Existem três tipos de filmes no mundo: o primeiro tipo são filmes que simplesmente não falam sobre racismo. O que é normal, os filmes não são exatamente obrigados a tocar no assunto, eles podem tocar em outros assuntos ou meramente ser filmes de puro entretenimento e não tem nada de errado nisso, não vamos cobrar de filmes algo que eles não se dispõe a fazer; O segundo tipo são filmes que falam sobre racismo, o que é muito justo, afinal racismo ainda é um assunto presente na nossa sociedade e um assunto muito sério que precisa ser conversado e trabalhado, e se o filme tem algo a dizer sobre o tema ele é muito bem-vindo; o terceiro tipo são os filmes que falam sobre o racismo fantástico, que é um meio-termo entre os dois primeiros tipos e é um caso interessante.
Filmes sobre racismo fantástico são filmes que falam de racismo, mas não daquele racismo tradicional existente na sociedade que podemos testemunhar no nosso cotidiano, como o do ódio dos brancos contra os negros, ou dos brancos contra os índios, ou dos brancos contra os árabes, ou dos brancos contra uma lista particularmente grande de não-brancos. O racismo fantástico prefere abordar o ódio dos alienígenas do planeta X contra os alienígenas do planeta Y, criando uma relação racial entre dois povos completamente fictícios.
A vantagem em fazer um filme de racismo fantástico é que você de fato corre bem menos riscos. Quando se faz um filme sobre racismo, se faz um filme que fala sobre um assunto delicado e que se não for cuidadoso ao retratar a situação corre um risco real de insultar o grupo que está tentando defender. Mas no racismo fantástico esse risco não existe, existe só a metáfora para uma noção mais ampla e geral de preconceito que pode ser aplicado a vários casos de preconceito reais, e por isso a nenhum específico, mesmo que alguns paralelos sejam bem mais fortes que outros.
E se filmes sobre racismo costumam ter como seus antagonistas centrais, geralmente algum branco racista, que está focando seu ódio particularmente no personagem central do filme (ou no personagem que o personagem central do filme quer defender, caso seja um filme de white saviour), os filmes de racismo fantástico vão um passo além, como o racismo fantástico é uma metáfora para o conceito de racismo e de preconceito no geral, não é incomum o antagonista do filme ser um alienígena do planeta Y que cansou de sofrer preconceito e resolveu descontar nos alienígenas do planeta X e se tornou “exatamente igual ao outro lado.”
Além de que com filmes de racismo fantástico não existe nenhuma cobrança de realmente escalar atores que façam parte de alguma minoria étnica no seu elenco, podendo dar o foco aos atores brancos nos quais os produtores de Hollywood tem muito mais fé de que vão trazer lucro. Não dá para colocar um branco para interpretar um negro sofrendo preconceito em um filme – embora isso em si tenha sido uma conquista do movimento negro, porque infelizmente blackface existiu – mas dá para colocar um branco interpretando um alienígena do planeta Y, são alienígenas, eles podem ser de qualquer cor, então por que não ser todos brancos e pode falar sobre racismo e mandar um foda-se pros atores negros ao mesmo tempo? E assim é Hollywood.
A conclusão disso tudo é que o racismo fantástico permite que você pegue a Jenniffer Lawrence, nos convença de que ela sofre de racismo diariamente por ser parte dessa minoria étnica e de que ela tem inseguranças por não ser um padrão de beleza na sociedade, e que ela agora tem que impedir o Michael Fassbender que faz parte da mesma minoria étnica que ela, a não cometer racismo reverso, pois racismo reverso não conquista nada e é essa a moral do filme. E então você sai com o rótulo de “uma metáfora inteligente de como o racismo é na sociedade.”.
Sarcasmo a parte eu gosto muito de X-Men, em particular dos filmes recentes, embora eu não tenha achado o X-Men: Apocalypse grandes coisas, X-Men: Days of Future Past é muito bom. E também acho que quando fazemos obras de fantasia, o racismo fantástico ajuda a dar mais verossimilhança nesse novo mundo, além de criar escalas de cinza na moralidade desse mundo em vez de dividi-lo em preto e branco. Por mim podem fazer mais vinte filmes do estilo, mas acho importante diferenciá-los de filmes que realmente estão falando sobre racismo e notar que a metáfora desses filmes raramente sabe do que está falando.
Enfim, mas apesar do timing estar bom para isso, eu não vim falar tudo isso para falar sobre X-Men, ao invés disso, eu quero falar sobre o filme mais recente de um dos estúdios com maior histórico racista de todo o cinema estadunidense, que veio escancaradamente com o propósito de ser uma grande metáfora e paralelo para os preconceitos na nossa sociedade: o 55º longa-metragem da Disney, Zootopia.
Sim, pois depois de uma existência inteira sendo notavelmente racista, lá nos anos 90 a Disney começou a se preocupar com a própria imagem e a investir em quebrar essa imagem que ela tem. Em 1992 tivemos a primeira princesa/protagonista feminina não-branca da história do estúdio na Jasmine. Em 1996 tivemos a cigana Esmeralda sendo o mais próximo que tínhamos de uma protagonista negra até The Princess and the Frog estrear em 2008.
E essas eram as tentativas da Disney de tentar melhorar a própria imagem. De tempos em tempos criar uma princesa que não seja branca, e nunca mencionar a existência de Song of the South, exceto na hora de vender sua trilha sonora, pois aí foda-se se é um filme racista de exibição proibida, a trilha sonora dele ainda dá lucro. Isso é literalmente tudo que a Disney fez em sua tentativa de ofuscar seu passado racista. Aí de repente em pleno 2016 eles nos lançam um filme onde racismo era visivelmente o pilar central do filme e nossa atenção foi chamada.
O filme se passa em um mundo sem humanos, onde os animais depois de um longo período de tempo vivendo nas leis da selva, atingiram a racionalidade e começaram a viver em sociedade, todas as espécies de mamíferos juntas, deixando os instintos e crueldade da natureza de lado para formar uma sociedade decente. Então esse mundo que antes se dividia no constante ataque dos predadores cruéis nas frágeis presas (e é esse o recorte que o filme faz), agora permite que predadores e presas trabalhem juntos e vivam juntos em igualdade e sem ligar para esse passado cruel.
E a capital dessa sociedade igualitária que os animais antropomórficos criaram é Zootopia, uma cidade cujo lema é: “Em Zootopia todo mundo pode ser o que quiser.” ou seja, os animais não precisam se prender as suas espécies, em Zootopia eles podem se libertar de qualquer pressão que façam a suas espécies e realizar seu sonho.
E nisso temos nossa protagonista, uma coelha chamada Judy Hopps, o sonho dela é ser uma policial. O problema? Bem, coelhos não viram policiais. E logo na infância os pais de Judy tem que explicar pra ela que apesar desse discussão bonito de que qualquer um pode ser qualquer coisa, na prática, nunca um coelho conseguiu ser um policial, coelhos crescem e viram fazendeiros, e é esse o espaço na sociedade aos quais eles devem ficar.
Judy se nega a aceitar isso, e em um episódio na infância ela resolve proteger seus colegas ovelhas do bully do colégio, uma raposa chamada Gideon Grey, e o resultado é que Gideon derrotou Judy na força bruta, fez um corte no rosto dela com suas garras e disse a ela umas verdades crueis. “Cuidado, eu sou uma raposa, e como você disse na sua peça imbecil, nós os predadores costumávamos comer vocês presas. E esse instinto assassino ainda está no nosso DNA. Está assustada? Então chore, eu quero que você lembre desse momento sempre que achar que você pode ser qualquer coisa além de uma coelha fazendeira idiota.”
Pesado, mas Judy não desiste. Ela se torna uma adulta e entra na academia de polícia esperando se formar. A academia consistia de vários campos de treinamentos inspirados nas várias regiões de Zootopia. A instrutora era uma Urso Polar e seus colegas de Academia eram tigres, elefantes, hipopótamos, rinocerontes, e todas as provas eram provas físicas pesadas para ver quem era o mais apto fisicamente, e bem, eu não preciso dizer se a Judy foi bem ou não.
Era bem obvio que tudo ali foi feito pensando em animais grandes e fortes e não em coelhos. E ninguém dá o menor apoio pra Judy para incentivá-la, pois todos sabem que coelhos não servem pra policiais. Nesse momento quero chamar a atenção pra cena do banheiro onde Judy se depara com uma privada muito maior que ela, sem nenhuma adaptação ou opção de privada menor para quando um animal pequeno tentar sentar, e por isso ela cai dentro da privada.
Eu chamo a atenção para a falta de adaptação do banheiro para um animal pequeno, pois a maioria dos serviços no mundo de Zootopia é muito adaptado para levar em conta o uso por animais de diversos tamanhos. É muito claro o quanto Judy não é bem-vinda na academia de polícia.
Ninguém apoiou ela, ninguém incentivou ela, ninguém acreditou nela, mas ainda sim, Judy compensa toda sua falta de força com inteligência e domina todas as pistas de treinamento para a surpresa da sua instrutora. Tal como Mulan fez antes dela, ela supera o seu status de pior da turma e se forma como a melhor da turma e se torna a primeira coelha na polícia, um evento tão surpreendente que o prefeito foi pessoalmente discursar.
Sim, o prefeito, é claro, não perdeu tempo em vir anunciar como sua Iniciativa de Inclusão de Mamíferos estava dando resultado e em parabenizar Judy por ser a primeira coelha na história da polícia. E aqui eu quero falar uma coisa. Absolutamente todos os animais do filme são mamíferos. Não temos cobras, aves, lagartos, peixes nem sapos vivendo em Zootopia, aparentemente só os mamíferos sofreram dessa evolução à vida em sociedade. Então que caralhos é uma Iniciativa de Inclusão de Mamíferos? É tipo a gente lançar uma cota para seres humanos na faculdade? Eu realmente fiquei confuso com isso no filme, que porra é esse plano do prefeito? Mas enfim, vamos fingir que realmente o governo fez algum plano de inclusão que permitiu a entrada da Judy e não que ela deve que ralar pra cacete para ser a única a conseguir algo e entrar em um território onde ela obviamente não era bem-vinda, e onde ainda não é bem-aceita.
O prefeito é um leão, um grande predador e o rei das selvas. Ele pede para sua vice-prefeita, uma ovelhinha que só foi colocada na chapa para conseguir voto das presas, dar o distintivo de Judy, e essa ovelhinha, chamada Bellwether, comenta com Judy como a vitória dela é uma vitória simbólica pra todo mundo que está por baixo.
Ao se despedir dos pais, o pai de Judy a lembra de como ela tem que tomar cuidado com os predadores, em especial as raposas, lembrando-a de Gideon Grey, e dá para ela um repelente de raposas, só por precaução. E damn, a sociedade realmente mente que ela chegou a um ponto de igualdade quando o conceito de “repelente de raposa” existe no formato de um spray de pimenta?
E chega o primeiro dia de trabalho de Judy, ela hesita, mas resolve levar o spray-anti-raposa com ela no primeiro dia de trabalho, e chegando no departamento de polícia temos essa cena, em que o recepcionista, um jaguar chamado Clawhauser chama Judy de “fofa” e ela dá uma leve advertência de que só é de boa chamar um coelho de fofo quando é outro coelho chamando, mas que outros animais, pega mal. Clawhauser se desculpa pela gafe e se revela como o cara mais simpático do mundo, fã de rosquinhas, e de ficar de boa na recepção vendo vídeos de divas pop na internet.
Enfim, chega na sala com os demais policiais, ela senta em uma cadeira obviamente grande demais pra ela, e tenta socializar com seus colegas que só encaram ela com desprezo.
Entra então na sala o Chefe Bogo, o chefe do departamento, um búfalo e interpretado por um dos dois únicos negros em todo elenco, Idris Elba. Ele avisa pra todos que eles tem novos colegas que não vão ser apresentados, pois ele não se importa, e fala que o que importa é que tem esses casos de desaparecimento, 14 predadores desaparecidos, variando do grande urso polar a pequenina lontra. Ele dá a todos os policiais na sala um trabalho investigado a esses desaparecimentos, exceto Judy, a coelhinha vai dar multas de trânsito.
Ela tenta negociar com o Chefe Bogo dizendo que ela foi a melhor da classe dela e é capaz de lidar com um caso de desaparecimento, e Bogo responde que ele tá pouco se fodendo. Vendo que não vai negociar qual será sua tarefa, Judy decide que ela vai ser uma excelente guarda de trânsito. Cem multas por dia? Há! Ela vai dar duzentas antes do meio dia. E o melhor de tudo, ela dá mesmo.
Tendo dobrado sua meta na metade do seu turno, ela vê uma raposa andando na rua. E pensa “muito suspeito, vamos investigar isso aí”, pois como todos sabemos, raposas não prestam. A raposa estava entrando em uma sorveteria especial para animais grandes como elefantes e hipopótamos. Ela entra pronta para descobrir que merda a raposa estava aprontando e o que aconteceu vai te surpreender.
O elefante balconista estava tratando a raposa mal. O pobre rapaz só queria comprar um picolé gigante pro filho. Judy fica até culpada por ter cogitado que a raposa queria fazer algo ruim só por ser raposa. Então o elefante tenta expulsar a raposa com a frase “o que foi? Não tem sorveteria de raposa na sua parte da cidade?” e Judy fica puta. A raposa tenta explicar que seu filho gosta de tudo que é de elefante, e que é aniversário dele.
Mas o elefante só responde com “olha, sei que muita raposa não sabe ler, mas temos uma placa que dizendo que nos reservamos ao direito de recusar serviço.” Judy então intervêem, aponta algumas violações a serviços sanitários que a sorveteria comete e chantageia a sorveteria com uma multa a menos que eles vendam picolé de elefante pra esse pobre pai. E para completar é Judy quem paga pelo sorvete.
Ela se despede da raposa que se apresenta como Nick Wilde, e sai saltitando feliz por ter cometido uma boa ação. Mas depois ela reencontra Nick, derretendo o picolé grandão para fazer vários picolezinhos e vendê-los pros hamsters comerem depois do trabalho. Após isso ele vende o palito do picolé pros ratos que trabalham na construção.
Judy fica puta de ter sido feita de trouxa, e tenta prender Nick pelo seu golpe, mas descobre que tudo que o golpista fez foi dentro dos limites da lei, a qual ele estudou muito bem para aplicar seu jeitinho. No processo Nick a chama de Cenouras pejorativamente, e quando ela se ofende ele responde que só presumiu que ela era uma fazendeira que veio pra Zootopia cheia de otimismo para ter seus sonhos esmagados pela realidade.
E no processo, para ilustrar o argumento de Nick um rinoceronte quase pisa em Judy por estar distraído. Vamos nos lembrar desse rinoceronte, ele é importante.
Um primeiro dia de trabalho frustrante. Mas será que o segundo será pior? Certamente, ela tem que ouvir todo mundo reclamar das multas com argumentos de “meus impostos pagam seu salário”, e “minha mãe diz que você tinha que morrer”, mas hey, ela testemunhou um assalto, é a chance dela de prender o ladrão e se provar uma policial, certo? Ah, quem me dera, ela termina em um confronto físico com o ladrão em Little Rodentia, o bairro dos hamsters e outros roedores pequenos, se esforça muito para evitar a destruição de todo o bairro por ser muito maior que todos eles, isso causa pânico, é marcado como má conduta policial, sobra pro Bogo, o Bogo fica puto e sobra pra Judy.
E ele descasca a coelha. “Senhor eu não quero ser guarda de trânsito.” “Você acha que alguém perguntou o que eu queria quando te colocaram sob minha guarda?”, ele não quer Judy na força e deixa isso muito claro. Porém tem essa senhora lontra cujo marido é um dos 14 desaparecidos, mas não tem ninguém fazendo nada para encontrar o marido dela. Judy na cara do Chefe Bogo fala que ela vai cuidar do caso, e a vice-prefeita vê isso e quer divulgar isso como uma vitória da Iniciativa de Inclusão de Mamíferos (como se toda a corporação policial não fosse composta por mamíferos), e Bogo que estava com o dedo coçando pra demitir Judy agora não pode, pois mídia e simbolismo. Mas ele não perde a chance de ser um escroto, ele dá 48h para ela solucionar o desaparecimento e que se ela não solucionar nesse tempo ela é demitida.
Mas olha a sorte da Judy, o desaparecido Sr. Otterton, foi visto pela ultima vez comprando picolés de Nick Wilde, olha só. Quais as chances? A única pessoa na cidade que ela conhece é relacionada ao crime. Ela rastreia Nick, e chantageia ele em ajudá-la com o caso sob a ameaça de denunciá-lo por uma sonegação de imposto e pronto, agora Nick tem que ajudar Judy, pois do contrário ninguém irá.
E graças a Nick, ela consegue descobrir em que Otterton estava sendo levado em uma limousine até a região gelada de Zootopia, as tundras. Claro que Nick fez isso em ambientes que deixam Judy o mais desconfortável possível com quem a está atendendo, para provocar o idealismo dela.
Bom, a limousine pertencia a Mr. Big, o maior criminoso de toda Tundratown, ele é um musaranho muito pequeno, mas hey, sua espécie é marcada como um dos carnívoros mais cruéis, então não é para ser subestimado. Mr. Big é uma grande homenagem ao Don Corleone que ao descobrir os dois fuçando em seus assuntos, e por ter uma briga antiga com Nick, tenta matá-los, mas por sorte era o casamento da filha de Mr. Big, e a filha dele foi uma das roedoras protegidas por Judy no conflito em Little Rodentia, e é grata à Judy, então Mr. Big colabora. Ele fala que ele tinha assuntos para tratar com Otterton, e mandou uma limousine buscá-lo, mas no trajeto, Otterton enlouqueceu, ficou selvagem, violento e atacou o motorista e fugiu.
Mr. Big indica a localização do motorista da Limousine que foi atacado, uma pantera chamada Manchas. Otterton atacou Manchas e ficou gritando sobre os “Uivadores”, Judy e Nick falam que querem interrogar Manchas sobre os uivadores, mas então Manchas fica louco, começa a correr sobre quatro patas feito um animal e começa a perseguir Judy e Nick.
Judy chama reforços e consegue algemar Manchas no local. Mas quando os reforços chegam, Manchas havia fugido. Judy conta o que aconteceu e Bogo não acredita. “Talvez todos os predadores pareçam selvagens e assustadores aos olhos de uma coelhinha.”, Judy diz que Nick viu tudo e pode confirmar, mas Bogo diz que não vai acreditar na palavra de uma raposa, ele diz que eles fizeram um trato e ela não solucionou o caso, então ele pede que ela cumpra sua parte do trato na frente de todos. E é agora que Nick intervêm e aponta todos os distratos que Bogo está cometendo na cara dele.
Nick não tratou Judy com respeito em nenhum momento o filme inteiro, mas nessa hora, ele faz questão de chamá-la de “Policial Hopps” na frente de Bogo e seus colegas, em contraste com o apelido “Cenouras” que ele ainda usa com ela normalmente.
Eles se afastam dos demais policiais e Nick explica pra Judy, que ela não pode deixar eles verem que ela se magoou. Ele conta pra Judy sobre como ele sabe o que é esse tipo de rejeição. Quando ele era criança, ele queria ser um escoteiro, mesmo sabendo que tradicionalmente, predadores não viram escoteiros. Pois bem, na cerimônia de iniciação, um dos seus coleguinhas fala que o juramento dele não vale, pois não dá pra confiar em uma raposa mentirosa, e então todos os escoteiros fazem uma rodinha em Nick, dão umas porradas na raposa e colocam uma focinheira nele, pois raposas não deviam poder andar por aí sem focinheira.
Nick ficou traumatizado, mas aprendeu duas coisas. A primeira é que esse pessoal nunca pode ver o quanto eles estão magoando Nick, e a segunda é que se ninguém nunca iria vê-lo como algo além de uma raposa mentirosa e enganadora, então que não fazia sentido ser qualquer outra coisa além disso, e foi assim que ele virou um golpista.
Ele certamente se viu na coelhinha tendo o dedo apontado por um búfalo enorme falando sobre como ela não pertence à polícia, e sentiu empatia, por isso ele mudou sua postura em relação a Judy, e agora quer ajudá-la de verdade, não na má vontade. Ele sugere que Judy cheque as câmeras de trânsito da região para descobrir para onde Manchas fugiu, e Judy pede a ajuda de Bellwether e a ovelhinha usa seus poderes de vice-prefeita para ajudar a dupla, feliz por finalmente poder fazer algo importante além de ser secretária do prefeito e ser humilhada por ele, inclusive ela tem meio que abandonar checagem nas câmeras no meio para ir ouvir o prefeito gritar com ela.
Mas não sem antes uma cena de Nick pegando na lã dela sem permissão e Judy dando uma bronca, sobre com nunca se deve pegar na lã de uma ovelha sem permissão.
Enfim, Nick e Judy vêem que Manchas foi levado por dois lobos após ficar selvagem e louco, e presumem que quando o mesmo ocorreu com o Senhor Otterton, a mesma coisa aconteceu e que os lobos eram os “uivadores” do qual os dois tinham medo.
A dupla chega no prédio para onde Manchas foi levado e é um hospital. Eles invadem esse hospital, e encontram 15 predadores em celas, todos selvagens, andando sobre quatro patas, rugindo e irracionais. Entre esses 14 está o Sr. Ottleton.
E quem está operando essas prisões é o prefeito. O doutor cuidando dos casos não sabe dizer a origem do surto selvagem, e acha que tem alguma coisa a ver com os intintos de predador dos animais, já que todos são predadores, e o prefeito, sendo um leão, não gosta dessa teoria, pois ele não pode dizer isso ao público, faria todos perderem a fé nos predadores e nele. Bingo! Uma confissão Judy filma tudo, chama seus colegas, leva o crédito por ter solucionado todos os casos de desaparecimento e se prova para Bogo. Que maravilha, né? Tudo se resolveu.
É, mas ainda tem o terceiro ato, então muita coisa ainda vai acontecer. Judy dá uma coletiva de imprensa sobre o caso, nessa coletiva, os reporteres pressionam Judy a explicar porque predadores estão entrando no modo selvagem, e a coelha teoriza que tem relação à sua biologia e ao fato de que no passado eles caçavam presas e podem estar revertendo ao uso de seus instintos.
Essa declaração magoa Nick, que momentos antes tinha sido convidado por Judy a entrar na polícia e virar parceiro oficial dela, mas agora ele percebe que ele é um predador e ela nunca vai confiar nele. Ele vê a foto de todos os 14 desaparecidos usando focinheiras e lembra da que forçaram ele a usar na infância. Judy tenta se explicar pra Nick com argumentos como “você não é que nem eles.” e Nick fica puto com o uso da palavra “eles” e aponta pro fato de que Judy passou todo o tempo que esteve ao lado deles com o spray-anti-raposa ao alcance de suas mãos. Ele desiste de ser parceiro de Judy e vai embora puto.
E não é só entre Nick e Judy. A informação sai na mídia e predadores ao redor de toda Zootopia estão sendo segregados com medo de que eles fiquem selvagens, e o pior, alguns estão ficando. A cidade está em crise graças a isso. Protestos de “orgulho predador” surgiram pedindo pela recuperação do espaço que eles estão perdendo com o medo de novos ataques.
No trabalho Judy notou que Clawhusser foi transferido para uma nova área, pois não querem que um predador seja a primeira pessoa vista por quem entrar no departamento de polícia. E Bellwether que agora é prefeita marca uma reunião com Judy.
Bellwether e Bogo tem essa estratégia de transformar Judy na garota-propaganda do departamento de polícia, uma vez que ela é vista como uma heroína pelas presas, e 90% da população da cidade é composta por presas. Ela não aceita a honra, pois não vê como uma, ela acha que a cidade está dividida em um conflito sério entre predadores e presas e que a culpa é dela, por isso ela se demite.
E volta pra casa e vira uma fazendeira de cenouras, como todos acharam que ela seria em primeiro lugar. Lá ela reencontra Gideon Grey, que agora é um grande parceiro comercial de seus pais. Gideon se desculpa pra Judy por ser um grande escroto e garante que amadureceu e se tornou uma pessoa decente, e os pais de Judy afirmam que só cogitaram fazer amizade com Gideon, pois o discurso de Judy abriu a cabeça deles. Ela percebe que seu discurso de igualdade fez a diferença naquela comunidade do interior.
Ela também descobre uma planta que Gideon chama de “uivadora” que se os coelhos chegam perto, faz os coelhos ficarem selvagens, e percebe que essa planta é a “uivadora” da qual Otterton e Manchas falavam. E que ela pode afetar uma presa da mesma maneira que afeta um predador. Com essa informação, ela decide voltar pra Zootopia.
Mas ela não vai conseguir resolver esse caso sozinha, então ela vai pedir a ajuda de seu parceiro. Ela encontra Nick e implora pelo seu perdão. Ela fala do quanto foi mente-fechada e idiota, mas que ela precisa da ajuda deles para resolver isso e poder proteger os demais predadores. Nick perdoa a Cenouras, e eles se unem pra resolver a situação.
Bom, Judy percebe que o roubo que ela impediu em seu segundo dia era justamente de um saco de “uivadoras” e Nick, por acaso, conhecia o ladrão, eles abordam ele, e com a ajuda dos capangas de Mr. Big, convencem ele a falar para quem ele ia dar as uivadoras. Um carneiro chamado Doug.
Com a informação de onde encontrar Doug, a dupla vai até o local, onde ele aparentemente cultiva as uivadoras.
Eu tenho uma ligeira dúvida, se essa planta pode fazer qualquer animal ficar selvagem, como é possível que essa planta é cultivada em fazendas, comercializada em lojas, e mesmo assim ninguém sabe a respeito disso? Soa meio idiota, convenceria melhor se fosse uma droga desenvolvida em segredo por Doug, até deram pra ele todo o aparato de químico, mas quem sou eu, não é mesmo?
Doug trabalha em um vagão de metrô abandonado, e é ele quem atira balas de uivadora em predadores marcados como alvo com o objetivo de torná-los selvagens. E Judy e Nick, os dois vêm ele falando sobre isso ao telefone.
Ela chuta Doug pra fora do laboratório e decide que precisa levar a prova pro departamento de polícia, então ela reativa o vagão de metrô e dirige ele até o departamento de polícia.
E enquanto eles dirigem eles brigam com Doug e outros carneiros que estão tentando impedí-los. Cena de ação badass, digna do primeiro filme policial da Disney. E bem, eles chutam os carneiros pra fora do trem, mas ele bate numa parede e o trem explode com 99% das provas dentro. Exceto a pistola de uivadora de Doug que Nick roubou.
Nisso eles estavam na altura do museu de história natural de Zootopia, eles sobem a escada do metrô, entram no museu e agora devem ir do museu pro departamento de polícia com a prova, mas no caminho eles encontram, a prefeita Bellwether. Que Judy percebe finalmente, é a grande mandante dos ataques aos predadores. Com dois policiais obedecendo ela, ela persegue Judy para roubar as provas, e ela foge, mas machuca a perna e não consegue mais correr.
Encurralada, ela pede que Nick leve as provas para o departamento de polícia, mas Nick não vai abandonar a amiga. Ele tenta carregá-la, mas os dois caem em um poço e agora estão encurralados. Bellwether então resolve executar Judy de uma maneira irônica, ela dispara a bala de uivadora contra Nick para que a raposa mate Judy. Como seria simbólico na mídia, a policial heroína morta por uma raposa selvagem. Agora como a boa vilã que Bellwether é, é hora de confessar seu plano para a heroína que não tem como se salvar.
Exceto, que prevendo isso, Nick havia trocado as balas da pistola por blueberries e guardado as balas de uivadora. E agora Judy aproveitou pra gravar a confissão de Bellwether. E com isso ela vai presa e Judy é readmitida no departamento de polícia. Ah, e agora que eles sabem que a uivadora existe, eles pesquisaram e criaram uma cura.
Sério, imagina se a gente descobrisse hoje, que todo mundo que come pimentão vira um psicopata? Quais as chances de ter demorado até hoje pra essa descoberta ser feita?
E Judy aprendeu uma lição. A igualdade não existe ainda e relações raciais são complicadas e é difícil pra todo mundo. Mas se todo mundo tiver empatia e lembrarmos que somos todos animais, cada vez vamos chegar mais perto de um mundo melhor.
Ah, e a polícia recebe seu primeiro oficial raposa, Nick Wilde. Que pode dividir uma cadeira com Judy, de tanto que ela é maior que os dois. E agora uma vida como parceiros na polícia aguarda os dois.
E fim do filme!
Enfim, vamos lá, o filme tenta nos fazer uma metáfora sobre racismo nos mostrando esses dois grandes grupos raciais de presas e predadores e seus conflitos. Certo? Não. E isso me deixa encucado com o filme desde que eu ainda estava no cinema vendo os créditos subirem.
O pessoal que era racista contra Judy não eram predadores. Os policiais eram em sua maioria presas. Búfalos são presas. Rinocerontes são presas. Elefantes são presas. E eles não sofriam do racismo que Judy sofria. Só tem dois momentos no filme em que um predador é racista com Judy, quando Gideon Grey faz um discurso claro de racismo contra ela, esse momento inclusive é o mais explicitamente racista do filme. E o segundo é quando Nick trata ela com desrespeito nas duas primeiras vezes que eles interagem. Não tem terceiro momento.
Não tem um preconceito contra presas. Presas é um grupo que compõe 90% da sociedade e se divide em um número grande de espécies, dessas espécies a única que vimos sofrer preconceito foi a dos coelhos.
Coelhos nessa sociedade são estereotipados como sendo pouco inteligentes, inaptos fisicamente, fofos, e designados a trabalhos no campo e não com nada que exija força física. Isso é ruim e permitiu que ela sofresse muitos maus tratos. Agora vamos ver a situação de Nick:
Raposas no filme são estereotipadas como desonestas, mentirosas, criminosas, são atacadas e colocam focinheiras nelas a força e é de boa você comprar numa loja uma série de armas especializadas em atacar raposas para uma suposta auto-defesa. Além de que pela reação da própria Judy, ser uma raposa e andar na rua já pode ser categorizado como “atitude suspeita.” pela polícia. E tanto raposas quanto coelhos nunca integraram a força policial até os protagonistas do filme mudarem isso.
Pois bem, além do tratamento dado a raposas ser pior do que o dado aos coelhos, não para por aí. O Otterton estava desaparecido junto com outros 13 predadores, mas foi colocado como última prioridade, sendo que os outros 13 eram a prioridade máxima. Afinal pra que se preocupar em salvar uma lontrinha fofa quando tem um urso polar e uma vítima de verdade esperando socorro policial?
Pois bem. Otterton e Nick são predadores e Judy é uma presa. Isso significa que os dois lados sofrem preconceito? Não, isso significa que coelhos, raposas e lontras sofrem preconceito. E o que esses três animais têm em comum? Eles são pequenos e fracos.
Os animais grandes não sofrem nenhum tipo de preconceito, mesmo se forem presas, pelo contrário, eles são uns escrotos. O elefante que foi escancaradamente racista com Nick era um animal grande e Nick um animal pequeno. Lembram que eu pedi pra lembrar que um rinoceronte quase esmaga Judy andando na rua e nem liga? Pois é, isso rola em Zootopia, e o rinoceronte era uma presa. Existe uma exclusão social de animais pequenos, que são justamente os que sofrem mais com o preconceito ao longo do filme.
Lojas de suco admnistrada por esquilos tem elevadorzinho para animais grandes poderem retirar seus copos. Sorveterias administradas por elefantes não servem animais pequenos.
Mas ainda sim o filme insiste em nos retratar como um problema entre predadores e presas. E a pergunta que eu deixo é, isso é intencional?
O filme realmente deu um passo além, e quis mostrar uma população muito focada com uma divisão da população onde acontece uma opressão não significativa para sutilmente nos mostrar uma outra parte onde a opressão é bem mais presente e não tem ninguém combatendo? Ou os autores são realmente muito ruins em retratar o preconceito? Talvez seja a primeira opção, mas a impressão que passa é de que é a segunda.
Os paralelos com o racismo real foi mais usado em cenas pequenas de “não chame coelhos de fofos” ou “não toque na lã da ovelha” do que em como predadores tratavam presas, entre predadores e presas nenhum grupo pareceu ter algum mínimo privilegio da sociedade, nem que fosse uma falsa impressão, nem isso. Eu nem chuto a que espécie pertençam o 1% donos do grande capital de Zootopia, mas realmente duvido que seja um castor.
Agora o preconceito dos animais grandes com os pequenos é presente ao longo do filme inteiro e nunca é mencionado. Ninguém comenta que Bogo era uma presa e abertamente preconceituoso quanto a Judy.
Esse foco em nos falar muito sobre uma relação racial, mas na prática só nos mostrar outra não seria um problema, se o objetivo do filme não fosse justamente nos falar sobre racismo. O filme se vendeu muito nessa ideia e foi esse conceito no filme que mais deu destaque a ele nas críticas.
Ah, e seguindo a grande lógica de filmes de racismo fantástico, terminou com o vilão sendo uma presa tentando segregar completamente os predadores da sociedade.
Zootopia é um ótimo Buddy Cop Movie e o primeiro do gênero que a Disney faz, e honestamente, eu adoraria que tivesse uma sequência para eu ver Judy e Nick investigando outros crimes. A personagem de Judy é simplesmente ótima, determinada e badass, e o filme é bom nesse aspecto. Mas infelizmente ele tenta muito a sério ser uma grande metáfora para o racismo, e a crítica comprou essa metáfora.
E eu não consigo achar que essa metáfora é bem-feita. Não quando dos três personagens nomeados que sofreram de racismo ao longo do filme, somente um é da suposta minoria que o filme aponta como vítima de opressão.
E é nessas horas que fatos como a Disney ser um dos estúdios de hollywood com mais polêmicas sobre racismo em seus filmes, é uma informação que não combina com essa tentativa de debater um tema sério sem realmente saber abordar esse tema sério.
Como eu disse lá no começo do post, o primeiro grupo de filmes são filmes que simplesmente não falam sobre racismo. O que é normal, os filmes não são exatamente obrigados a tocar no assunto, eles podem tocar em outros assuntos ou meramente ser filmes de puro entretenimento e não tem nada de errado nisso.