Uma brincadeira comum de se fazer em qualquer grupinho de gente que esteja fascinado demais por animes e mangás é o de pensar “se você pudesse viver em qualquer uma dessas histórias, em qual você gostaria de viver?”, e bem, eu fraseei como em qual universo você queria viver, mas a pergunta verdadeira, a que ficou implícita é: “qual desses superpoderes você queria ter”.
Pois quando eu me imagino vivendo no universo de Naruto eu não me imagino como um blogueiro analisando cultura pop na internet numa cidade grande do País do Fogo vivendo longe das complicações ninjas e sendo ocasionalmente crítico do Senhor Feudal. Eu como qualquer pessoa me imaginaria sendo um ninja, fazendo clones e invocando animais.
Se eu morasse no mundo de pokemon? Ora bolas, eu me imagino tendo pokemons. Mas eu provavelmente também seria um blogueiro ali também…. talvez um blogueiro com um pokemon. Até a mãe do Satoshi (Ash) tinha um, e eu tenho pets. É fácil imaginar que eu teria um mesmo sem vida de aventuras….
A gente se imagina no centro da ação, vivendo aventuras, e com nossa história. Ou seja, no fundo a pergunta está nos perguntando qual superpoder a gente queria ter, e que tipo de superpoder a gente iria querer encontrar.
E esse exercício de pensamento é comum. O de imaginar se você preferia ter os poderes de um ninja em Naruto ou de um shinigami em Bleach. Preferia enfrentar maldições que nem em Jujutsu Kaisen ou onis que nem em Kimetsu no Yaiba. É o tipo de coisa que pensamos, nos sistemas de poderes. Inclusive muitas vezes ele pode ser fraseado indo direto ao assunto: “Que tipo de sistema de poderes você queria que existisse na vida real?”. Eu tive a ideia pra esse texto respondendo um tweet fazendo exatamente essa pergunta.
Gosto desse pensamento, da ideia de em vez de nos imaginarmos em um Isekai, pensarmos em como mudar as regras e leis do universo que regem o mundo pra algo que deixe ele mais legal… é que nem Undead Unluck. Mas, pois é…. sistema de poderes.
Sistemas de poderes são divertidos.
Sistemas de poderes são parte fundamental do que tornou aqueles mundos tão carismáticos em primeiro lugar.
Sistemas de poderes são fascinantes, elevam a ação e convidam a gente a desejar ser parte desse mundo.
Sistemas de poderes são todos iguais!
O que? Calma lá, obviamente não são todos iguais, essa frase é exagerada.
Esses sistemas certamente tem muitas diferenças que são parte da graça por trás deles. Mas ao mesmo tempo a tendência deles é dar uma volta grande pra chegar ao mesmo exato lugar. E metade dos mangás novos de poderzinho que estão saindo vão ter uma explicação nova pra nos mostrar mais ou menos o mesmo resultado final.
Que é o esquema: 1- Cada personagem tem um poder que é o poder deles. 2- Todo poder cobra um preço ou impõe um limite que impede que ele seja só explorado infinitamente. 3- Com exceções onde a narrativa permite, ninguém tem dois poderes e ninguém tem poderes repetidos. 4- Tudo muito livre e não-regrado pro que pode ser um poder. Coisas simples e elaboradas coexistindo. 5- Poderes que a principio parecem estranhos e que o seu usuário só deu azar surpreendem se revelando muito criativos.
No fim tudo quer cair nisso. Em ter um cara que controla a sombra lado a lado com um que fala com animais, e com um que viaja no tempo, e a lógica por trás é “essas pessoas têm poderes”. Não é tudo assim, mas muitos são assim.
O que faz quando a gente pensa “qual exato poder você queria ter?”, os universos em si são irrelevantes. Por exemplo, o meu poder que eu queria ter seria o de ter acesso ao Hammerspace, e poder tirar marretas e objetos improváveis das minhas costas como se eu fosse um dos Looney Tunes….. e eu poderia ter esse poder em Jojo, poderia ter em Jujutsu Kaisen, poderia ter em Boku no Hero Academia, poderia ter em One Piece, poderia ter em Black Clover, poderia ter em Hunter X Hunter….. qualquer construção-de-mundo banal de um battle shonen me daria os meios pra esse poder ser possível.
Então a diferença entre eles é o COMO você ganha essas habilidades.
E o texto é sobre isso. Então eu sou Izzombie, esse é o blog Dentro da Chaminé e os convido a vir comigo nesse texto sobre como podemos classificar os tipos de maneiras de se conseguir uma habilidade em um universo de battle shonen em 3 tipos. Como a construção-de-mundo trabalha a maneira de se obter um superpoder. E o que estamos presumindo quando fantasiamos o que rolaria conosco se acontecesse dessa maneira conosco.
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Pois esse texto é em homenagem a todos que já m apoiam. Uma equipe bacana que me motiva, me inspira, e que merece todos os créditos por estar ajudando esse blog a ser o que é! Eu tenho muita gratidão a todos, e espero que gostem do texto.
E esse texto é sobre os três tipos de sistemas de poderes que existem nos battle shonens.
E a base da minha classificação é essencialmente ver o quão fácil ou difícil é pra se obter um super-poder nesse mundo, e as implicações de se imaginar esse tipo, e começando pelo tipo 1.
Tipo 1: A Loteria Genética.
O jeito mais fácil de se dar um superpoder pra um personagem. O mais básico. O personagem nasceu com o poder! Resolvido! Fácil fácil! Digo, nascer é uma hipérbole, todos nascem com a disposição pra ter poderes, mas é bem normal fazer eles só se manifestarem na adolescência ou depois de uma determinada idade.
Algumas pessoas nasceram com superpoderes e outras não, é assim que o mundo funciona. Não é tão diferente de como no mundo tem gente que nasce herdeira de bilhões e gente que já nasce herdando dívida. Tem gente que nasce com visão e memória impecável, e tem gente que nasce com miopia e incapacidade de diferenciar rostos humanos.
As vezes quando se nasce um anjo torto desses que vive nas sombras chega no Carlos e zoa seu fracasso inevitável, mas as vezes um anjo te beija.
E quando se trata de superpoderes alguns ganharam beijos mais abençoados que outros dos seus colegas.
Temos aqui Jujutsu Kaisen, em que 90% do mangá gira em torno de quem nasceu com o poder mais quebrado que quem, e ninguém nasceu com um mais quebrado que o de Satoru Gojo, o maioral do mangá. Que pode resolver 99,9% dos problemas do mundo com um estalar de dedo, pois ele nasceu o ser humano mais poderoso que já existiu na história. Pro azar dele e pra obrigar o mangá a ter roteiro, os conflitos lidam com o 0,01% de maldições que dão trabalho pra ele.
Enquanto Gojo nasceu abençoado, Maki, apesar de seus genes bons de uma das famílias mais abençoadas do mundo, nasceu o Rock Lee…. E entre o Gojo e a Maki, tem mil meios-termos de poderes impressionantes que são simplesmente o poder designado ao personagem no nascimento.
Porque a Mei Mei controla corvos? Nasceu assim. Porque o Todo teleporta batendo palma? Nasceu assim.
Ok, estou com um tom pejorativo, pois eu não gosto de Jujutsu Kaisen, mas isso não precisa ser negativo necessariamente.
Os stands de Jojo’s Bizarre Adventure não precisam ser de nascença, alguns foram obtidos por uma flechada, e eu vou falar sobre isso no Tipo 2, daqui a pouco além de que o mangaka, Hirohiko Araki, pode não ser muito consistente quanto a como os personagens obtem os stands. Mas boa parte é de nascença, e é um poder de um carisma invejável.
E esse carisma é porque stands sempre soam poderes muito pessoais. O poder de Kira, o Killer Queen é a cara dele o poder. E em Jujutsu também, o poder de Nanami de dividir tudo em dez partes pra uma se tornar o ponto fraco, combina com ele.
Em Boku no Hero Academia, 99% dos personagens nascem com seus poderes, sendo eles uma mistura dos super-poderes dos seus pais. Então embora a obra faça eles combinarem com seus poderes, eles soam menos “a alma” de seus personagens, e mais como coincidências.
Porque a verdade é, que em qualquer história os personagens vão combinar com seus poderes, a maioria deles foi criada com um superpoder em mente já. É parte deles e do seu carisma tanto quanto suas roupas, aparência e maneirismos, então obviamente eles vão combinar.
Mas a maneira como o personagem obteve esse poder pode determinar se esse match é acidental ou proposital.
Em Fire Force, uma parcela de pessoas despertam poderes de fogo de maneira aparentemente aleatória. Mas sabendo que a origem de tudo que é mágico no mangá vem do subconsciente das pessoas e daquilo que existe no campo das ideias, é notório como esses poderes parecem pensados sob medida pra fazer com que eles se tornassem suas pessoas ideais. Shinra que quer ser um herói acima de tudo, tem o poder que lhe permite voar, mas em Arthur, que quer ser um cavaleiro medieval, seu poder assumiu a forma de uma espada.
Temos também esse mangá recente Sensou Kyoushitsu, em que pessoas com chifres possuem poderes especiais, protagonizado por um rapaz que sonha e ser um músico, ao desenvolver o poder de transforar o som que ele solta da corneta em imagens, ele se torna um líder militar que guia tropas de pessoas com poderes com sua corneta. Recomendo, e passa muito disso, uma pessoa que só se interessa por música, desenvolve de dentro de si, um poder relacionado a música.
Quando o poder surge espontaneamente no personagem é fácil ver esse poder como a verdadeira essência do personagem, um indício de sua alma, e um reflexo de quem o personagem é, e isso é uma excelente forma de caracterização.
Mas o momento que o tipo 1 brilha, é na hora de criar uma parcela dos personagens pra serem o privilégio máximo. Só a minoria dos personagens de Fire Force desperta poderes de fogo, mas da minoria, somente 8 vão despertar o Adolla Burst, que significa que eles são ainda mais fortes que os demais.
Assim como em One Piece, todo mundo tem o potencial de aprender haki, mas um seleto grupo de pessoas nasceu com o haki da tonalidade régia. Que tem o potencial pra serem líderes e as poucas pessoas desse grupo estão entre as mais poderosas do mangá.
Em Mashle o potencial mágico nato dos personagens é marcado pelas linhas que eles tem no rosto. O protagonista tem zero, pois ele é o herói que vai triunfar vindo lá de baixo, a maioria dos personagens tem uma, os especiais tem duas e os excepcionais tem três, e essa é a hierarquia do mundo, em que riscos na sua cara falam quem é abençoado desde o nascimento e quem não.
Nem todo mangá precisa fazer isso ser algo fixo e imutável. Uma parte considerável do roteiro de Naruto se baseia em vilões querendo roubar, controlar e transferir os poderes que só podem ser obtidos geneticamente, o que pode envolver violar cadáveres, fazer cobaias humanas e ou transplantar córnea.
Existe também o caso de Undead Unluck, que não é genético. E mal é um superpoder. Os poderes na verdade são maldições, dados pras pessoas que Deus escolheu a dedo que queria ver tomarem no cu! E os personagens precisam dar a volta por cima pra controlar suas maldições e transformarem em poderes. Ainda conta, pois acho que loteria genética ou um literal “quem Deus odeia e quem Deus ama?” meio que chegam no mesmo ponto de completa falta de agência. E da necessidade de compensar ter saído com a mão ruim.
Mas é isso aí, a construção-de-mundo do tipo 1 gira em torno de quem é geneticamente superior. Quem nasceu abençoado, e como as vantagens e desvantagens que uma pessoa tem pra vencer na vida são determinadas no nascimento.
Isso não significa que os mangás estão celebrando isso necessariamente. Mas um segredo, cá entre nós, muitas histórias escritas, são sobre heróis que enfrentam e desafiam o mundo. E pra essa luta ter valor, a construção-de-mundo dessas histórias é injusta e cagada. O que atinge seu auge em Undead Unluck, em que os personagens estão tão insatisfeitos com como as regras do mundo natural foram escritas que eles vão desafiar Deus diretamente.
E aí as vezes têm um cara querendo ler mangá como quem lê o livro do mestre de um RPG que quer viver naquele mundo, não, é o oposto, esse mundo é terrível e injusto.
Então o Tipo 1 não rende histórias ruins, nem de longe, e eu mesmo tenho texto aqui defendendo predestinação e gente especial por ser especial em histórias quando são escritas no contexto correto.
Mas na hora de imaginar que tipo de sistema de poderes você queria que existisse de verdade. Lembre-se, no Tipo 1, você não teria poderes. O Tipo 1 favorece a nobreza, a aristocracia e as pessoas que nasceram nas famílias abençoadas pelos deuses! Não sou eu esse cara! Se eu vivesse no mundo de Jujutsu eu não a ter poder algum. Zero chances de eu ser o usuário de Stand em Jojo….
….a menos que eu levasse uma flechada.
Por falar em flechada, vamos pro Tipo 2.
Tipo 2: A caçada ao tesouro.
Os poderes do Tipo 2 não vem do berço. Mas eles ainda vem com um tiquinho de sorte, que pode ser combinada com esforço e ambição. Os poderes do Tipo 2 são obtidos por forças externas, sejam artefatos, comidas ou seres vivos, que dão o poder pra quem encontrá-los. Isso significa que embora em alguns casos, geralmente se você é o protagonista e o protagonista for um moleque normal puxado pra uma trama maior que ele por conta de ter adquirido um poder imenso, aí nesse caso o poder possa só cair no seu colo na sua casa enquanto você vê televisão, para a maioria dos outros personagens o poder é um testamento de sua vida de aventuras, do quando ele explorou o mundo, você caça esse poder e pessoas dão a vida por eles. Quando não é um indício de uma aventura, então é um indício claro de que a pessoa está altamente envolvida na trama, afinal ela possui um dos artefatos com ela.
Em Jojo os felizardos do mundo nasceram com seu Stand, ou o desenvolveam espontaneamente por serem especiais, mas metade dos usuários não teve essa sorte. A sorte que eles tiveram foi topar com um arco e flecha mágico que ao acertar alguém, tem a possibilidade da pessoa sobreviver a ferida da flecha e despertar um super-poder de Stand…. mas tem a possibilidade de te matar.
Pois em um tipo 2 que se preze, conseguir seu artefato é uma aposta, tem que ser, você pode sair dessa poderoso, mas muita gente saiu morta. É tudo sobre correr riscos.
Enfim, é comum em Jojo é termos um super-vilão cujo poder é espontâneo, e que sai dando flechada em todo mundo que ele consegue pra recrutar subordinados super-poderosos que deem trabalho aos heróis. Nas partes 4 e 5 da série um esforço muito grande é feito por parte dos protagonistas pra obter o arco e flecha pra si, que pro plot ficar interessante sempre começa nas mãos erradas.
Certamente o exemplo mais famoso de um sistema no Tipo 2 que existe é One Piece, com os frutos do Diabo que funcionam como a principal fonte de poderes no mangá. Os poderes são obtidos depois que o usuário come um fruto, que ele pode encontrar por acaso em suas aventuras ou ganhar de presente de alguém que encontrou por acaso em aventuras.
O que significa que os frutos podem ser um testamento da vida de aventuras que os personagens vivem, fora da Grand Line, Luffy quase nunca encontrava quem comeu o fruto, mas dentro da Grand Line ele encontra constantemente, pois quanto mais fundo você chega onde está o perigo, mais gente que já encontrou um fruto você encontra.
Ao mesmo tempo que civis aleatórios as vezes comeram, pois ainda é questão de você achar. Ou conhecer a turma certa. O Luffy comeu a dele dando rolê com uma lenda viva voltando de uma aventura. A Tama sei lá, mas tem tanta lenda andando por Wano, parece mais fácil uma criança em Wano dar essa sorte do que uma criança em Ohara…. Me pergunto como a Hana Hana no Mi foi parar na mão da Robin.
Mas esse aspecto deles serem um testamento do personagem estar inserido no ambiente aventureiro pode ser visto mesmo em Magi, onde os poderes dos personagens vem dos Djinns que eles dominam, e como se domina um Djinn? Conquistando uma masmorra. Vemos os personagens entrarem em masmorras e encontrando cadáveres, e aí sabemos, centenas e centenas de pessoas morrem pra conquistar uma, e o poder é uma marca dos que conseguiram.
Em Akame ga Kill, existem armas especiais que possuem poderes nelas, que são as Teigus. Quando o Império que serve de vilão pra obra foi fundado, o primeiro imperador temendo ser detronado, mandou criar 48 armas mágicas pra defender o Império de uma revolução. Passam-se os séculos, guerra vem e guerra vai e metade das Teigus desaparece na história, e boa parte cai nas mãos precisamente dos revolucionários, que são os heróis que acompanhamos, assassinos que usam Teigus pra poder enfrentar as defesas do Império e matar seus lideres e permitir a revolução popular.
O protagonista Tatsumi entra pro time de assassinos no capítulo 1, mas é só no fim do volume 3 que ele ganha a sua Teigu, pois como eu disse, elas são testamentos de que você entrou de verdade naquele mundo, foi além do superficial.
Teigus também tem compatibilidade, o que significa que elas aprovam ou rejeitam seu usuário, e poderes o tipo 2 frequentemente dão alguma agência ao artefato que dará o poder, de poder julgar se seu usuário é digno ou não. O que dá um tom legal. Você tem que ser aceito por aquele mundo.
O artefato do poder mais vezes do que não é apresentado tendo algum tipo de vontade própria e o usuário do poder tendo que constantemente se provar digno do poder, se mostrar respeitoso com seu poder, e ter uma compatibilidade e empatia com seu poder. O que é uma boa tática de fazer a história no final recompensar o poder do herói de não ser um arrombado.
E tecnicamente, acho que qualquer história do subgênero dos “Mons” como Digimon, Medabots, Gash Bell, em que é tudo sobre o laço entre essa pessoa e essa criatura que lutará em seu nome numa rinha se encaixam no Tipo 2. Embora eles não cacem as parcerias que fazem com seus mons. Não tem o aspecto da caçada, mas é um subtipo próprio que fica aqui.
Mas não Pokemon, pois tem muito mais pokemon do que pessoas e todo mundo tem pokemons. É o Tipo 3. Só nos outros “mons” em que um único parceiro por criança se conecta a ela a nível épico.
Mas isso me faz pensar? Soul Eater é um mangá de “mon”, em que o monstro aliado é um ser humano? É possível ler assim? Respondam essa nos comentários.
Enfim. A Hiromu Arakawa, de Fullmetal Alchemist está com um mangá do Tipo 2 interessantíssimo, os caras precisam criar laços com pares de criaturas espirituais que vem sempre em dupla e representam dualidades no mundo, como esquerda e direita, preto e branco, aprisionar e soltar ou lebre e tartaruga. E os poderes são baseados em ter dois lados de uma moeda. Recomendo que deem uma olhada, um conceito super criativo pra um Tipo 2. Chama Yomi no Tsugai localizado no ocidente pra Daemons of the Shadow Realm e eu recomendo.
Dependendo do artefato a transferência de um poder pra outra pessoa é mais fácil. Em Akame ga Kill, Teigus são roubadas e passadas pra usuários do lado inimigo. Em One Piece frutos reencarnam pra serem comidos por outra pessoa. O que nos permite a experiência fascinante de ver como dois personagens diferentes usam o mesmo poder e nessa semelhança enfatizar qual é a individualidade de cada personagem. Além da constante tensão de ter um poder podendo ir pro lado inimigo.
Na prática, como em qualquer caçada, existem vantagens e desvantagens. Tem gente que consegue comprar frutos ou herdar Teigus por terem boas famílias. Privilégios e pedigree ajudam personagens a cortar caminho e ter acesso a bons poderes. Não é aquela injustiça em que você não faz nada, só nasce, é só uma grande vantagem, mas é uma vantagem. Sair numa vida de aventura não é pra qualquer um, alta taxa de mortalidade e muitos filtros separando os fracos dos aptos, e os aptos geralmente tem um bom background tornando eles aptos, embora o protagonista possa ser a exceção.
O Teach queria um fruto específico, e sabia que pra isso ele tinha que anda no Navio do maior pirata do mundo, ex-discípulo de outro pirata lendário. Que ele precisava desse contato pra ter acesso ao que ele quer.
Se o Tipo 1 são algo mais nobre, ou você nasce bem ou nasce mal. O Tipo 2 é a ilusão da mobilidade social meritocrática em sociedades capitalistas. Na teoria é possível adquirir, mas você vai competir com gente que herda as vantagens e joga sem seus obstáculos.
É mais justo que o Tipo 1, mas não o suficiente.
E isso nos leva pro Tipo 3.
Tipo 3: O potencial natural.
Ok, então recapitulando, o poder pode vir do quão abençoado é o seu nascimento, pode ser conquistado em uma vida de aventuras, ou ele pode só ser parte de você desde o começo, mas não só você, de todo mundo. Pode ser meramente uma característica pouco explorada do ser humano.
Algo que qualquer um pode dominar, desde que aprenda a usar, e encontre um bom mestre.
O exemplo mais icônico é o ki de Dragon Ball. Todo mundo tem ki, todo mundo pode aprender a manipulá-lo. Qualquer um pode aprender qualquer golpe ali. Ninguém tem uma técnica que só ele pode usar.
O kamehameha é a marca dos discípulos do Mestre Kame, que aos poucos virou a marca do circulo social do Goku, pois o Tenshinhan consegue usar e ele é da escola rival. E é isso. A Androide Nº18 aprendeu o kienzan com o Kuririn.
E ao mesmo tempo qualquer um pode criar seu próprio golpe. Kuririn teve a ideia do Ki em formato de disco que corta os oponentes. Piccolo moldou seu ki como uma furadeira pra perfurá-los. Yamcha inventou o ki que ele controlava a direção. E o Mestre Tsuru inventou a tecnica de usar o ki pra voar. A base é a mesma, mas por todos terem a mesma base, vira um grande teste de criatividade quanto ao que fazem com ela.
A energia espiritual de Yu Yu Hakusho também claramente pode ser aprendida por humanos que treinarem e familiarizarem com o que rola. E a mesma coisa pro cosmo em Saint Seiya.
Exemplos esse que tentam usar conceitos de uma energia natural que faz parte de todo ser humano.
Mas nenhum exemplo é mais maravilhoso que o do nen em Hunter X Hunter, tão maravilhoso que ganhou texto aqui em outra vida.
E a beleza do Nen é que justamente, a pessoa tem o poder de pegar a própria aura e aplicar um esquema de restrições pra montar seu próprio poder customizado do zero.
E eu juro, nada pra mim é mais fascinante do que todo guerreiro do mangá ter sido seu próprio designer de como seu poder funcionará. O que faz com que nen seja um caso muito específico de poder do Tipo 3, que faz o poder parecer um pedaço da alma do personagem tanto quanto qualquer poder do tipo 1 consegue.
Mas o grande segredo do Tipo 3, é que ele exige um foco forte em educação.
Claro, claro Jujutsu Kaisen e Boku no Hero Academia se passam em escolas pra ensinar a turma do Tipo 1 a controlar seus poderes, assim como a Escola Xavier pra Jovens Dotados, o tipo 1 sempre permitiu que as pessoas aprendam a usar seus poderes loucos de nascença.
Mas aqui é uma ideia que vai mais pro caminho de que descobrir que você pode despertar seu superpoder já é por definição um ato de educação.
Todo mundo precisou de um mestre pra sair do zero. E sair do zero não é aprender a controlar e dosar a quantidade inimaginável de poder que se está soltando inconscientemente. Sair do zero é sair do estágio onde eu e você estamos. Nas Escolas Xavier da vida, se ensina muito ética e disciplina, o que é importante, mas aqui de fato se distribui conhecimento também.
Eu acho muito especial como o Kame em Dragon Ball foi um professor pro Goku, que achou que tão importante quanto ensinar ele a soltar raios e quebrar pedras, ensinou matemática, e vocabulário pro menino.
Em Hagane no Rekinjutsushi (Fullmetal Alchemist no ocidente), os protagonistas Ed e Al aprendem o básico da alquimia sozinhos, lendo os livros do pai, nesse mundo alquimia é uma ciência e pode ser aprendida e estudada, mas requer muito estudo e muita dedicação, como em qualquer ciência.
Em Witch Hat Atelier, que não é um Battle Shonen tecnicamente, existe logo no começo a revelação de que toda magia na verdade é uma habilidade natural que só precisa de lápis e papel pra desenhar círculos. E o fato de que todos os bruxos são pessoas normais e que qualquer um pode ser um bruxo é um segredo guardado a sete chaves pra impedir justamente que qualquer um seja um bruxo.
Exemplos de tipo 3 tem a maior chance de ter uma construção de mundo que enfatize como a sociedade usa e classifica poderes, pois embora eles sejam naturalmente acessíveis, esses mangás ainda trabalham a ideia de que só os protagonistas têm poderes, pois o conhecimento não foi democratizado.
Pois essas obras ainda existem em mundos habitados por gente comum que não vai lutar contra o mal.
Mas existe um apelo forte, na ideia de que a pessoa com o poder pode ser qualquer um, desde que essa pessoa tenha acesso à educação, a um mestre, a transmissão de conhecimento. Todo mundo que não tá errado curtiu o moleque no estábulo usando a força no fim de Star Wars VIII: The Last Jedi. Farei esse parêntese pra defender esse filme sim.
E se o tipo 1 obriga o mundo a girar em torno de uma aristocracia de superpoderes. E o tipo 2 mede os privilégios dos outros para obter os superpoderes. O tipo três põe os holofotes no fato de que é a sociedade humana quem tem que fazer esse trabalho. Tem poder pra todo mundo, e a culpa não é da sorte, da genética ou da quantidade finita de recursos, que não tá todo mundo usando, a culpa é nossa.
O tipo 3 é o único que tem a possibilidade de ser utópico. Mas a ficção trabalha muito pouco com utopias, a gente tem o mal hábito de não confiar em histórias sobre utopias, então a gente usa eles em distopias, em mundos cagados e injustos. Mas por culpa das pessoas.
O que me volta ao ponto inicial, como nós fantasiamos com como seria ser parte desses mundos e graças a esses sistemas de poder, termos nós mesmos o nosso próprio poder.
Conclusão:
Gente, longe de mim policiar a fantasia de vocês fantasiem com o que quiserem, eu dou permissão de sonhar acordado imaginando qualquer escapismo possível. Exceto pelo escapismo de ser iseikaizado pra um mundo de fantasia onde você obtem escravas. O limite é esse, proibido fantasiar que você vai ser um “bom” dono de escravos no isekai. Mas no geral ok sonhar.
Eu escrevi o texto como se ele fosse com a descoberta do sistema de poder justo, mas a verdade é que nenhum é justo. O Tipo 3 é o mais justo de todos, e ele é tão justo quanto a capacidade do ser humano de criar uma sociedade justa, o que eu acho que é algo no qual estamos continuamente falhando tem alguns milênios. Porque no fundo a diferença que eu propus é a diferença entre ser o Rei Charles, a Kim Kardashiam e o Noam Chomsky, e bem, o status do Chomsky ser mais acessível pra mim é uma verdade relativa comparado aos outros dois, mas também é tudo distante de tudo.
O que não devia nos impedir de continuar tentando e fantasiando! Reforço, a gente escreve pouca utopia. Pouca história propondo de fato o desenho de uma sociedade melhor pra gente querer imitar. E obviamente battle shonens não são pra imaginarmos sociedades melhores, são pra imaginarmos razões pra violência ser a solução necessária.
Akame ga Kill e One Piece são do Tipo 2 e usam a violência como um meio de lutar por uma sociedade melhor. Bleach é do Tipo 1 e apesar de ser visível que a sociedade dos shinigamis é cagada, ninguém faz nada a respeito. Naruto é do Tipo 1 e termina com o Naruto se tornando parte do problema, operando o sistema estruturalmente quebrado que é Konoha, sem fazer nada. Por outro lado Hunter X Hunter e Fullmetal Alchemist são do Tipo 3 e passam com força a vibe de que a humanidade não vai melhorar.
Sei que Fullmetal Alchemist soa otimista, pois eles derrotam os homúnculos, mas eles não derrotam o fascismo, pois essa ideologia estava impregnada demais nos aliados da luta contra os homúnculos pra ser desconstruída. E os personagens anti-fascistas fazem concessões, e sonham com uma melhoria a longo prazo que eles talvez não vivam pra ver sair do papel. Tem um texto meu sobre isso.
Isso significa que o Tipo 2 é mais próprio pra revolução? Pois permite tomar os artefatos do opressor e usá-los contra eles? Eu não sei. Agora estou somente pensando em voz alta mesmo. Em Terra Formars as pessoas fazem operações em si mesmas, inserindo um órgão especial num transplante de alto risco de vida, pra ganhar o poder de se virar um híbrido com outro animal. O poder seria usado pra chegar em Marte e exterminar a população de lá, mas os marcianos são espertos, matam os astronautas e pegam o poder de virarem híbridos pra eles próprios! Em Terra Formars os marcianos são os vilões e supostamente devemos querer seu extermínio…. Mas a sensação de “O jogo virou” que o Tipo 2 permite de fato é ótima pra pensar relações de poder.
E o meu texto é um pouco sobre isso! Sobre como é um exercício de pensamento comum do nerd pensar pra qual mangá, série, filme ou quadrinho ele queria ser iseikaizado, mas nunca se perguntar se esses mundos são bons de se viver quando não se é o protagonista. O próprio gênero Isekai dá passos extras pra fazer muitos de seus protagonistas receberem vantagens diretamente de Deus pra eles saberem que eles são os protagonistas sim senhor.
E nessa perspectiva todos os poderes são iguais. Em todos os tipos, em 80% dos mangás mencionados eu posso me imaginar surgindo nesse mundo e virando um Looney Tune, atacando todo mundo com um martelo do tamanho de um elefante, mas que eu tirei do bolso da calça. Não importa se o martelo é feito de fogo, pra eu poder estar em En En no Shoboutai, se eu comi o fruto do Diabo do Martelo ou se o martelo é meu poder de nen.
Mas a verdade é que em qualquer um desses mundos eu seria provavelmente um cara que devia estar estudando pra passar num concurso público e parar com uma série de freelas humilhantes, mas que mesmo assim faz pausas nos estudos pra escrever sobre otakice num blog…. (por favor, colaborem com o apoia.se do Dentro da Chaminé). Nenhum desses mundos oferece um poder como a chave pra gente mudar de vida, só como uma maneira de usarmos o privilégio em vida pra termos um poder.
Se eu fosse escolher um mundo desses pra habitar, eu ia querer viver no mundo de Dragon Ball. Um planeta sem fronteiras, completamente unificado, em que a terra não tem dono, e qualquer um pode jogar uma capsula de casa em qualquer lugar e morar lá sem se preocupar com se aquele pedaço de terra sem uso é de alguém. Em que regiões com seca podem só buscar a água gratuita e abundante das regiões com muita água sem preocupações. E em que o Goku vai me ressuscitar sempre que o Freeza me matar. Mas isso não tem nada a ver com superpoderes.
Se eu pudesse ter só o poder, eu ia querer ter o nen. Pela minha agência. Porque eu poderia pensar em cada detalhe com liberdade e decidir as limitações eu mesmo. Porque no fundo, eu falei de justiça e acessibilidade, mas pra mim o fator decisivo é minha agência, o quando eu poderia por o meu imput criativo no meu poder. E isso só o Tipo 3 oferece.
Mesmo se você não quiser a boca livre do nen, eu acho que a liberdade de moldar seu ki pro seu tipo específico de lutar, mais legal do que nascer com o poder de controlar espelhos, não importa o quão louco e versátil você trabalhe com isso.
Ao menos é assim que eu faço essa brisa.
Como é com vocês?
Vocês preferem um poder acessível ou botam fé que serão os privilegiados? Vocês querem ter agência no poder de vocês ou ser designado com um pedaço de suas almas? E vocês aguentariam viver no mundo dos seus mangás favoritos? Esse tipo de conversa eu quero ver continuando nos comentários. Que eu volto no meu texto seguinte que vai ser sobre….. eita, já é o fim de outubro. É não vai dar tempo de fazer um texto de Halloween. Não estou no ritmo com textos que eu queria estar nesse ano, mas está tudo bem. Nos vemos no próximo texto mesmo assim.