Pirates of the Caribbean – Sobre Jack Sparrow, a Inglaterra e o sobrenatural

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Em 2003 saiu um filme chamado Pirates of the Caribbean: Curse of the Black Pearl que instantaneamente catapultou um personagem chamado Capitão Jack Sparrow pra um dos mais icônicos da cultura pop. Jack não é o protagonista do filme, ele é o Han Solo pro Luke Skywalker que aqui seria o Will Turner. Mas Jack soava o protagonista, ele era o personagem mais interessante ali, ele tinha um arqui-inimigo e uma grande luta. Ele foi o grande assunto da recepção do público ao filme e rendeu uma indicação ao Oscar pro Johnny Depp.

A maneira como esse filme lidou com seus protagonistas foi uma das várias coisas interessantes e fora do padrão de Hollywood que esse filme fez e não saber direito como lidar com essa dualidade entre Will e Jack é um dos problemas dos demais filmes.

Enfim. Jack Sparrow foi imediatamente aclamado como uma das coisas mais legais do cinema. E aí… o personagem passou a ser uma referência negativa pros maneirismos e exageros que seu ator Johnny Depp usou em performances posteriores igualmente caricatas. Além disso, questões legais sobre o Johnny Depp vieram a tona e concluímos que ele não era um cara legal. E isso refletiu na imagem de Jack Sparrow que foi se tornando mais negativa, corroborado pelo fato de que a franquia se torna menos popular a cada filme novo.

O primeiro filme é bom e todos gostam. O segundo e o terceiro filme são controversos, em que apesar de Gore Verbinski filmar algumas das mais divertidas e memoráveis cenas do cinema blockbuster e isso estar sendo cada vez mais resgatado e reconhecido por críticos e influencers, a trama convoluta dos filmes e sua longa duração ainda dificultam o carisma deles.

Aí veio o quarto filme que diminuiu a duração, diminuiu a complexidade da trama, mas colocou uma direção tão não carismática e fez todos os personagens soarem atuando no piloto automático, nada no filme é memorável de verdade. Além de remover o Will Turner do filme completamente, dando ele inteiramente ao Jack Sparrow como único e indiscutível protagonista do filme. Não deu carisma pro filme.

Mas até aí tudo bem, foi no completo desastre que foi o quinto filme que todos os defeitos de todos os filmes ficaram irrelevantes em comparação. Dava pra por tudo de lado e falar “Hey, pelo menos não é a abominação que foi o quinto filme.” e a franquia foi presumida morta com ninguém falando nada sobre o assunto por um tempo. Até a Era do Reboot nos lembrar que ninguém fica sem falar de um assunto por muito tempo.

E aí anunciam que o sexto filme sairá sem o Jack Sparrow. Que eles vão tentar resgatar a franquia ainda, mas sem o grande pirata do cinema pra liderar a franquia. Inclusive boatos de que a franquia será liderada por uma mulher negra no sexto filme. E bem, obviamente essa decisão foi tomada pelo fato de que nenhum produtor quer se envolver mais com o Johnny Depp devido aos detalhes de seu comportamento que vieram a público recentemente. Mas pareceu mesmo que existia uma fadiga do Jack Sparrow que estava precisando pra renovar uma franquia que nunca realmente conseguiu se dar bem como franquia tanto quanto se deu bem como filme único.

A franquia tem salvação ainda? É possível fazer um filme sem o Capitão Jack Sparrow? O quanto Jack Sparrow de fato estava ajudando nos filmes? Como a franquia e o Jack contribuíram ao nosso imaginário do que é um pirata? E sobre o que Pirates of the Caribbean. realmente é? Essas são as perguntas que eu vou tentar responder nesse texto aqui! Mas também sem ter uma pergunta em mente quero um pouco explorar como a franquia explora seu mundo de fantasia, e também como a Europá aparece na franquia e com ela, a ascenção do capitalismo.

Antes de me afundar no assunto, eu queria falar que apesar de ter vontade de subir em um navio e sair pilhando e afundando navios das marinhas, eu não faço nada disso. Eu faço bicos indignos, tento arrumar empregos dignos e escrevo nesse blog. Por isso o blog conta muito com o financiamento coletivo do apoia.se para juntar o dinheiro que mantém esse blog de pé. Pagando os custos de hospedagem, e as eventuais despesas com o computador…. Que de verdade, ele pifou duas vezes em 2023.

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Um texto sobre piratas. E sobre o Caribe….

….e por onde começar? Vamos começar pro começo de tudo. Pra uma atração no parte da Disneyland de Los Angeles que abriu em 1967, e além de ter sido uma das atrações mais populares do parque, sendo reproduzida nas demais Disneys do mundo, como a de Orlando em 1973, de Tokyo em 1983 e de Paris em 1982, era popular sem nem ter um filme. Essa atração popular era famosa também por ter sido a última atração que o Walt Disney criou e supervisionou em vida, a última marca que ele deixou no parque. E a atração era um arraso. Era uma das grandes referências do que torna um lugar mais parecido com a Disneyland.

E a atração é um passeio de barco em que você viaja pro passado e testemunha o cruel ataque dos piratas a uma cidade em que eles afogam o prefeito, pilham, saqueiam, atacam mulheres, leiloam pessoas e demais horrores. Tudo enquanto ouvimos os piratas cantarem uma alegre canção sobre como é bom ser um filho da puta.

Aí em 2003 fizeram o filme inspirado na atração. E não foi a primeira vez que adaptaram uma atração do parque da Disney pro cinema, mas foi a vez em que isso aí deu certo de verdade, algo que eles ainda não conseguiram repetir, mesmo tentando.

E com o tempo a atração foi mudando pra lembrar mais o filme, o que aqui significa: animatrônicos do Jack e do Barbossa aparecem na atração agora. Chegaram a ter coisas do Davy Jones e do Barba Negra do filme, mas esses já foram removidos. Mas o Capitão Jack Sparrow continua ali.

A versão de Shanghai da atração inclui um Davy Jones.

E é curioso, pois a atração é feita pra termos uma imagem extremamente negativa da pirataria, e mostrar os piratas como os monstros de histórias infantis que eles são. O Walt Disney ao promover a atração em um vídeo, pergunta pra reporter: “Você acredita em piratas?”, como se eles fossem seres da fantasia e não figuras históricas comprovadas. Navios cheios de bicho-papão, movidos por nada além de ganância. Que incendeiam a cidades e riem. E os filmes não corrobora exatamente essa imagem. Ao menos não no sentido negativo.

A identidade dos piratas:

Os três primeiros filmes são a jornada do herói Will Turner de entender que ele nasceu pra ser pirata e não um mero ferreiro. Começa com ele cometendo sua primeira trangressão e saindo pro mar, em nome do amor, e termina com ele assumindo o posto de capitão do Flynig Dutchman, o segundo navio mais badalado dos mares.

Em paralelo a isso, Elizabeth Swann a filha do governador também se torna uma pirata no meio do terceiro filme. E não qualquer pirata, ela se torna o Rei dos Piratas que uniu todos os piratas para enfrentarem o exército de Beckett e vencerem….

…e depois ela se aposenta pra criar o filho do Will numa ilha deserta e proteger o coração dele. Não sei, se ela navega e pirateia nos 10 anos em que ela tem que esperar por ele.

Esses dois têm que aceitar a identidade pirata dentro deles. Na real, Elizabeth tem que aceitar somente a vocação, Will é o único que tem conflitos pra aceitar a identidade, e todos os outros já estão completamente confortáveis com o rótulo.

O filme não faz a menor questão de tentar ser um retrato realista do que foi a pirataria no Caribe nos séculos XVII e XVIII, e nem finge que vai tentar. Ele enfia lore aleatório de fantasia no bagulho, incluindo um suposto código pirata, que obviamente não existe. E eu não vou entrar no mérito de que nada é realista, pois tudo é mágico. Então vamos olhar em como são esses piratas desse mundo fantástico.

Os piratas têm pouca consciência de classe entre eles, de achar que devem se aliar diante de inimigos comuns, salvar outros piratas do governo ou mesmo salvar os próprios. Eles seguem o código pirata e o código diz:

O homem que fica pra trás, é deixado pra trás.”

Os piratas não ligam pros outros piratas. E juntar nove piratas pra uma reunião que salvaria todos eles da extinção foi um trabalho imenso no terceiro filme.

Mas vou falar, é impressionante quanta gente eu já vi que acha que essa de abandonar a galera que fica pra trás era um código pirata de verdade, o que definitivamente não era. Aliás, já explicando, um código pirata é na real um acordo de regras que cada navio diferente bola coletivamente antes de zarpar e cujos tripulantes votavam, uma vez escrito, cada tripulante faria individualmente um juramento de seguir aquelas regras enquanto durasse seu serviço e era isso. Ele essencialmente cobria como deveriam ser divididos os prêmios, e que hábitos não seriam tolerados no navio (como roubos, deserção, ou apostas), como seriam compensados os feridos em combate e quais as punições por infrações…. eram leis específicas de cada navio, não uma grande lei geral.

Mas é impressionante quantos elementos desses filmes são incorporados e as pessoas acreditam que eram parte de rotina de piratas de verdade, prova da influência dos filmes, mas também prova do quanto não temos muitas outras referências de piratas na cultura pop pra fazer o contraponto.

Enfim, sobre o conselho dos piratas: conselho dos piratas não se dá muito bem, mas eles ao se reunirem mostram que piratas são um grupo diverso. Todas as etnias e culturas possuem um grande pirata, em todos os mares, não tem realmente um traço cultural que una todos eles em uma só ideia. Com exceção do código pirata.

….que é algo que eles mais respeitam e tentam não cagar em cima, do que algo que eles seguem como se fosse a bíblia.

Nenhum pirata é retratado como gostando de agentes do governo, mas nem de longe, mas eles também não são retratados como a antítese do governo. Sao Feng fez uma aliança com o Lorde Beckett, e Barbossa se tornou um corsário navegando sob o nome do Rei George II, na contramão, Norrington e Gibbs eram marinheiros do governo até caírem na pirataria. No fundo é bem fácil cair do outro lado desse conflito.

Mas uma coisa que os piratas têm com eles com força é o sobrenatural. Todos os cinco principais capitães piratas da série possuem em sua posse um item mágico que é a fonte de seu poder, de sua influência e do que os torna temido. E ninguém que não seja um pirata tem um desses itens em posse. O plano de Lord Becket é ter posse e controle sobre o sobrenatural, e esse plano fracassa.

Capitão Jack Sparrow, o pirata protagonista da franquia e um dos piratas mais famosos da ficção tem o que agora é o navio pirata mais famoso da ficção, o Pérola Negra, o navio mais rápido do mundo, o navio foi dado a Jack Sparrow por Davy Jones pra que Jack o capitaneasse por 13 anos, em troca de sua alma em servidão eterna ao fim desses 13 anos, e Jones deu um navio mágico pra Jack, que era impossível de ser capturado, pois corria mais que qualquer outro navio.

O segundo artefato mágico de Jack é a sua bússola, que aponta não o norte, mas aquilo que o seu portador mais deseja. O que costuma ser inútil nas mãos de um não-pirata como Norrington, que sendo um lambedor de botas não entende realmente o conceito de desejo e o considera uma bússola quebrada. O Lorde Beckett rouba a bússola e ela também se prova inútil em sua mão, uma vez que Beckett não conseguia fazer ela parar de apontar pra Jack, em um dos vários momentos que deixam implícito que Beckett em algum momento foi apaixonado por Jack (o outro quando ele disse que Jack deixou uma marca nele).

A bússola foi obtida por Jack de Tia Dalma supostamente, com o quinto filme desmentindo isso e falando que ela foi herança do antigo capitão de Jack, eu fico com a informação do segundo filme, pois é o filme que eu respeito mais.

Barbossa foi amaldiçoado pelo ouro asteca de Cortez. Um tesouro que ele queria muito devolver, para cancelar a maldição, mas devolver esse tesouro seria a última coisa que ele faria em vida, morrendo segundos após o ouro ser devolvido e a maldição acabar…. Além disso Barbossa foi capitão do Pérola Negra que ele roubou de Jack, e roubou a espada do Barba Negra eventualmente.

Davy Jones era o capitão do Flying Dutchman, um navio mágico cujo capitão é o encarregado por auxiliar na passagem dos que falecem para o mundo dos mortos. E ele também era quem controlava a terrível criatura marinha, o Kraken, lendário polvo gigante mitológico que pode destruir navios inteiros com seus tentáculos.

Quando Jones foi traído pela Deusa Calypso, ele arrancou seu coração e o trancou em um baú, que passou a ser conhecido como o Baú do Morto, e se tornou um item sobrenatural, em que esfaquear o coração no baú passou a ser a única maneira de se matar a criatura imortal que Davy Jones se tornou. O baú foi escondido em uma ilha com a chave pro baú ficando a bordo do Dutchman com o próprio Jones.

Sao Feng possuía em seu poder um mapa chinês que permitia localizar tudo o que era ilocalizável no mundo que os piratas usaram pra chegar ao mundo dos mortos.

E por último Barba Negra possuía com ele uma espada mágica que ele usava pra controlar o seu navio o Queen Anne’s Revenge.

Ele também tem o poder de prender navios em garrafinhas, o que não é algo explorado de verdade, mas ele tem. Ele pode pegar um navio, diminuir, pôr em uma garrafa e agora o navio está inutilizável.

E o Barba Negra usa voodoo também. Nossa, pra um vilão sem nenhuma presença no filme eles jogaram muita magia na direção dele, mas que não tinha nada a ver com o filme.

E esses são os cinco capitães piratas que importam na franquia. Se bem que acho que os itens que os Nove Lordes Piratas usaram pra libertar Calypso são itens mágicos também.

Tudo nos piratas têm magia, tem misticismo, tem o lado misterioso do mar. E os oficiais do governo se dividem entre não ter a capacidade de apreciar esse lado misterioso, ou desejá-lo, mas não serem capazes de fazer uso real.

E um último detalhe que eu vou fazer antes de ir pra próxima sessão, todos esses itens, maldições e magias que cercam esses piratas são por sua natureza, pagãos. Nenhum deles invoca o poder do Deus Cristão, nem do Diabo. Eles invocam o poder de outros deuses, ou de pessoas que acreditam em outros deuses, Calypso é uma deusa grega, porém após ser presa em um corpo humano e assumir o nome de Tia Dalma, ela passa a negociar itens da religião vudu. O tesouro amaldiçoado de Cortes foi amaldiçoado pelos deuses astecas. Davy Jones é criação de Calypso. E a mãe de Jack aparenta ser parte de alguma das etnias da amazônia que praticavam diminuição de cabeças. Nada é visto sob uma perspectiva cristã.

Quando o governo espanhol encontra a fonte da Juventude ele destrói a fonte da juventude por ser uma fonte pagã que não faz parte da religião católica. Quando os soldados de Port Royal discutem a reputação do bando de Barbossa, eles falam que eles receberam danação de Deus e que Barbossa foi expulso do inferno pelo diabo em pessoa. Eles não falam sobre deuses astecas, mas falam em termos cristãos, a fé da Europa. Mas nenhum pirata que aparece é cristão.

…Exceto a Angélica….

Philip era um missionário capturado pelos piratas e é visível que nenhum pirata considerava ele um igual, nem ele considera a si como um pirata. E é isso.

E Davy Jones é visivelmente pintado como um equivalente da mitologia pirata ao Diabo, que faz pactos com mortais nos quais ele fica com a alma deles, e pune as pessoas no mundo dos mortos. Mas ele não é o Diabo Cristão, ele é Davy Jones, uma mitologia a parte.

Mas esses piratas todos têm muito de sua identidade relacionada a isso. A sua conexão com o sobrenatural. Afinal Piratas tem o desejo de descobrir o mundo, e toda sua imprevisibilidade, mistério e desconhecimento. E o governo tem desejo somente de mapear tudo, pra que não exista nada mais a ser descoberto.

Vamos falar sobre isso então.

Um mundo fantástico:

Pirates of the Caribbean tem muito em comum com Indiana Jones em que são franquias de aventura em que vale tudo, e em que é sobre diversas facções procurando o mesmo tesouro como desculpa pra aventura. Cá entre nós, acho que Pirates of the Caribbean tem mais desenvolvimento de personagem, mas isso não é importante. O importante é que enquanto os dois melhores filmes do Indiana Jones são sobre itens bíblicos, como a Arca da Aliança ou o Santo Graal. E no final desses filmes o item se volta contra o nazista que não tem a devida apreciação pelo que eles significam, e o que eles significam é “não tente ficar rico e poderoso com as evidências da presença de Deus no mundo.”

Pirates of the Caribbean só usa elementos pagãos, e não realmente condena que os personagens tentem ficar ricos, e os itens não realmente se voltam contra os não-dignos. Mas tem uma vibe parecida, em que os vilões são aqueles que não respeitam o que significa ter algo assim no mundo. Como eu reforço pelos espanhóis que diante da fonte da juventude, só pensam em destruí-la, pois ela não reforça a ideia do Deus Católico existindo.

Mas os piratas que dominam esses itens, eles são fascinados pelo mundo. É um mundo que não pode ser enquadrado, e por isso é somente nesse mundo que eles podem ser livres.

Em um momento do passado, pelo lore apresentado pelo terceiro filme, os 9 Lordes Piratas já lutaram contra o mundo, eles aprisionaram a Deusa Calipso sob o pedido de Davy Jones e permitiram que ela fosse presa a uma forma humana com seus poderes limitados. E isso acalmou o mar, pois a fúria do mar eram a fúria da Deusa Calipso. Sem ela, águas mais calmas e navegáveis.

Quando as águas ficaram navegáveis, abriu-se o espaço que a Inglaterra precisava pra dominar os mares. A Companhia das Índias Orientais prosperou na calmaria, se expandiu pelas rotas de comércio, colonizou e mapeou o mundo.

O Lorde Beckett representa a indiferença completa a esse mundo, ele consegue o coração de Davy Jones e assim, ele obriga Davy Jones a fazer seu trabalho sujo. Davy Jones controlava o Kraken. Isso significa que Beckett passou a controlar o Kraken? Que nada. Beckett mandou Jones matar o Kraken assim que assumiu controle sobre ele.

E depois foi pessoalmente se gabar pra Jones que agora “O imaterial se tornou imaterial”, e que o mundo de magia que Jones representava ia virar uma burocracia desconectada da fantasia.

Enfim, eu enfatizei aqui o paganismo por trás de toda a fantasia de Pirates of the Caribbean, em como nenhum dos itens mágicos faz alusão a Jesus Cristo, ao Velho Testamento ou a Bíblia, mas eu quero reforçar que isso não vem necessariamente de um lugar de respeito a outras culturas e de abrir a mente do expectador.

Vem da visão de Hollywood de sempre. Digo, Jack Sparrow passa uma parte considerável do segundo filme fugindo de canibais que o confundiram com um Deus. Esses filmes não são feitos em uma mentalidade que tenta questionar o tom colonialista em um filme de aventura.

A religião vudu é literalmente sobre por fogo em bonequinho de pano pra fazer a outra pessoa pegar fogo também. É o pacote de sempre.

Mas o filme, vendo esses elementos com o ar de anormalidade, e sem o interesse em fazer a devida pesquisa sobre o que esses povos são de verdade, ainda posiciona eles como uma alternativa preferível a visão quadrada tradicional apresentada pelo governo.

O governo é cego pra tudo o que quebra a lógica do Rei e a lógica religiosa estabelecida na Europa, e esses elementos não tem que estar na roupagem mais politicamente correta pra essa cegueira não ser um problema.

Por isso que eu gosto da subtrama do missionário do quarto filme. Em que ele apesar de não trair sua fé em nenhum momento, diante do fato de que o sobrenatural não era abominável aos seus lados, em privado, questiona os dogmas em que ele aprendeu. E em contraste aos espanhóis que desprezam a fonte da juventude, ele aceita as sereias como criaturas de Deus.

No final o missionário beija a sereia e é levado para o fundo do mar, o sobrenatural se mostrou atraente demais pra ele e jamais vimos, que a sereia o levou pra salvação ou pra morte, presumimos que pra salvação, a Syrena foi escrita pra que confiemos nela e em sua bondade, mas acho legal que ele só foi levado pro mistério, pra um território além do alcance da igreja.

E a cena do Norrington com a bússola de Jack na mão incapaz de ver seu valor, por ela não apontar o norte fica na minha cabeça. É a arrogância completa, de quem sente que tem todas as respostas e não tem a cabeça aberta pro que pode aprender. Uma mentalidade que piratas não tem.

E perder essa mentalidade ajuda pessoas mais inclinadas ao lado da lei a se inclinarem ao lado dos piratas. Como foi o caso do missionário, como é o caso de Will Turner.

Mas vamos falar do governo.

A Inglaterra e o Capitalismo:

Na forma dos guardas de Port Royal no primeiro filme, da Companhia das Indias Orientais no segundo e no terceiro filme e do Rei George II financiando a expedição de Barbossa no quarto filme, a Inglaterra se mostrou como uma presença antagonista grande ao longo da franquia, só ausente no quinto filme, que é o pior de todos.

E nesses quatro filmes a Inglaterra é marcada como alguém que está consistentemente tentando provar a sua autoridade em grupos que não acreditam nessa autoridade.

Tudo e todos parecem estar sempre querendo questionar a ideia de que é a Inglaterra quem deve tomar as decisões e eles raramente tomam.

No primeiro e no quarto filme Norrington e o Rei George, respectivamente, são alvos fáceis, pra que a gente ria do quão fácil é passar a perna nesses manés. Nas no segundo e no terceiro filme, Lorde Beckett é um vilão notável e intimidador, pois ele representa o que a inglaterra tem de mais assustador, não títulos políticos, mas o capitalismo.

Eu acho fascinante que na maioria das histórias em que piratas são heróis, temos alguma forma de força da lei servindo de antagonista, mas só em Pirates of the Caribbean, essa força antagonista vem na forma de um representante do comércio, e não como um representante de uma instituição militar.

Como sabemos, durante a era das navegações, começou-se um período de transição de poder na Europa, que graças a colonização se tornou problema do mundo todo, em que o poder da aristocracia, e dos títulos que os nobres possuíam passou a gradativamente perder valor perante o acumulo de capital. E os comerciantes passaram a possuir o real poder na sociedade. O que resultou na transição do feudalismo para o capitalismo com o mercantilismo durante essa época fazendo a transição entre as duas fases.

Lorde Beckett representa essa transição. Ele é alguém de nascimento não nobre que foi elevado ao status de nobreza e ganhou o título de Lorde do Rei George II, quando se tornou o líder da Companhia das Índias Orientais e se tornou uma figura relevante demais em uma empresa relevante demais, para ser excluído da aristocracia.

Um título que ele lembra os demais que vem antes do nome com o mesmo entusiasmo que o Capítão Jack Sparrow lembra a todos que ele é um capitão.

Lorde Beckett marca essa transição também, quando ele mata o pai de Elizabeth, que não representa o comércio, mas a elite nobre governando terras cedidas pelo rei, e tentou se opor a como Beckett impunha sua vontade. A nobreza que não priorizasse o fluir do comércio ia ser morta como um vestígio do passado tanto quanto o Kraken.

Para Beckett um mundo sob o controle do comércio era o futuro e qualquer outra forma de ver o mundo era o passado. E existe uma dose curiosa de ironia em como muito daquilo que Beckett combatia soam como coisas que o discurso do capitalismo mente que ele incentiva e estimula.

Como sonhos, espírito aventureiro e desejo pelo desconhecido. Pessoas querendo explorar o mundo fora do mapeado estão desinteressadas em como consumir dentro do que está controlado. E piratas atrapalhavam ele não por roubar seus navios, mas por vender a ideia de que existe um mundo fascinante fora do alcance daquilo que pode ser comprado, e que existe fora das fronteiras do que está dominado pelo ser humano.

É notável também que os piratas, embora gostem de tesouro, de riquezas e de ganância, não possuem neles o hábito do acúmulo de bens.

Norrington confiscando TODOS os pertences do Capitão Jack Sparrow.

O Capitão Jack Sparrow tem canonicamente 5 posses em seu nome, incluindo o Pérola Negra que ele perde em literalmente todo filme. Ele tem um chapéu, uma pistola, uma espada, uma bússola e o Pérola Negra, isso junto resume a tudo o que Jack possui, e ele não tem o desejo de possuir nada além disso. Ele quer “pegar emprestado” algumas coisas, com o objetivo de usar, e as vezes até sem o objetivo de se dar ao trabalho de devolver, mas jamais com o objetivo de ficar com o item roubado.

O dinheiro pra Jack não é visto como a oportunidade de comprar uma casa, comprar terras, comprar seu perdão com a coroa, comprar títulos, ou nem mesmo comprar uma boa roupa. Para Jack o dinheiro serve pra ele comprar rum, água, comida, pão, frutas, bolo e a companhia de mulheres. Tudo isso são coisas que acabam. Pra Jack o dinheiro é um meio de saciar o seu prazer até o dinheiro acabar, e quando acaba ele rouba mais pra saciar mais prazer.

A mesma lógica é empregada por Barbossa, que prioriza prazer acima de tudo. Quando ele vê que com a maldição do ouro asteca, ele não é mais capaz de beber, de comer ou de transar, todo o dinheiro acumulado se tornou o retrato da infelicidade dele, pois era dinheiro que não era capaz de ser gasto. Não tem nada que Barbossa fosse usar uma fortuna que não posse comida, bebida ou sexo, e diante disso, a pilha de ouro da Isla de Muete se tornou não um sinal de que ele era rico, mas um desperdício, um lembrete de que ele não possuía nada com valor.

Para os piratas o verdadeiro tesouro era algo que não podia ser comprado. E um mundo completamente controlado, era um mundo com menos e menos tesouros nele. Quando o Kraken morre, Jack Sparrow olha pra criatura que o matou no passado, triste pela perda. Barbossa comenta “O mundo está mudando Jack.”e Jack responde “O mundo é o mesmo, só que agora tem menos coisa nele.”

Como você convence alguém que é verdadeiramente livre, que ele pode obter liberdade pelo consumo? Que ele precisa de navios ingleses movimentando produtos pelo mundo pra ser feliz?

Aliás, como você convence o Capitão Jack Sparrow de qualquer coisa?

O Capitão Jack Sparrow:

Como todo bom personagem, o Capitão Jack Sparrow é um homem de contradições. Ele é uma lenda viva, um dos piratas mais célebres do planeta e uma existência épica. E ao mesmo tempo ele é completamente humano, falho, e parece estar em uma perpétua batalha pra só não morrer pro azar. Sua marca registrada é que ninguém é capaz de dizer se ele planeja as coisas ou se ele só dá sorte, e é isso. Uma pessoa difícil de ler o quão no controle ele está de sua vida, mas que é famoso pelos seus feitos maiores que a vida.

Jack é o exemplo máximo do que é um pirata. Porque ele se define acima de tudo por ser pirata. Jack se importa muito com a própria imagem, mas a única imagem que ele quer preservar é a de ser pirata.

Seu jeito de andar cheios de gestos com as mãos que chamou a atenção logo de cara e o ajudou a se tornar icônico, faz ele parecer que está sempre em desequilíbrio, quando está em terra firme, como se o balançar do barco fosse essencial pra ele se sentir firme no chão. Um homem do mar.

Acho que o canal The Take acertou muito ao explicar sobre o Jack, que o segredo dele é o sentimento de que ele é um personagem que não quer nada e não pertence a lugar nenhum. Pois de fato, não existe um único rótulo, exceto “pirata”, que o Jack escute e ache que se refere a ele. Ele não se vê como um “civil” nem se vê como um súdito do rei.

Isso significa que Jack não tem um arco. Ele procura manter a própria estabilidade, o que nos quatro primeiros filmes significa: ser o capitão do Pérola Negra. Ele quer só ter o próprio navio, e quando ele perde o navio, ou é ameaçado de morte ele tenta sobreviver e continuar tendo o navio. Ele não tem um defeito pra superar, uma lição pra aprender, ou um sonho pra realizar. Ele só quer se manter no status que ele está.

Isso significa que ele costuma ser um personagem mais interessante quando ao lado de personagens que de fato tem arcos e jornadas, o que, como todo mundo sabe, não estou apontando nada novo, são Will Turner e Elizabeth Swann. Jack e Will são opostos perfeitos em que Will consegue servir como o protagonista tradicional que põe a trama pra frente abrindo um espaço pra Jack ser completamente não tradicional em sua caracterização sem atrapalhar o senso de narrativa do filme.

E Will tem um arco girando em torno de seu senso de identidade. Ele começa o filme como um ferreiro nobre, que entende o próprio lugar, não se atreve a tentar ser mais íntimo de Elizabeth que seu status, que odeia pirata, pois piratas são todos pessoas ruins, e que acredita na lei, na ética e em um código de cavalheirismo que eram absolutos. Ao longo do filme ele tem que quebrar esses códigos pra poder ir resgatar Elizabeth, e repensar sua relação com piratas. No final do filme ele expressa claramente que seu lugar é entre Norrington e Jack, um meio termo entre um oficial da lei e um criminoso. Ele declara que piratas podem ser boas pessoas. E Elizabeth declara que ela não o vê como um ferreiro e sim como um pirata.

Existe esse recurso narrativo, em que um protagonista dividido entre dois lados ter ao seu lado personagens que estão fortemente fixos em seus devidos lados servindo como exemplos pra ajudar o protagonista a achar o seu devido lugar. Coisas como o caso de Rick Blaine, dividido entre ser oportunista ou ser um herói, que está constantemente interagindo com o oportunista orgulhoso Capitão Renault e com o herói incorruptível Victor Lazlo, que ajudam a ilustrar o meio termo de Rick. No caso de Will, Jack e Norrington servem como secundários pra moldar a visão de mundo de Will.

Mas Jack não soa como um secundário, ele soa como a grande atração do filme. O filme é pra nos mostrar quem são os piratas do caribe, e o Jack é o grande pirata do filme, que no final luta contra outro pirata. Jack faz esse jogo bom e diferente em que ele é funcionalmente um coadjuvante em uma história que não é sobre ele, mas ele é a grande atração.

Um papel não muito diferente daquele que Benoit Blanc ocupa em seus filmes.

E essa comparação é legal, pois eu sinto que na pressão de se fazer uma sequência, toda a equipe ficou muito pensativa em relação a como lidar com isso, quem seria o protagonista da sequência e qual seria a divisão de plots entre Jack e Will. E o resultado foram Dead’s Men Chest e World’s End. Que são filmes que dividem o público entre dois grupos, os que acham que os filmes não tem um problema e os que acham que eles tem um problema de roteiro. E eu estou no segundo grupo. Acho que saiu muita coisa boa deles e foi uma tentativa válida, mas soam estranhos.

Soou como um experimento pra tentar entender como repetir o fenômeno do primeiro filme que passou de ano raspando. Graças aos méritos do Gore Verbinski em fazer algumas das cenas de blockbuster mais memoráveis que eu lembro, e graças à presença massiva de Davy Jones como um vilão.

Espero que algum executivo da Disney leia isso e deem o próximo filme pro Ryan Johnson fazer. 

Mas aí os filmes foram dar um arco pra Jack, e eu acho que esse arco soou estranho. No segundo filme, o Jack azeda a sua relação com Will o vendendo para Davy Jones pra comprar tempo para conseguir matar Davy Jones e se livrar de sua dívida e libertar Will. Nesse processo ele ganha a inimizade de Will que começa a trair Jack por não confiar mais nele pra não ser um bosta egoísta. Mas ao mesmo tempo parece que a relação com Will já começou azeda, pois eles pretendiam retconar que eles não acabaram o primeiro filme em bons termos.

Jack fica dividido entre o egoísmo ou seu laço com Will e Elizabeth, e ele após aparentemente abandonar todos pra morrerem pro Kraken, volta pra salvar a todos, e é morto por Elizabeth sendo punido por sua boa ação. Depois sendo resgatado só por que os demais precisavam dele, onde ele abdica do seu novo objetivo de imortalidade como capitão do Flying Dutchman, pra tornar Will imortal e permitir que ele sobrevivesse uma ferida letal, realizando seu grande ato altruísta e provando que ele não era um bosta egoísta.

Os filmes 2 e 3 tiveram que fortemente aumentar o egoísmo de Jack para criar um arco de redenção dele aprendendo a ser altruísta. Quando eu sinto que esse conflito nem precisava existir. No primeiro filme ele conhece Elizabeth ao salvar a vida dele sem ter nenhum motivo pra fazer isso, exceto mostrar que um pirata tem coragem de se salvar uma vida quando os soldados ingleses são broxas demais pra fazer algo.

Jack é amoral e pilantra, mas o primeiro filme evita fazer o egoísmo dele ser um obstáculo real pra Will e Elizabeth, e a moral do filme é que Will aprende, pelo exemplo de Jack, que piratas podem ser boas pessoas. E aí o filme precisou repensar isso pra ter história pra contar.

Não que eu ache isso um problema grande, mas ajudou os filmes a soarem desnorteado pra mim. Essa insistência em redimir Jack por sua maldade. Quando eu acho que o pilantra que está ativamente ajudando mais gente do que os ingleses me soa um ângulo melhor.

Talvez o problema fosse tentar descobrir como achar um conflito novo entre Jack e Will depois que essa história já estava concluída. E aí entra minha comparação com filmes de detetive do Benoit Blanc. Talvez fosse o caso de só achar um novo protagonista pro Jack lidar. Um novo herói pro Jack servir de guia. Afinal a grande atração da sequência é Davy Jones, não o Will.

Tem méritos no segundo e no terceiro filme, não quero cagar neles de graça. Mas acho que a pergunta “como vamos lidar com o protagonismo de Jack?” no filme, e acharam uma resposta dentre várias outras, e chegou a hora de questionarmos quais eram as outras opções.

Outra opção real era fazer o que vão fazer agora, ignorar o Jack, mostrar outros Piratas do Caribe, afinal a franquia não chama Jack Sparrow…. Mas essa ia ser a opinião menos popular, pois todo mundo queria rever o Jack na sequência.

Mas eu acho, que uma série em que a cada filme o Jack acha um novo herói pra auxiliar teria funcionado bem. Porém, conhecemos as pressões da época, todo mundo queria fazer trilogias em que os filmes 2 e 3 são filmados ao mesmo tempo e contam uma só história. Rolou com Matrix também.

Imaginar o que podia ter sido em outra tendência é chorar o leite derramado.

Quero só falar de um último ponto e já amarro os meus pensamentos.

O abominável quinto filme:

Esse texto demorou uns 10 dias a mais do que eu queria pra ficar pronto, isso foi porque tive que fazer uma prova difícil nesse tempo e porque fiquei muito doente. Mas o fato de que eu tinha que rever o quinto filme pra escrever esse texto não ajudou. Eu odeio o quinto filme. É o menos prazeroso de assistir.

Pirates of the Caribbean: Dead Men Tell no Tales, me soa como um filme que tenta negar todo o conceito por trás da franquia. É o filme em que o Jack atinge o fundo do poço, é abandonado por todos os aliados e perde sua bússola. É o filme em que não tem um único representante da Inglaterra pra criar antagonismo. E é o filme em que eles terminam destruindo todo o sobrenatural dos mares, acabando com todas as maldições do mar…. O que eu acho uma decisão estranhíssima, fazer o Capitão Jack Sparrow eliminar todas as maldições do oceano.

Qual a graça do oceano agora?

O filme também evita tocar em alguns pontos recorrentes da franquia, não temos Jack tentado pela imortalidade, como ele ficou com a perspectiva de roubar o tesouro asteca, herdar a maldição de Davy Jones ou usar a fonte da juventude. Também não é um filme em que Jack se destaca por fazer a coisa certa, quando ninguém esperava que ele fizesse, firmando seu status de boa pessoa. Essa honra dão ao Barbossa que se mata pela sua filha, fazendo esse ser o filme que tira o Barbossa da franquia.

Eu até respeito esse filme ser feito sem pensar nem um pouco na hipótese de um sexto filme. Pois a dependência que Hollywood tem de sequências está insalubre já. Mas esse filme é estranho. Ele não soa como um filme da franquia mesmo jogando e jogando personagens reconhecíveis na nossa cara. E o Jack parece que está no filme somente assim, como Johnny Depp de cosplay de si mesmo tentando ancorar um filme a franquia.

As cenas com o Jack eram a pior parte do filme, e o sentimento de que o Jack estava sendo um peso morto pro filme soou quase como uma metáfora pro Johnny Depp, já uma figura controversa quando o filme saiu, e em uma das piores atuações de sua vida, estava sendo um peso morto da franquia, se dava uma pirueta no ar pra tentar encaixar o Jack em uma história onde ele não pertencia.

Que já foi um pouco como eu me senti com o terceiro filme, com as cenas do Jack alucinando soando como tentativas de fazer o Jack pertencer a uma história que começou com ele morto e aonde ele não pertence. É bizarro que isso já tenha rolado em dois filmes. E nos dois por culpa do Jack.

Ele não é um personagem fácil de se escrever, e não é qualquer filme que melhora se ele aparecer ali correndo balançando os braços.

O que enfim me leva a tentar amarrar isso tudo.

Conclusão:

Pirates of the Caribbean era uma franquia que tinha um personagem muito fora da caixa, que não seguia padrões típicos de heróis hollywoodianos, seja no fato dele não ser heróico, seja no fato dele passar lápis no olho e ter ganhado a fama de “pirata gay”, nunca soube exatamente como reproduzir o sucesso do primeiro filme, por nunca saber exatamente o que fazer com o Capitão Jack Sparrow.

O Jack é certamente quem faz essa franquia ser carismática. Mas quando eu vejo, eu não acho ele a melhor parte da franquia. Pra mim o diferencial de Pirates of the Caribbean em relação a qualquer outra franquia de pirata contemporânea é abraçar forte o senso de aventura de desbravar o desconhecido, e fazer essa mistura do mundo sobrenatural com o mundo não enquadrado pela Europa.

E o Jack as vezes mais atrapalha do que ajuda nesse processo. Talvez se o quarto filme não fosse sobre o Jack tentando se acertar com a ex e o sogro, ele poderia ter sido de fato sobre a fonte da juventude, a raiva que os católicos tinham da fonte e sobre um missionário revendo seus valores ao se apaixonar por uma sereia, e esses elementos tivessem espaço pra serem o foco. Se o missionário fosse um protagonista puro e moral que deveria ser contrastado com um pirata maluco.

Mas eles colocaram o Jack Sparrow na atração da Disney, saqueando uma cidade, mas não colocaram nada na atração que fizesse menções as lendas do mar. E eu penso que ninguém aprecia esse lado da franquia. Davy Jones, Holandês Voador, Kraken, Fonte da Juventude, Fim do Mundo, Navio Fantasma, porra, isso aqui é ouro em histórias náuticas.

E a franquia é tão influente em como apresenta elas, que as pessoas genuinamente confundem o lore dos filmes com as lendas de fato. De seis em seis meses surge alguém nos fóruns de One Piece teorizando que um personagem vai ser meio-polvo por ter a fruta de Davy Jones. Além de pessoas que acreditam que o Davy Jones e o Holandês Voador são a mesma lenda, quando não.

Então quando eu vejo que vai sair um sexto filme sem o Jack, eu só penso, em se é um reboot em que vão resetar tudo e ignorar todos os outros filmes, ou se vão fazer um sexto filme num mundo em que o sobrenatural foi extinto pelo Jack no filme 5?

Porque dane-se o Jack na real. Eu acho que a franquia sempre teve o poder de ser maior que o Jack, se os produtores tivessem a confiança necessária, não era necessário fazer filmes sem o Jack, mas desde que apresentassem novos piratas interessantes, eles se safariam, pois a franquia é pra mostrar Piratas do Caribe, no plural. Era pra cada filme apresentar um navio e um capitão novo.

Era pros fóruns passarem o dia debatendo em qual dos 5 navios diferentes dos 5 filmes eles queriam navegar.

Eu sou um grande fã de piratas, eu gostaria de ver um filme de pirata novo por ano, e eu acho que existe uma chance de uma nova protagonista dar a guinada que a franquia podia ter dado já no segundo filme, e talvez o timing enfim esteja bom pra isso. E se for que nem os boatos dizem, e ela for uma mulher negra pirata, temos a oportunidade de por luz no fato de que muitos piratas eram escravos libertos, e figuras de resistência ao colonialismo Europeu que os escravizou em primeiro lugar.

Afinal não é como se a franquia já não tivesse mostrado que mulheres negras podem ser piratas.

O terceiro filme originalmente incluiria uma cena em que eles diriam que Jack era um ex comerciante legítimo que virou pirata quando se recusou a capitanear um navio negreiro. Então a franquia jamais tocou no tema escravidão, mas tentou no passado e só removeu essa ideia do filme. E eu acho importante, pois isso reforça a ideia da liberdade pirata como uma oposição a lógica europeia.

E o coração da parte boa desses filmes é isso.

Espero que o sexto filme seja bom, mas cá entre nós, se for ruim, mas fizerem um sétimo, então eu vou ver o sétimo e o oitavo e o nono, eu só realmente quero que Hollywood invista em filme de pirata. E mesmo eu tendo críticas a fazer a todos filmes exceto o primeiro, eu realmente gosto dessa franquia e quero que ela tome o melhor caminho possível.

Onde a presença de personagens dos outros filmes é opcional, desde que tenha o tom dos outros filmes. E o tom é aventura sobrenatural contrastando um bando de inglês quadrado que não valoriza de verdade o quão fantástico é o mundo, pois são uns colonizadores de merda.

E o que eu tinha pra falar era isso! Que as lendas dos mares e o sobrenatural não precisam do Jack Sparrow pra funcionar, desde que tenham piratas legais sendo criados por gente criativa. E vocês? Veem apelo no filme além do Jack? Já estão se saco cheio e querem que a franquia deixe de existir? Gostam de alguma das sequências? Deixem tudo isso nos comentários, que nós nos vemos no texto que vem.

Sobre o autor

Izzombie

Sou um cara chato que não consegue ver um filme sossegado sem querer interpretar tudo e ficar encontrando simbolismos e mensagens. Gosto de questionar a suposta linha que separa arte de filmes comerciais, e no meu tempo livre pesquiso sobre a história da animação.

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Alertas

  • – Todos os posts desse blog contém SPOILERS de seus respectivos assuntos, sem exceção. Leia com medo de perder toda a experiência.
  • – Todos os textos desse blog contém palavras de baixo calão, independente da obra analisada ser ou não ao público infantil. Mesmo ao analisar uma obra pra crianças a analise ainda é destinada para adultos e pode tocar e temas como sexo e violência.

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