam seus cachorros. Por isso parte do que nos permite emocionalmente falar que Cruella é tão cruel quanto ser um Rei Tirano que mata os súditos por diversão, é porque essa música estabelece isso. A comparando com Satanás em pessoa e com os piores elementos do mundo.
Após escrever essa música, Roger vai pro seu estúdio tocar ela como um protesto a presença de Cruella em sua casa. E conforme ela fala sendo rude e desagradável, ouvir a música no fundo deixa os cachorros tranquilos de ver que tem gente do lado deles e que essa mulher não é bem-vinda.
E após Cruella ir embora, Roger continua com a segunda metade da letra, reforçando para nós, que ela é a pior pessoa do planeta, uma presença maligna. A reputação de Cruella é essa música, e sem ela, não teria um spin-off só dela explicando que ela é só uma jovem criativa que na verdade ama cachorros e nunca machucaria um.
18º Why Should I Worry – Oliver and Company
Cantada por: Dodger.
Músicas em filmes, são momentos de expressão, para o personagem por fora seus sentimentos. Por isso, músicas acabam sendo excelentes maneiras para um personagem se introduzir. Ele canta sobre quem ele é, o que ele faz, o que ele quer, qual é a rotina dele e nos primeiros minutos em que o conhecemos já sabemos exatamente quem é esse personagem. O que é bom, músicas são maneiras rápidas de conhecermos personagens.
E vale para todo tipo de personagem. In Summer introduz Olaf, o secundário-alívio-cômico pra gente. Shiny introduz Tamatoa, um personagem que não realmente tem presença fora da sua única cena cantando a música. One Jump Ahead introduz Aladdin, o protagonista. E Why Should I Worry introduz Dodger, o melhor amigo/mentor de Oliver em Oliver and Company. Todas maneiras muito eficientes de gerar instantaneamente uma primeira impressão do personagem.
Oliver and Company é um filme sobre um gato que é adotado por uma gangue de cachorros treinados para bater carteiras para seu dono pobre poder pagar suas dívidas com um agiota terrível. Esse gato é eventualmente adotado por uma garota rica, e fica dividido entre o laço e acolhimento que recebeu de ambos os lados, com receio de que soe que ele está rejeitando seus amigos em prol de conforto. E as músicas do filme trabalham bem o contraste entre os dois mundos. Com duas músicas sobre como é a vida na mansão de Jenny e duas músicas sobre como é a vida nas ruas de Nova York.
Why Should I Worry é isso, uma celebração da independência e do quão descolado e livre Dodger é. Ele tem estilo, carisma, papo e nas ruas de Nova York ele consegue tudo o que quer. Todos os cachorros admiram ele e todos querem ser que nem ele. Ele acabou de roubar comida do Oliver e está se gabando de sua malandragem, mas conforme Oliver não está achando ele legal e quer roubar suas linguiças de volta, a audiência está achando Dodger fascinante.
Conforme Dodger aceita que Oliver vá morar em uma mansão no luxo no fim do filme, ele deixa claro que Oliver sempre vai ser parte do grupo, mesmo longe reprisa a música dessa vez com toda a turma da rua cantando junto, mudando o refrão para “Why Should We Worry”, mostrando que o estilo de vida deles vai continuar, e eles vão seguir no coração de Nova York.
Dodger é um grande personagem e a força de seu personagem é grande parte do motivo pelo qual Oliver and Company funciona bem, e no centro de tudo isso está sua música introdutória.
17º: You’re Welcome – Moana
Cantada por: Maui.
Sabem, eu acho que as músicas dos filmes musicais têm uma má reputação de começarem do nada. E eu acho essa reputação injusta. Geralmente paródias de musicais tentam fazer a situação parecer ridícula com uma cena de repente virando uma música. Mas se você reparar nos filmes Disney a transição é bem mais sútil.
É sério, você vê o tempo todo os personagens de comédia entrarem em músicas com o timing menos natural do mundo, em que a situação escala para algo over-the-top em questão de segundos. Mas em muitos dos filmes da Disney, a música começa a partir de um diálogo. O personagem não está cantando sozinho, mas cantando pra/com alguém. Eles estão conversando, em determinado ponto da conversa a trilha sonora já começa a se adaptar a canção que virá, o ritmo começa a aparecer, mas os personagens ainda estão falando normalmente. Um dos personagens dá a deixa e o outro responde começando a canção, de maneira calma.
Eu não estou pondo os vídeos das cenas nesse texto. Pois o youtube é muito instável, e muito vídeo legal que eu coloquei em textos anteriores depois é removido deixando um buraco feio nos meus textos. E a Disney pra sair removendo conteúdo online precisa de muito pouco. Mas vocês podem notar vendo vídeo de canções Disney no youtube, que o vídeo sempre começa com os personagens falando normalmente até um dar a deixa pra canção. A música já começou no plano de fundo, mas a conversa ainda está normal. A parte não cantada é parte da música já.
E eu adoro essa transição em You’re Welcome. Que começa com Maui tentando convencer Moana que ela deve agradecê-lo. Adoro como a confusão genuína dada Moana diante de Maui fez ele puxar um “okay, okay”, e então ele começa uma canção que aparente querer explicar as coisas pra ela calmamente e vai gradativamente escalando em Maui se gabando por tudo o que fez.
Essa música não só introduz o Maui, que é na minha opinião o grande personagem de Moana e o maior charme do filme, mas introduz não só sua personalidade, mas principalmente seu passado e seu conflito central. Ele não tem vergonha de ser um deus trapaceiro, famoso por enganar e passar a perna, pois ele se vê como alguém que salva a humanidade. E os humanos não o reconhecerem como um salvador e não serem gratos pelas inúmeras conquistas que ele deu aos humanos é o conflito central do personagem.
Mas o que eu mais amo em You’re Welcome é a maneira como o cenário vai ficando cada vez mais lúdico para mostrar que a Moana está comprando tudo o que o Maui está vendendo de si, pegando cocos imaginários sendo levada por ele. É um grande momento, e disparada a minha música favorita do filme.
16º The Phony King of England – Robin Hood
Cantada por: Little John.
Outra canção diegética. Em que os personagens estarem cantando e dançando não requer nenhuma licença poética em relação a aquilo tudo é literal ou não. Eles estão em uma festa, reunindo toda a oposição ao tirânico Príncipe John, e então cantam uma música de protesto em relação ao quão patético e mau governante era seu monarca.
Curioso que assim como com Cruella DeVil, quando os personagens de fato estão compondo uma música, ela existe com o propósito de atacar o vilão do filme.
The Phony King of England é uma música alegre que faz chacota do Príncipe John e que dá aos personagens algo para rir, dançar, celebrar e se gabar. Vemos todos os aliados de Robin Hood curtindo e vemos um momento de calma e de relaxamento dos heróis que vai anteceder o ponto de virada do filme. O príncipe ao descobrir que existe uma música de protesto popular entre o povo vai punir o povo todo e prender a maioria dos aliados de Robin Hood, para censurar a música.
Eu, como muitas outras pessoas nos últimos anos, tenho aprendido o quão importante é conseguirmos tirar um tempo para vermos nossos amigos e xingarmos um eventual presidente genocida. É bom pra cabeça por isso pra fora, e essa música expressa muito bem a maneira como uma festa, com música, dança e risos pode ser um protesto e um símbolo de resistência.
15º I See the Light – Tangled.
Cantada por: Rapunzel e Eugene Fitzherbert
Ok, eu tinha decidido pra mim mesmo que somente um dueto romântico viria pra essa lista, e ganhou I See the Light, lamento por quem queria ver A Whole New World na lista, a música de amor de Aladdin é uma das mais icônicas da história do estudo. Mas eu realmente quero falar bem de I See the Light.
I See the Light tem muita coisa em comum com seu irmão mais velho, mais popular, mais bonito, mais bacanudo e que ganhou um Oscar. As duas músicas são sobre sua respectiva princesa repensando os valores pelo qual ela viveu, e as infinitas possibilidades de futuro após uma mudança de perspectiva. E essa mudança de perspectiva vem dela estar testemunhando uma visão muito bonita ao qual ela não tinha acesso em sua vida anterior, e do fato dela perceber que a companhia de seu parceiro, por quem está se apaixonando foi quem abriu essa porta.
Inclusive ambas as canções descrevem a clareza da mudança de perspectiva veem essa com frase “It’s crystal clear”. O equivalente inglês de “é claro como água”. Mas isso é só coincidência. É só pra rimar com “here”. Mas é uma coincidência divertida.
Agora, o que eu quero ressaltar que I See The Light fez de especial para roubar o lugar de A Whole New World é o seguinte: Eu acho fascinante primeiro que I See the Light começa como uma música que está tocando somente na cabeça de Rapunzel e Eugene. Nós ouvimos a canção, mas eles não estão cantando, eles estão pensando no que está havendo, cada um cantando pra si. Eles estão pensando aqueles sentimentos enquanto observam a situação, a beleza do festival dos fogos e um ao outro. Quando Eugene segura a mão de Rapunzel os dois instantaneamente começam a cantar a música, e aí a música para de ser o verso dele seguido do verso dela e os dois cantam juntos.
O que deriva de outro ponto. Que é o Eugene estar descobrindo essas coisas junto de Rapunzel, ele também vê a futilidade dos sonhos materiais dele, e adquire um nova perspectiva ao ver como Rapunzel se conecta com as luzes. E eu aprecio muito a ideia da descoberta mútua, os dois estão se redescobrindo, os dois estão tendo uma epifania e se apaixonando.
Tangled é um filme excelente. Eu não sinto que recebe os devidos méritos.
14º God Help the Outcasts – The Hunchback of Notre Dame
Cantada por: Esmeralda
The Hunchback of Notre Dame é um dos poucos filmes da Disney que dá muito espaço pra religião em sua história. E toda a legião de fãs do filme que quer muito bater no ponto do filme tocar em temas muito mais sérios e adultos que os demais filme da Disney nunca esquecem de mencionar o quanto o filme toca no tema da religião. Especialmente pra falar que seu vilão é um fanático religioso querendo justificar um genocídio. Todo mundo adora elevar isso. Eu próprio adoro, afinal eu considerei o Frollo o maior vilão da história da Disney.
E justamente por isso que eu acho levemente triste que God Help the Outcasts seja uma música tão ignorada e esquecida no panteão de músicas Disney. Afinal God Help the Outcasts é uma reza. Uma grande oração em forma de música que coloca a questão da religião no filme em primeiro plano.
No filme Esmeralda havia pedido abrigo dentro da igreja, pois a polícia não poderia prendê-la enquanto ela estivesse dentro. Mas claro que a polícia cercou essa igreja e nessa decisão ela própria se prendeu. E nessa prisão ela vai até a estátua de Maria e reza.
A música enfatiza aquele espaço como um espaço ao qual Esmeralda não realmente pertence. Ela abre a música questionando, que não sabe nem se Maria realmente ouve as preces, nem se ela está dentro da igreja e que não sabe se preces de ciganos não são ignoradas. O que é bem forte. Eu não sei muito sobre ciganos, e um google bem picareta que eu dei agora me induziu a crer que muitos deles são católicos, mas igrejas, rezas e santas definitivamente não parecem ser a maneira com a qual Esmeralda normalmente manifesta a sua fé.
Ela então pede que Deus ajude as pessoas marginalizadas, com uma grande ênfase em como eles dependem de Deus, pois não conseguem contar com os seres humanos. Esmeralda pedir pra Deus ajudar os outros é contrastado com todas as outras pessoas na igreja rezando pedindo somente pra si mesmos.
As preces de Esmeralda são tão altruístas e empáticas que chamam a atenção de Quasimodo. Morando na igreja e nunca saindo, supõe-se que Quasimodo já ouviu muitas preces na vida, mas aparentemente ele nunca ouviu uma prece assim.
A canção foi escrita com a esperança de ser indicada ao Oscar, mas não foi. E no imaginário da Disney não sai muito da sombra dos mastodontes que são Out There ou Hellfire. Mas eu acho que aqui está um dos pontos mais fortes do filme. Na maneira como Esmeralda é diferente de tudo e todos na igreja e claramente está deslocada, mas isso só enfatiza suas virtudes.
13º I Won’t Say I’m in Love – Hercules
Cantada por: Meg e as Musas
A música-tema da personagem tsundere. Ao longo da música Meg nega constantemente o que já está óbvio pra todo mundo, que ela se apaixonou por Hércules. Agora, essa música é curiosíssima, pois Meg está fazendo um dueto com as musas. E as musas não interagem de verdade com os personagens de Hercules, elas são as narradoras. Aliás mesmo nessa cena, elas evitam interagir, é bem interessante.
Apesar de Meg cantar reconhecendo um interlocutor, ela e as musas não fazem contato visual de verdade. O que é curioso, pois as Musas aparecem na cena na forma de estátuas que ganham vida quando Meg não está olhando. Ao mesmo tempo quando a Musa mais baixinha tenta chamar a atenção de Meg ela é ignorada completamente.
E enquanto canta a Meg está interagindo com essencialmente todas as outras estátuas no local.
Quase como se Meg estivesse desabafando com todos os sentimentos que as estátuas provocam nela. E as musas, como deusas das artes estivessem falando como representantes de todas as estátuas.
É uma música sobre Meg sendo emocionalmente afetada por arte. Ela está desiludida com o amor, pois ainda sente a mágoa do último homem que a machucou. Mas ela está se sentindo bem de novo com um homem novo, e cercada de estátuas que retratam amor e paixão. Ela tenta dizer pra si mesma que nada daquilo tem valor. Mas as deusas da arte retrucam. Tudo aquilo tem valor. Quando você vê arte, a arte fala com você.
As vezes se apaixonar não é uma boa notícia, e sim um grande inconveniente, e a música retrata bem a resistência que podemos ter a sermos vulneráveis, e o empurrãozinho que precisamos para aceitar nossos sentimentos. O tema visual da flor que Hercules deu pra Meg funciona bem também, no começo da música ela joga a flor fora, mas as Musas a recuperam, e no fim da música elas deixam rosa ao lado de Meg que a pega de volta.
12º We Don’t Talk About Bruno – Encanto
Cantada por: Família Madrigal e resto da cidade.
Uau, esses personagens podem não falar sobre o Bruno, mas eles definitivamente cantam sobre o Bruno. E é pra isso mesmo que essas cenas existem. Quando os personagens cantam eles expressam coisas das quais eles muitas vezes não falam. Quando Mirabel começa a perguntar sobre o seu tio que é tratado como assunto tabu na família todo mundo põe pra fora suas impressões sobre Bruno e ela nota que todo mundo tem algo a dizer sobre a ovelha negra.
E é fascinante como a música serve pra nos gerar uma noção do que esperar do personagem Bruno, que ainda não apareceu nesse momento, como também é uma maneira de explorar todos os diferentes personagens, pela maneira como Bruno os afeta.
Pepa tem rancor de Bruno por suas previsões terem estragado seu casamento. Dolorem tem medo de Bruno, pela maneira como ela ouve ele mexendo com areia e consegue ouvir ele ainda pela casa. Camilo era jovem demais quando Bruno desapareceu e lembra somente de sua aparência sinistra. Isabella que é perfeita só ouviu previsões boas de Bruno. Cada um tem uma relação diferente com Bruno, mas eles não falam nada contraditório nem nada. Eles cada um descrevendo uma par de Bruno nos montam uma imagem dele evidenciando o melhor de si mesmos.
O que é ótimo, especialmente porque Pepa, Dolores e Camilo não realmente tem um arco no filme, então essa chance deles se mostrarem como personagens interessantes é ótima.
O coro final de todos cantando suas partes novamente enquanto Mirabel se desespera do quanto nada que ela ouviu é boa notícia é particularmente bom.
Encanto foi um arraso em trilha sonora, e espero que o Lyn Manuel Miranda se envolva em mais filmes Disney no futuro, poque aqui ele brilhou.
11º Prince Ali – Aladdin
Cantada por: Gênio
Eu não chamei a atenção pra pessoa cantando as músicas, mas aqui eu acho impossível não chamar a atenção pro trabalho do Robin Willians, que não somente canta como o Gênio, mas canta como o Gênio fingindo ser pelo menos oito cidadãos diferentes, para convencer Agrabah da reputação desse príncipe fictício que ele inventou. Soa como a cidade inteira celebrando um cara, mas é só o Gênio.
E o Will Smith não chegou aos pés desse charme dele de mudar de personas ao longo do filme, por mais que tenha quebrado um galho.
Enfim, Prince Ali é curioso, pois ela é uma música cantada pelo Gênio para enaltecer o Aladdin. E ela não diz absolutamente nada sobre o Aladdin, afinal o Príncipe Ali é uma ficção e uma mentira, que não fez nenhuma daquelas coisas. E o Gênio já havia estabelecido todas as suas facetas na magnífica Friend Like Me que veio logo antes.
Essa música serve para trabalhar e explorar Jasmine, Jafar e o Sultão, que vão ter muito de sua dinâmica com Aladdin derivada dessa “primeira” impressão (apesar de Jasmine e Jafar já o conhecerem). Então, toda a hesitação de Jasmine com Aladdin, vem da desconfiança da persona de príncipe, que é boa para cativar o Sultão e legalizar um casamento, mas que é distante de como ele se portou com ela no mercado. E o desprezo de Jafar por Aladdin, se torna uma inveja e rancor de Ali, cujo sucesso é o maior obstáculo pros seus planos.
A canção é sobre como Ali é cativante, forte, rico, gostoso e sensacional. E ela sendo um número espetacular na cidade inteira, mostra como os personagens lidam com espetáculo. Jasmine despreza o espetáculo, é parte dos costumes que oprimem ela. O Sultão se fascina e se seduz fácil pelo espetáculo, é parte do que o torna tão manipulável. E Jafar usa do espetáculo também para ganhar poder e reconhece um rival e uma ameaça naquilo que Aladdin está fazendo.
O que torna digno que seja Jafar quem cante a reprise de Prince Ali, sobre ele dando o troco, conseguindo mais poder que Aladdin para fazer uma performance mais espetacular, e removendo o espetáculo de Aladdin. Eu fico um pouco chateado que o mais próximo de uma canção-de-vilão que Jafar ganhou foi essa reprise, mas esse momento é sensacional. Só acho que ele podia ter tido algo mais independente. Não sei qual a resistência em fazer o Jafar cantar. No live-action nem mesmo deixaram ele reprisar Prince Ali.
10º Belle – Beauty and the Beast
Cantada por: Belle, Gaston e a cidade inteira.
Pera aí, eu fiz isso mesmo? Preciso checar minhas anotações…
…é, eu fiz isso mesmo, coloquei as três canções da cidade inteira cantando sobre alguém uma seguida da outra nessa lista. Olha só que curioso.
Enfim, chegamos ao Top10 agora e Belle é excepcional o suficiente para merecer estar aqui, não importa o quão mal eu possa falar do filme por aí.. Durante a canção Belle anda pela cidade em sua rotina e simultaneamente canta com sua insatisfação com a cidade onde mora e a cidade canta de volta sobre o quanto Belle não tem espaço ali. Existe uma rejeição de duas mãos. Belle não gosta da rotina, monotonia e opções limitadas da cidade, e a cidade não gosta do jeito “estranho” como ela se porta. É bom que ao fazer isso em canção, a cidade se torna um personagem estabelecido. Os habitantes individuais não importam nessa cidade, mas o coletivo deles é uma força que move a trama constantemente, o que é algo que vai voltar em The Mob Song.
Belle também é um exemplo legal para observar algo que a Disney faz em muitas de suas músicas, que é interrompê-las com diálogos não-cantados. Fazer entre os trechos não cantados da música os personagens conversarem um pouco, acho ótimo, e ajuda a dar naturalidade pra cena. Belle e a Cidade estão cantando um sobre o outro, meio que um falando do outro pelas costas, então apesar desse conflito, quando eles interagem é uma conversa normal.
A galera fala como se quando a música começasse tudo parasse e todo mundo começasse a falar qualquer coisa cantando. Mas nunca é qualquer coisa, é só o que precisa ser posto pra fora de uma maneira que um diálogo não atingiria a teatralidade necessária para expressar as emoções. O resto, o “Bom dia senhor, como foi seu dia?”, pode ser feito por diálogo.
E o contraste de Belle cantar sobre estar mal encaixada na cidade, e a cidade cantar cobre Belle ser deslocada, sendo interrompidos por ocasionais diálogos de Belle e os cidadãos sendo muito bem educados um com o outro, ressaltam bem o quão artificiais são esses gestos, e não o sinal de uma comunidade realmente amistosa. Afinal o que eles estão cantando é aquilo que não fica dito nas interações cotidianos, mas fica comunicado mesmo assim.
A canção é então interrompida por Gaston, o único habitante da cidade que tem uma opinião particular sobre Belle. A de que ela devia casar com ele, mesmo sendo estranha, por ser linda, e beleza ser tudo o que importa. Gaston canta o que ele acha de Belle e Belle depois tem uma reprise do quanto ela despreza Gaston em particular.
O expor o pensamento da moradora isolada, do morador popular e dos moradores comuns, toda a dinâmica da cidade fica muito bem estabelecida. Qual é a cultura local, que tipo de atitude um forasteiro precisa ter, e que tipo de pessoa a cidade valoriza.
9º Two Worlds – Tarzan.
Cantada por: Narrador.
Eu falei acima do lance da Disney evitar narradores e que a exceção era Tarzan, pois os responsáveis pelo filme odiavam musicais. E é verdade que o diretor falou em entrevista que ele acharia ridículo se o Tarzan cantasse. Mas apesar disso, Tarzan tem alguns excelentes números musicais, a maioria usando só como justificativa pros personagens passarem por uma montagem e indicar passagem do tempo. O número que abre o filme não é exceção.
Two Worlds mostra duas histórias em paralelo. Um é a chegada dos pais de Tarzan na costa da África tendo que se readaptar a uma vida na selva e com o bebê deles, após um naufrágio. A outra é a de Kala e Kerchak, dois gorilas criando o bebê deles. Devido a um leopardo chamado Sabor, o bebê dos gorilas morre e os pais do Tarzan também, e a gente já sabe como Kala resolveu esse problema.
A música serve não só para mostrar rapidamente a história de como Tarzan virou um bebê abandonado no meio da selva e do motivo de Kala querer um bebê pra cuidar, mas principalmente estabelece o tema do filme inteiro. Que são os dois motivos pelo quais esses números que abrem o filme existem. Eles resumem a história que rolou antes do personagem entrar em cena e reforçam sobre o que vai ser o filme. No caso de Tarzan, sobre esses dois mundos separados, formando uma única família. Sobre confiar no coração e no destino, no que diz respeito a decisão de Kala de criar o bebê de outra espécie, e também a decisão final de Jane, de abandonar toda sua vida em Londres pra viver na Selva com Tarzan.
Esse aspecto de ditar o tema central do filme é tão forte que a música não só abre o filme, como ela também fecha o filme. Começando a tocar imediatamente após Jane começar a falar que nem gorila.
Todos os paralelos entre os gorilas e os humanos criando o bebê é bom, e imediatamente humaniza os gorilas e deixam claro, que apesar de suas diferenças, ambas as espécies amam e criam seus filhotes. O que é a base da personagem de Kala, definida por não importar o que acontecer, nunca deixar de amar Tarzan.
Tarzan é meu filme favorito da Disney e esse começo sempre mexe comigo. A primeira impressão que um filme causa é importantíssima. Se o começo de um filme funciona, você já tem a boa vontade necessária com tudo o que vem depois. E Tarzan fez perfeitamente seu trabalho.
8º Poor Unfortunate Sould – The Little Mermaid
Cantada por: Ursula.
Sabem o que eu gosto em Poor Unfortunate Souls? Algo que metade dessas músicas fazem, mas Poor Unfortunate Souls faz de maneira que particularmente me agrada? Essa música escala. Ela começa com Ursula cantando calmamente sobre como é mal-compreendida e uma boa pessoa apesar da reputação. E termina com Ursula aos berros pressionando Ariel pra assinar o contrato sem deixar nenhum segundo pra garota respirar fundo, pensar a respeito e percebendo que está fazendo merda.
A música expõe bem o lado golpista de Ursula, da maneira como ela se aproveita de pessoas com desejos inacessíveis para colocá-los em pactos em que eles não poderão cumprir a parte deles, e escravizá-los em retorno.
Ursula é uma predadora, que finge ser afável até a vítima estar em seu domínio e então revela sua verdadeira face, e mostrar ela virar essa chave de sua personalidade enquanto a música vai ficando mais intensa funciona bem.
E eu sou um particular fã com a maneira como a música emenda nas palavras mágicas para a magia funcionar, como se fosse uma segunda canção que começa logo depois que a primeira acaba. E emendando tudo em uma terceira música em que Ariel murmura Part of the World para a magia funcionar e sua voz sair do corpo.
Quando eu fiz o meu Top13 Vilões da Disney eu deixei a Ursula de lado para falar sobre o Dr. Facilier, mas aqui eu fiz o oposto, até pensei em colocar Friends from the Other Side, mas deixei de lado, pois queria falar sobre Poor Unfortunate Souls. Essas listas são feitas de escolhas difíceis. Mas aqui o carisma da Ursula ultrapassa tudo.
7º Do You Want to Build a Snowman? – Frozen
Cantada por: Anna
Apesar de Let it Go ter ficado com o Oscar, com a gloria, com a reputação e tenha se tornado uma das maiores músicas Disney da história em impacto, eu acho que o coração do filme Frozen está em Do You Want to Build a Snowman. O filme é sobre a relação entre as duas irmãs, e ela é apresentada de maneira brilhante nesse começo, com as duas infelizes conforme se isolam uma da outra, Anna sem entender por que Elsa abandonou ela, e Elsa se sofrendo por não conseguir controlar seu poder para manter Anna segura.
Eu acho esse momento excelente, e claramente seguindo a escola Up de “Vamos partir o coração de todo mundo logo nos primeiros minutos”. E bem, isso não era bem necessário, pois tínhamos visto elas brincando, mas vendo Anna chamar Elsa pra construir o boneco de neve três vezes ao longo de seu crescimento só reforça o quanto o boneco de neve é o símbolo máximo da conexão delas, o que eleva o personagem do Olaf e sua importância no filme.
Exatamente isso, a canção que explica o Olaf não é In Summer, é essa daqui!
Eu gosto de como quem canta é a Anna, mas é quase que um dueto. O silêncio da Elsa ouvindo tudo num quarto congelado é parte do diálogo delas. Passa tantas emoções quanto a canção.
Disparado o melhor momento de Frozen.
6º Baby Mine – Dumbo
Cantada por: Senhora Jumbo.
E por falar em momento de partir o coração. Em Dumbo sim eles estavam inspirados. Baby Mine é a cena mais chorosa da história da Disney. Mais do que quando matam o Mufasa ou qualquer coisa do tipo.
No filme, a mãe de Dumbo é considerada uma elefanta louca no circo e mantida numa jaula como animal perigoso, completamente isolada do filho. Dumbo é um bebê elefanta, ele não fala, não sabe se virar sem a mãe e é muito carente. Então ele visita ela na sua jaula. Ela não consegue se aproximar muito da jaula, mas consegue por a tromba pra fora e fazer carinho no filho.
E então ela canta essa cantiga de ninar, pedindo pro seu bebê não chorar e lembrando-o de que ele é amado.
Enquanto ouve a canção Dumbo olha ao seu redor e percebe que todo outro filhote do Circo está dormindo abraçado na própria mãe, e depois disso, ele é avisado de que seu tempo acabou e ele precisa se despedir da mãe.
E embora a canção constantemente diga “não chore”, ela não foi obedecida, nem por Dumbo, nem pelo expectador.
O momento é parte tão insubstituível daquilo que torna Dumbo uma história tão comovente, que até a versão do Tim Burton, que não tem quase nada em comum com o filme original, incluiu esse momento e a música Baby Mine, pois não tem como. Dumbo é uma história de um bebê que foi separado de sua mãe. As orelhas fazerem ele voar é secundário.
5º Part of Your World – The Little Mermaid
Cantada por: Ariel.
Sabem de uma coisa, as pessoas julgam muito mal a Ariel. Adoram falar dela ter abandonado o mar por um homem. Dela ter mudado o corpo por um homem. Dela ter vendido a voz por um homem. Ou por ela ter feito tudo o que ela fez por um homem…. mas ela tem uma canção inteira, dela explicando por que ela é tão obcecada em sair do mar e adquirir pernas, e essa música não menciona homem por um segundo sequer.
Ela pôs a alma pra fora sobre o quanto ela queria sair dali, e a galera adora falar como se fosse tudo culpa de um crush.
Esse tipo de música em que o herói ou heroína cantam sobre seus maiores desejos, é chamada popularmente de I Am Song, pois é quando o personagem se despe emocionalmente para nós e nos fala de seu maior conflito. E elas sempre são populares Reflection, Out There, Go the Distance são todas grandes músicas. Mas Part of Your World é simplesmente a rainha de todas as I Am Songs. É a referência máxima.
Ariel é uma jovem que o pai mantém sob rédea curta. Ele é rígido quando a como ela se porta, onde ela pode ir, com quem pode falar, e tenta controla-la para ser um filha ideal. E a rebeldia de Ariel, combinada com sua curiosidade enorme, faz ela fantasiar no mundo da superfície um mundo de liberdade, diversão e empoderamento que ela nunca vai ter enquanto viver no oceano que seu pai comanda. The Little Mermaid é um filme sobre a libertação de Ariel, e sobre ela convencer seu pai a permitir que ela viva sob os próprios termos.
A parte que mais me pega é ela comentando querer conhecer o fogo e entender o que significa queimar. Ela quer correr perigo, quer experimentar, quer sair da bolha de proteção e viver a vida intensamente.
A música reprisa poucas cenas depois, quando ela canta essa música para Eric após resgatá-lo do naufrágio, e essa se torna a música pela qual ele se apaixona. E a música reprisa novamente na última cena do filme. Quando Triton abraça Ariel em seu vestido de noiva, e dá a benção ao casamento, um coro começa a cantar a música, com uma ligeira alteração de passar a música de “eles” pra “nós”. Se a música original diz: “Lá em cima eles andam, lá em cima eles correm, lá em cima eles passam o dia inteiro no sol.”, na reprise se torna “Agora nós podemos andar, podemos correr e podemos passar o dia inteiro no sol”. Esse grupo de pessoas deixou de ser um outro inatingível pra Ariel, ela se tornou parte deles.
E sob esse coro Triton lança um arco-íris no céu para abençoar o dia da sua filha. Essa música não diz nada sobre a relação dela com Eric, mas diz tudo sobre a relação dela com Triton. E é onde está o filme inteiro. Por isso que essa música foi a primeira coisa que o remake live-action soltou para nos mostrar como vai ser o filme. É o coração do filme, e por consequência, Little Mermaid é um dos filmes da Disney com o coração mais bonito.
4º Heaven’s Light/Hellfire – The Hunchback of Notre Dame
Cantada por: Quasimodo e Frollo
Tecnicamente são duas músicas diferentes. Mas elas tocam uma seguida da outra, seus nomes são obviamente deliberadamente fazendo referência uma a outra, as duas cantam sobre o mesmo assunto, e eu não consigo ver elas como momentos separados.
Quasimodo está na catedral pensando em Esmeralda, em como a cigana ao não ter medo dele e tratá-lo como um ser humano, demonstrou um nível de carinho que ele acredita ser a Luz Celestial iluminando seu lar. Em paralelo, no palácio da justiça, Frollo está pensando em Esmeralda, em como a cigana o seduziu para corrompê-lo e deixá-lo tentado a pecar. E que essa sedução maldita é o Fogo do Inferno invadindo o seu lar.
Ambos os homens estão extremamente atraídos por Esmeralda, e um deles interpreta sua atração como um amor puro e angelical, e o outro como uma marca da luxúria, do pecado e da corrupção. Quasimodo decide que vai se dedicar Esmeralda e quer protegê-la, e Frollo decide que vai matá-la queimada caso não aceite ficar com ele.
Hellfire é a que realmente chama a atenção das duas, é parte forte do que torna o Frollo o maior vilão da Disney, e é a parte mais teatral das duas, com Frollo alucinando os encapuzados julgando ele, uma Esmeralda de fogo julgando ele, e capturando o momento exato em que Frollo decide incendiar Paris, que é o que acontece no fim do filme.
Hellfire também além de dialogar com Heaven’s Light dialoga também com a que também é parte desse top20 God Help the Outcasts, por ser uma reza. Frollo canta a sua reza para a Virgem Maria, a mesma para quem Esmeralda rezou. O que é digno uma vez que a catedral de Notre Dame é batizada em homenagem a Maria. Enfim, enquanto Esmeralda começa sua canção de maneira humilde, se questionando se ela sequer tinha o direito de falar com Maria, Frollo começa a sua reza ressaltando suas virtudes, purezas e como ele está acima do povo. Uma postura oposta de quem se ilude de que fala por Deus quando não fala.
Com isso Hellfire se torna um estudo de personagem para vermos simultaneamente as diferenças de personalidade de Frollo com Quasimodo e Esmeralda, e como a virtude e compaixão deles ressaltam o monstro que é Frollo. E quem sabe? Se Phoebus tivesse uma música talvez ela servisse de contraste pra Hellfire também, nunca saberemos.
3º I’ll Make a Man Out of You – Mulan
Cantada por: Shang.
Essa música é foda! Mulan é o único dos filmes da Disney que retrata um personagem indo pra guerra, então essa é a única montagem de treinamento militar do estúdio, e ela é tão icônica.
Gosto de como o instrumental começa a anunciar a chegada da canção assim que os personagens começam a cair do pilar e falhar em recuperar a flecha, que é o trunfo de Mulan no clímax emocional da cena. Amarrando bem o arco de treinamento.
A música chama a atenção de maneira muito forte pro refrão “Seja um homem” que o expectador pega a ironia na hora, de que Mulan não é um homem, mas está sendo obrigada agora a agir que nem um e a aprender a pensar que nem um. E é curioso porque o triunfo dela está em sua feminilidade.
O filme Mulan enquadra criatividade e métodos alternativos de solução de problemas como uma característica que faz Mulan quebrar todos os padrões. Tanto os padrões do gênero feminino que exigem uma mulher que não tenha ideias, quanto os padrões de gênero masculinos que exigem força bruta e combate direto acima da criatividade. Mulan desafia ambos. E ao longo do filme inteiro ela é marcada por não pensar que nem um homem, e por isso conseguir bolar um plano de matar mil hunos em uma avalanche em vez de matar um em um tiro de rojão.
Por isso a cena dela escalando o pilar usando uma maneira criativa em vez da maneira que Shang queria sob o coro de “Seja um homem” é fantástica. Ela não está sendo um homem, mas está sendo aplaudida pelos homens, pois atingiu o mesmo resultado. E se ela escalar o pilar do jeito não-masculino sob o coro de “Seja um homem” não estava escancarado na primeira vez, ai fica escancarado na reprise, em que seus colegas militares vestem quimonos femininos para escalar o pilar que leva ao palácio usando o método que Mulan inventou, e a música recomeça mostrando os soldados aceitando alguma feminilidade neles para poderem vencer a guerra sob o coro de “Seja um homem.”
Muitos podem até interpretar como “mas precisa de fato ser muito homem pra se vestir de gueixa, rebolar, subir até o palácio e proteger o Imperador”, mas não precisa, pois a Mulan fez isso também, e ela não estava “vestida de mulher”, ela tava com as roupas normais dela.
No fim Shang não transformou Mulan em um homem. Mesmo assim o treinamento dele transformou ela na soldada que venceu a guerra sozinha. E o número é sobre isso, sobre Mulan apesar de começar como a pior do treinamento, conseguiu pegar o ritmo, ganhar o respeito de seus iguais e se tornar uma guerreira. É uma montagem de treinamento, é fundamental para que todas as cenas futuras dela matando huno façam sentido.
Mulan é um excelente filme.
2º Circle of Life – The Lion King
Cantada por: Narrador.
Porra! Isso aqui soa até desigual nessa lista. Mais do que uma das melhores cenas musicais da Disney, The Circle of Life é uma das melhores cenas de abertura de um filme da história do cinema.
A música é cantada por um narrador. E aqui isso faz sentido, pois essa música não fala sobre nenhum personagem. Ela não realmente é sobre os sentimentos do Mufasa, nem do Simba, nem do Rafiki. Ela é sobre os habitantes do reino de Mufasa.
A cena começa com um minuto e quarenta segundos só de diversos animais caminhando em direção a Pride Rock. É um tempão só observando um monte de animal que não é de fato personagem no filme até o Zazu aparecer.
E da aparição do Zazu em diante, não vemos de fato muito dos personagens, pois é tudo ritualístico. Claro que sabemos que estão sendo sinceros, mas Zazu se curvar ao Mufasa e Rafiki passar o líquido vermelho na testa do Simba diz muito pouco sobre eles. Nossa perspectiva é outra, a gente entende rápido que é um ritual, que foi feito milhares de vezes no passado pra milhares de príncipes e será feito milhares de vezes no futuro.
Será feito de novo no fim do filme, quando Rafiki faz com a filha de Simba o mesmo que fez com ele, repete o ritual e mostra o bebê pro povo se curvar.
The Lion King é um filme sobre o Scar removendo a normalidade de um reino, desrespeitando o ciclo da vida, e permitindo que Hienas consumissem mais do que precisavam, secando rios e matando o equilíbrio. O reino perdeu sua normalidade e Simba precisava restaurá-la obedecendo o ciclo da vida. Por isso essa primeira cena, usa a perspectiva neutra do povo, para nos mostrar qual é essa normalidade, pelo que o Simba luta, e ele luta por isso. Por todos esses animais indo se curvar ao filho do rei.
Se você for cínico que nem eu, pode achar um absurdo e querer que os antílopes matem os leões, ou você pode achar isso tudo bonito, tanto faz. Mas essa cena deixa bem claro pelo que eles lutam. Por um ritual em que um povo assiste um macaco segurar um filhote de leão em uma pedra. E para poder ver isso ocorrer de novo uma geração depois. E é uma cena poderosa e eficaz em te vender esse mundo, esse reino e as hierarquias. Não temos detalhes, mas saímos do momento sabendo com clareza qual papel Zazu, Rafiki e Mufasa ocupam na estrutura desse mundo, antes do filme poder de fato começar.
1º: Be Our Guest – Beauty and the Beast.
Cantada por: Lumiere, Madame Potts e todos os outros empregados do castelo.
A grande ironia aqui, é que eu realmente não gosto de Beauty and the Beast, não acho um bom filme. Mas não só o filme rendeu duas músicas nesse top20, como conseguiu o primeiro lugar no ranking. E eu posso não gostar do filme, mas Be Our Guest merece. Aliás a trilha sonora inteira merece. A trilha de Beauty and the Beast, Little Mermaid e metade da trilha de Aladdin foram compostas por Howard Ashman, um talento imenso e um cara que entendia pra cacete de musicais, e cinco músicas dele vieram parar nessa lista. 1/4 da lista é dele. A trilha inteira de Beauty and the Beast é um arraso.
Uma curiosidade legal sobre Be Our Guest é que a música foi composta intencionalmente para que Lumiére e os demais objetos cantassem para o pai de Belle, Maurice quando ele entra no castelo no começo do filme. E se olharmos bem a letra, dá pra ver como a música combina com a euforia de terem o seu primeiro convidado em anos, e que tecnicamente, Belle é a segunda convidada, pois eles todos deram boa hospitalidade ao Maurice.
Eu entendo a mudança, acho uma música grandiosa demais para o começo do filme, e acho que mostrar Belle desfrutando a hospitalidade do castelo importa mais. Mas eu acho que o número super combina com os sentimentos dos empregados com Maurice, inclusive o conceito de que se a Fera descobrisse eles estariam fritos, pois de fato quando a Fera descobriu ela aprisionou Maurice.
Sabem, Beauty and the Beast é um filme que sutilmente toca muito no ponto da hospitalidade. A Fera foi punida por negar hospitalidade aquela senhora, e após isso se negou a dar hospitalidade ao Maurice. E o ato de fazer o outro se sentir em casa no castelo é o principal contraste de personalidade que reforça que a Fera é uma pessoa difícil e os empregados pessoas amistosas.
E Be Our Guest é onde esse contraste brilha. Com todos unidos par dar a Belle o jantar mais esplêndido que eles podem dar. Se orgulhando em serem bons anfitriões e na extrema felicidade de ter alguém pra quem cozinhar e usar seus talentos para bom serviço.
Apesar de tudo no castelo ser vivo, e nele morarem milhares de objetos vivos, Belle deu vida ao castelo, pois deu a esses objetos motivo pra se sentirem vivos de verdade. Eles querem que Belle quebre a maldição, mas também querem que Belle melhore a rotina deles. E em Be Our Guest eles estão explodindo de empolgação de servir o primeiro jantar de verdade do castelo em 10 anos.
E sério. As músicas Disney podem ser diversas. Podem ser rezas, desabafos, canções de ninar, golpistas abordando suas vítimas, fofocas, duetos, podem ser um pedido de desculpas, podem ser um plano maquiavélico, podem expressar o sentimento de uma cidade, ou denunciar um vilão…. elas podem ser de tudo. Mas a melhor coisa que elas podem ser é uma festa.
Se tem uma coisa que eu adoro quando uma obra de ficção sabe retratar bem é uma boa festa. Uma festa espontânea, que se forma simplesmente porque todos os personagens estão felizes. E é isso que Be Our Guest é, a melhor festa que os personagens Disney já deram.
E bem. Nenhuma desses 20 momentos, na minha opinião, melhorariam o filme se não fossem números musicais, se fossem um diálogo normal, ou se fossem sentimentos expressados sutilmente. Eu aprecio quando através da boa atuação, sentimentos muito complexos podem ser bem transmitidos em movimentos sutis e em silêncios que dizem muito. Claro que eu aprecio esse talento. Mas eu aprecio também o extremo oposto. A teatralidade, e maneira como os personagens se expressam com intensidade, música, dança, coreografia, pra mim é parte da magia. A magia Disney que faz coisas impossíveis se tornarem realidade dentro do filme.
Muita gente fala de cenas musicais em filmes como se fossem o fim da imersão. E muito produtor e diretor cagão acredita e acha que evitar é bom. Mas o Walt Disney via que música e cinema eram dois elementos que combinavam mais do que qualquer coisa, e deixou esse legado que seu estúdio segue até hoje.
E eu queria que tivesse mais filmes se arriscando a serem musicais originais. Digo, eu aprecio que tentem trazer a Broadway pro cinema de tempos em tempos, e muitas adaptações da Broadway fracassam na bilheteria, então reconheço que tem um risco. Mas eu gosto na Disney que as músicas foram de fato compostas pra funcionarem no cinema, pensando na linguagem cinematográfica como aquilo que daria sentido a essas músicas, e esse é o tipo de musical que eu queria que fosse feito com mais frequência. Que as pessoas tivessem aquela confiança de que se a Disney fez, o ovo de colombo está de pé, e eles podem fazer sem medo de espantar o público.
E é isso que eu queria dizer. Eu deixei muita música bem legal de fora, então se quiserem que eu no futuro revisite o assunto falando sobre o que alguns números musicais da Disney que eu não citei tem de especial, comentem nos comentários ou nas redes sociais do Dentro da Chaminé, pois eu queria fazer na verdade um texto com o triplo do tamanho desse, mas não quero floodar o blog com um texto dividido em 4 partes.
E com isso também concluímos o ano de 2022 no Dentro da Chaminé, ano que vem tem mais textos. Tenho alguns textos planejados que a ideia deles está na minha cabeça faz muito tempo e quero muito poder escrevê-los. E quero agradecer aos meus leitores por mais esse ano.
Um agradecimento mais que especial aos apoiadores do Dentro da Chaminé, esse foi o primeiro ano em que não teve nenhum mês que não ficou sem texto novo, e eu atribuo isso ao apoia.se, vocês me motivam muito a manter essa chaminé ativa e eu agradeço bastante.
Espero que 2023 seja um ótimo ano pra todos nós. Fiquem bem meus leitores e até ano que vem.